CAPÍTULO 9

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Sir Kay acompanhou a comitiva de retorno à Camelot durante o primeiro dia. No segundo dia, pela manhã, a pedido de Sir Lancelot, partiu a cavalo para a corte a todo galope, lá chegando ao por do sol. Sua missão era a de confirmar a chegada de Sir Lancelot e Lady Guinevere ao castelo, dali a dois dias, mas sobretudo avisar que se preparassem para receber cem cavaleiros ofertados a Arthur pelo Rei Leodegan como presente de núpcias.

Havia pouco tempo para providenciar alimentação e guarida para tantas pessoas. Estavam bem abastecidos de queijos e cervejas, bem como de farinha para uma quantidade considerável de pães, produzidos ao longo de toda a manhã e início da tarde. Alguns homens se dirigiram ao lago e conseguiram peixes, outros foram aos bosques caçar e colher frutas. Com ligeireza, um banquete foi surgindo.

Dois dias depois, à tardinha, conforme previsto, Lancelot e Guinevere, mais cem cavaleiros, aportavam em Camelot. Quando a sentinela avisou que a comitiva já era visível na estrada, foram todos à frente do castelo recebê-los. Arthur, diante dos demais, observou Lancelot apear de seu assento e ajudar Lady Guinevere a descer do coche, conduzindo-a pela mão até ele. Ali em pé, Arthur perdia-se em lembranças de uma outra tarde, há não tanto tempo, em que, diante de um ancoradouro, esperava um barco trazer uma outra dama. O impacto de quando viu Morgana no desembarque ainda era o mesmo a cada vez que evocava aquele momento. Ou maior, quanto mais conhecia a irmã e percebia detalhes de seu rosto, seus olhares, sua voz — detalhes desconhecidos naquele dia, mas com que agora enriquecia e enfeitava suas lembranças.

Viu Guinevere ajoelhar-se diante de si. Sua futura rainha. Parecia nervosa e desajeitada. Excessivamente sorridente. Os cabelos louros realçavam sua palidez. Sim, ela era a pálida sombra de Morgana e seu porte real e rosto decidido — talvez mesmo autoritário. Guinevere aparentava ser frágil, para não dizer enfermiça. Arthur achou-a desinteressante. Suspirou. Seu principal compromisso era com Logres. E aquela era a escolha acertada para o reino. Arthur teria muito tempo para aprender a amá-la, e contava com conseguir. Aferrou-se ao pensamento. Estendeu a mão à jovem para ajudá-la a se levantar e buscou ser acolhedor:

"Bem-vinda ao Castelo de Camelot, vosso novo lar, minha querida Lady Guinevere."

"Obrigada, Majestade."

Guinevere ergueu os olhos para ele. Atraente, sim. Bonito, mas não irresistível. Nem portentoso como Sir Lancelot.

"Esta," continuou Arthur, "é minha irmã, Lady Morgana." E mostrou a jovem em pé ao seu lado.

"Encantada, Lady Morgana."

Morgana fez uma mesura muito polida e exagerada, mas nada disse em cumprimento, limitando-se a encarar Guinevere.

Viviane encontrava-se ao lado de Morgana, e Lancelot viera se postar entre ela e Merlin, fazendo um agrado nos cabelos da "prima". Sir Lancelot era mesmo bonito, e mais ainda carismático. Havia sido a paixão platônica da infância de Lady Viviane. Ela sorriu com a lembrança. Já não alimentava essa paixão fazia tempo, à medida que foi crescendo e percebendo que pouco ou nada tinham em comum, e que os grandes interesses de Lancelot eram mesmo a caça, a esgrima, a guerra e os torneios, e muito pouco além disso. Mas a beleza do amigo de infância ainda enchia os olhos, sem dúvida. Ela foi a próxima a ser apresentada a Lady Guinevere, e ambas se cumprimentaram com cortesia.

"E este," prosseguiu Arthur, "vós já tivestes a oportunidade de conhecer bastante bem. Sir Lancelot, exímio cavaleiro a serviço de Logres, e um amigo muito estimado."

"Milady," disse Lancelot, curvando-se ao mesmo tempo em que lhe tomava a mão e depositava um beijo.

"Milorde," e ela fez também uma mesura.

Merlin olhava o chão enquanto os dois se cumprimentavam e parecia desconfortável. Só ergueu a vista quando foi apresentado a Guinevere por Arthur.

Vale sem RetornoWhere stories live. Discover now