Trinta e Nove - Corpo e Alma

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Naquela noite, Melissa não dormiu. Prendeu sua atenção a um terror de Stephen King e manteve os olhos bem abertos, apenas esperando o investigador Josh Bethel chegar ao prédio administrativo. Quando ele caísse bêbado em sua cama, poderia sair ao encontro de Corey.

Melissa postou uma cadeira ao lado da janela e não conseguia se concentrar em mais de três frases do livro sem que espiasse o portão do St. Marcus, o jardim e a porta do administrativo, caso tivesse perdido alguma coisa. O tempo não passava. Olhar no relógio achando que havia se passado quinze minutos era apenas o trabalho de constatar que só se passaram cinco.

O 'New In' não era o lugar mais animado e empolgante do mundo, pensava ela, indignada com a incapacidade do imbecil do investigador de vir de uma vez dormir. O risco de sair naquele momento e ser pega no flagra por ele era bastante grande. Um risco, por óbvio, que não poderia correr.

Foi com alívio que Melissa acompanhou as figuras de Brian e do investigador Josh Bethel cruzarem os portões de ferro do St. Marcus. Passava das quatro da manhã. O casaco já estava preparado, próximo à porta, as botas calçadas nos pés, enquanto colocava as luvas e a toca na cabeça. Os ouvidos grudaram na porta, esperando o barulho que os dois rapazes fariam quando passassem por ali. O quarto de Brian ficava antes, mas o do investigador Josh Bethel era logo após o dela. Quando a porta ao lado fosse trancada, Melissa poderia sair com tranquilidade.

Não demorou muito para que as duas vozes graves e conhecidas reverberassem no tom bêbado e alegre. Melissa rolou os olhos. A porta de Brian se fechou, então os passos do investigador Josh Bethel eram tudo o que fazia eco no corredor. Ele caminhou lentamente e pareceu encontrar dificuldades para enfiar a chave na fechadura, devido ao barulho que fez. Melissa esperou impaciente, batendo os pés no chão, até que ele finalmente abrisse a porta e se trancasse lá dentro. E quando ele o fez, não hesitou em abrir silenciosamente sua própria porta, para sair no corredor vazio e silencioso.

Melissa andou na ponta dos pés, para que os saltos pequenos de suas botas não fizessem barulho, enquanto apertava o pesado casaco contra o corpo. O frio era cruel naquela altura do ano. E Corey estava enfrentando esse frio sem muitas roupas quentes em uma cabana abandonada no meio de uma floresta. A constatação fez uma pontada atingir em cheio seu coração. Com sorte, ele estaria longe de tudo aquilo nas vinte e quatro horas seguintes. Seu plano funcionaria e, assim que pudesse, estaria junto dele.

Já nos jardins do St. Marcus, Melissa tomou o cuidado de não frequentar o campo de visão das câmeras de segurança, e agradeceu pelo quão relapso era o guarda que vigiava os portões. Difícil seria o dia em que o encontraria acordado e alerta, como deveria estar. A incompetência dele era uma dádiva momentânea, todavia.

Embrenhar-se naquela floresta era sempre uma tortura, mas o pensamento de que após aquela aventura desnecessária o grande prêmio seria um encontro com Corey Sanders, fazia Melissa continuar. Ela já conhecia, superficialmente, o caminho. Parecia ligeiramente familiar, e o medo de se perder ali quase não existia, embora o mal estar fosse um companheiro insistente.

O mapa estava em suas mãos, por precaução. Vez ou outra Melissa o consultava, apenas para ter certeza de que estava no caminho certo. E, de fato, estava. Antes que o sol nascesse, a cabana já podia ser avistada. Apenas porque Melissa sabia que ela estava ali. Era difícil enxergá-la camuflada em meio à mata fechada.

As janelas de madeira estavam fechadas, Melissa pôde constatar quando se aproximou, encontrando dificuldades para andar por entre as árvores. A porta estava apenas encostada, entretanto. Do lado de dentro era tudo escuro e cheirava a grama fresca, lama e... Corey, se é que era possível sua mente ser tão ridiculamente apaixonada assim.

Psicose (Livro I)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora