Capítulo 10 - HENRIQUE SOARES

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Voltar a Baixada Fluminense estava sendo um grande desafio. Eu estava próximo a onde fui criado. Primeiro havia pensado em vir com o carro do Jaime que não é tão exorbitante quanto o meu, para tentar passar despercebido, mas ele se negou a me emprestar sem que eu falasse onde estava indo. Acabei pegando um táxi.

Cada rua do pacato município remetia à minha infância. Crianças brincando na rua, soltando pipa e jogando bola fez parte do meu cotidiano por alguns anos. Ali fiz amigos, inimigos, descobri que a vida não era fácil, e dei início a um dos meus maiores vícios: o sexo oposto.

Aprendi lições e tive o desprazer de fazer muitas escolhas erradas, escolhas essas que ainda me traziam consequências. Então, por mais que eu estivesse ali com um propósito, o maior desafio acabou de se tornar o que ainda estava preso em meu coração: o meu passado.

Assim que cheguei ao colégio, fui cauteloso. Para a minha surpresa, fui interceptado por Ana, ansiosa por explicar sobre alguns tipos de animais. Percebi logo que era a filha da Catarina quando li o nome escrito a mão no cartaz colorido de cartolina colado na parede. Com um sorriso bem cativante, a pequena menina começou a conversar e a gesticular como se fosse uma adulta. Ela era mais inteligente do que a mãe. Ah, era.

Planejei com cuidado todos os detalhes antes de chegar aqui. Pesquisei a escola e descobri que hoje teria a feira de ciências, um dia aberto ao público. Tentei passar despercebido, usando óculos escuros e boné. Estava dando certo, até agora.

Até que ela percebe quem eu sou.

Catarina grita e eu peço com a mão para ela se acalmar.

É ela!

A cretina que tirou minhas fotos. A primeira impressão que tenho é que realmente é uma fã que teve o privilégio de me ver nu.

— O que foi, mãe? — A menina sabichona se assusta também.

Arregalo os olhos para ela manter meu disfarce.

— Catarina, quanto tempo! — finjo, falando um pouco alto para que as pessoas não reparem que aqui há um embate entre nós dois.

Ela me encara com as sobrancelhas franzidas.

— Não é nada, Aninha... — ela acalma a filha. — Apenas um velho amigo.

Forço um sorriso e as pessoas param de nos olhar.

— Estava com saudades. Que coincidência, não é? Estava mesmo pensando em você ontem à noite

A filha de Catarina me olha, confusa com a conversa.

— Aninha, mais pessoas estão vindo para ouvir sua apresentação sobre animais nocivos. Por que você não se apresenta a elas e recomeça a apresentação? — A garotinha concorda, vira-se para mim e estende uma mão.

— Já que você é amigo da mamãe, será que pode me mostrar o Klaus e a Kiara?

Catarina me olha furiosa, pedindo para eu negar.

— Claro que sim, Aninha! Agora somos amigos também, não somos?

— Somos!

— Aninha... — Catarina chama sua atenção apontando para as outras pessoas, ao mesmo tempo em que está pegando no meu braço e me tirando da sala.

Assim que saímos até o pequeno pátio da minúscula escola ela para e coloca as mãos na cintura.

— O que você está fazendo aqui?

Sua pergunta é no mínimo engraçada. Ela sabia exatamente o que eu estava fazendo aqui.

Ajeito o boné, retiro os óculos e sorrio um pouco. Eu preciso ter calma e o discernimento correto para prosseguir com essa conversa.

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