Capítulo VI

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Passaram-se duas semanas, e Anastásia estava melhor e havia voltado a trabalhar. Tudo na sua casa continuava a mesma coisa, o que ela sabia que aconteceria. Acordou cedo e um pouco feliz, pois sabia que era seu aniversário. Seus dezoito anos finalmente havia chegado, estava quase livre daquele lugar. Mas, lembrou das palavras de sua mãe adotiva de que ela nunca poderia ir embora dali. Simplesmente não entendia essa possessão, sendo que era tão humilhada e maltratada.

Levantou-se como era de costume e avistou um colar simples em cima do seu criado mudo e um bilhete com uma letra horrível escrito: Feliz aniversário, seu pai. Assustou-se com tal presente e pensou que fosse alguma brincadeira de Alena. Colocou sua roupa para trabalhar e saiu do seu quarto para a cozinha. Sua família adotiva se encontrava comendo, e para sua surpresa, havia um prato reservado para ela.

— Feliz aniversário, Anastásia! — disse Daniel animado. — Sente-se e coma conosco.

— Obrigada, Daniel. — disse polidamente. — O senhor deixou mesmo esse colar no meu quarto?

— Claro. Quem mais deixaria? — parou de beber sua vodca e a encarou.

— Alena com más intenções. E o senhor sabe muito bem disso. De qualquer forma, obrigada pelo colar, é simplesmente adorável.

— Disponha, você merece. Agora coma sua blini.

— Nunca deixaram comer com vocês. O que está acontecendo?

— Você pergunta demais, garota. — Nádia a olhou feio. — Agora coma, antes que eu me arrependa. E quero lhe comunicar que vai pedir demissão do seu emprego.

— Por quê? Eu preciso do dinheiro, assim como vocês também.

— Daniel e Ygor vão trabalhar, e as mulheres ficarão em casa. Estamos entendidas, Anastásia? — a mulher voltou a comer.

— Eu tenho dezoito anos e posso fazer o que eu bem entender! — levantou-se da mesa. — Vá à merda, Nádia! Estou cansada de tantas humilhações vindas da senhora e sua filha arrogante. Até agredida por vocês eu fui! Eu nunca pedi para continuarem comigo! Se não me queriam, o orfanato estava lá para isso! Estou farta de comer pão duro, sendo que sou eu que ajudo na maior renda desta casa. Não posso ter um aniversário em paz, para que eu possa comemorar minha vida. Eu odeio vocês, odeio! — Anastásia começou a chorar. — Eu só queria viver uma vida normal, com uma família que me amasse.

Ela saiu correndo para seu quarto e se trancou. Sentou-se no chão e começou a esmurrar o chão. Limpou as lágrimas, suspendeu a tábua e pegou seu amado broche.

— Você é minha única esperança no mundo. A única pista da minha família.

Guardou o broche em seu decote, pegou um pouco de dinheiro que mantinha guardado para caso precisasse em momentos como aquele. Enxugou as lágrimas e saiu do quarto.

Ygor estava ao lado de Daniel quando Anastásia saiu do quarto e a encararam.

— Para onde você vai? — perguntou Daniel.

— Para o meu trabalho. Eu ainda trabalho, ou não sabe?

— Eu vou acompanhar você.

— Você não vai me acompanhar para lugar nenhum! Parem de me tratar como criança, ou fingirem que se importa! Pois nunca se importaram, e nem se importarão!

Anastásia saiu de casa, mas não estava indo para seu trabalho, e sim para o centro urbano de São Petersburgo. Agora ela estava sem condições de comprar uma passagem para Moscou. Xingou Nádia e Alena mentalmente por ter rasgado seu bilhete, deixando todo seu esforço virar poeira no vento.

Quando chegou ao centro, avistou uma grande locomoção de pessoas, e vários carros passavam. Ouviu comentários de que era a família imperial que fazia muito tempo que não vinha para São Petersburgo. Ela não deu muita importância, até pegar um jornal no chão e ler que o palácio precisava de empregados.

Logo brotou um sorriso em seus lábios.

Era isso, se Deus permitisse, trabalharia no palácio e nunca mais veria a família Tchecov.

A viagem para São Petersburgo havia deixado Natasha totalmente cansada. Quando chegou ao palácio, tudo estava lindo como lembrava. Achava Peterhof simplesmente magnífico e belo em todos os detalhes. Ainda lembrava a direção dos quartos e foi logo para o seu.

A pintura do quarto ainda era rosa com detalhes dourados. Sua antiga cama foi trocada por uma grande, a lareira que se encontrava acesa, aquecendo todo local. Tirou seu casaco, se aproximando da sua penteadeira que estava vazia; por pouco tempo. Ivana logo entrou em seu quarto admirando tudo.

— Estou adorando estar nesse palácio novamente! Bem mais bonito que o de Inverno.

— Isso é bastante notável. A riqueza da arquitetura daqui é maravilhosa.

— Você sabe que hoje é o aniversário de Anastásia, não é?

— Sim, eu sei. Papai, onde ele está?

— Foi para o quarto com nossa madrasta. Ela estava se queixando de dor na cabeça. É natural, a viagem demorou.

— Viagem de trem nem é tão cansativa assim. — Natasha sentou em sua velha poltrona e olhou casinha de boneca. — Deixaram tudo perfeito para nossa chegada.

— Você acha ruim? Eu acho simplesmente ótimo! Tem vários quadros da mamãe pelo palácio. Depois vou dar uma olhada aos arredores.

— Só farei isso amanhã, estou sem ânimo até para respirar hoje.

— Ouvi uma conversa de Dimitri com Nikolai.

— Ivana, isso é totalmente sem classe e educação.

— Ora, eles são nossos irmãos! — Ivana se sentou no tapete felpudo. — Dimitri dizia que Lara quer casá-lo com a sobrinha dela.

— Quem é a sobrinha dela?

— Elizabeth Marshall da Inglaterra.

— Ela é o quê?

— Princesa, meio óbvio Natasha. — respondeu com deboche. — Ouvi de Dimitri que recebeu uma fotografia dela, ressaltou a beleza, mas ele não quer se casar. Porém, não quer mais atritos com Lara, por isso vai aceitar conhecer Elizabeth. Já pensou? Teremos uma cunhada! Será que ela é agradável? Espero que sim, porque se for como nossa amada madrasta, Deus tenha misericórdia de nós.

— Lara não é tão mal assim.

— Só pode estar brincadeira comigo, Natasha. De qualquer forma, Irina disse que amanhã será a seleção das nossas acompanhantes de quarto. Espero encontrar alguém muito eficiente.

— Vai ser uma para cada?

— Sim, papai nunca permitiu mais do que isso, para que fôssemos independentes em nossas rotinas, sabe disso. Mas, você acha que um camareiro dará conta de nossos irmãos?

— Sinceramente? Não. — Natasha riu.

— Jamais! Eles vão deixá-los loucos. Muitas vezes acho que Irina ficará louca sendo governanta do palácio. Imagina servir para nossos irmãos diariamente?

— Não gosto nem de imaginar esse fardo.

— Muito menos eu. — disse horrorizada.

— Certamente. Agora, você deveria se caminhar para seu quarto? Quero deitar, quem sabe até dormir.

— Está me expulsando?

— Considere como sim a minha resposta.

— Pior irmã do mundo. — Ivana se levantou e abriu a porta. — Bom descanso.

— Para você também.

Natasha se levantou da poltrona e se jogou na cama, fechando os olhos logo em seguida. O sono logo veio e um sonho logo surgiu.

Uma garota de cabelos negros com olhos azuis estava completamente machucada, chorando angustiada. Mas, como um passe de mágica, um sorriso brotou nos lábios da garota muito semelhante ao de alguém que ela conhecia. A garota desconhecida começou a andar em um belo jardim, ela a encarou e tudo ficou escuro.

A grã-duquesa perdidaWhere stories live. Discover now