Capítulo 29 (Parte 2) - A história de Adriel

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Todos pareciam apreensivos, mas o cavaleiro de cabelos compridos demonstrava grande afetação. Sem ninguém tomar nota, puxou grande quantidade de ar.

- Para mim, tudo começou da pior maneira possível – iniciou Adriel. – Eu era apenas uma criança quando aqueles malditos bandidos entraram em casa e mataram minha irmã, Celia. Bem naquele dia, nosso amigo Grey também estava lá. Os dois mortos. E eu? Eu eles não conseguiram matar. Como um louco, peguei um facão que meu pai tinha e desatei a gritar e a cortar o ar. Os gritos chamaram a atenção de vizinhos e os safados correram. Não importava continuar vivo. Tinha perdido minha irmã e meus pais nunca foram os mesmos. Naquele dia jurei: iria matar os responsáveis.

“Eu nunca tive uma “vida de criança” depois daquilo. Aquele facão tornou-se meu melhor amigo. Quando completei 15 anos, fui aprovado com louvores na Academia. Minha carreira foi meteórica. Em poucos anos, antes dos 20, eu era capitão de um contingente de 100 soldados. Minha fama se estendeu por toda Targodriath e nunca tive problemas para encontrar mulheres interessadas em sair comigo. Meu passado estava esquecido, guardado.

“Foi então que tudo desmoronou. Três novos cartazes de procurados chegaram ao nosso posto: eram eles; os três malditos que mataram minha irmã e meu melhor amigo. Estavam mais velhos, mas não tinha como não os reconhecer. Populares tinham visto eles praticando pequenos assaltos nas redondezas. Desloquei todos os soldados para encontrá-los. Em menos de um dia tinham achado os meliantes. Quando fiquei de frente para eles, não emiti uma única palavra. Minha arma – o mesmo facão que balançara sem rumo anos atrás – decepara a cabeça dos três em um único movimento; pele, músculo e até ossos foram cortados como papel.

“Não preciso dar detalhes, não é? Perdi minha posição, deixei a Armada e fui preso, pois é contra a lei matar outros humanos em nosso reino, como vocês sabem. Mas estava feliz, tinha vingado a morte de Celia e Grey. Anos se passaram e a felicidade se transformou em rancor e ódio contra meu próprio reino: ‘Por que tenho que sofrer por ter limpado o mundo de escórias daquele tipo?’.

“Logo que completara 29 anos, fiquei sabendo do capitão Dario. Um novo garoto prodígio, como eu fora há anos. Meu ódio apenas aumentou. Até que um dia um jovem apareceu em frente à minha cela. ‘Disseram-me que você é um grande guerreiro. Falam a verdade?’, perguntou-me. Eu não lhe dei atenção e ele foi embora. O mesmo aconteceu no dia seguinte e voltou a acontecer diariamente por mais de duas semanas. Até que certa vez não me contive: ‘O que quer de mim, garoto prodígio?!’, questionei. Os guardas tinham me falado que aquele era o novo Mestre Comandante.

“Sorrindo, calmamente, ele me respondeu: ‘Quero lhe propor uma aposta. Vamos lutar e, caso você me derrote, estará livre da prisão’. Não acreditei naquelas palavras, mas quis saber o que aconteceria se eu perdesse: ‘Se você perder, terá que destruir o facão de seu pai’. As palavras dele atingiram meu coração como uma flecha. Mesmo duvidando daqueles termos, aceitei, pois teria a chance de derrotar o novo ‘prodígio’ e, se possível, matá-lo-ia para me vingar do reino que me prendera por encerrar a vida de assassinos. Estava pronto para isso, e não me importava em estender minha pena, para mim não faria diferença.

“O dia do combate chegou e não acreditei quando os guardas abriram minha cela e me levaram para um pátio. Não havia ninguém, apenas Dario. Os guardas me deram meu velho facão e se retiraram. Ele olhou para mim e disse: ‘Faz tempo que não luta. Pode se aquecer. Eu espero’. Tudo aquilo parecia surreal demais. Mesmo assim, pouco tempo depois começamos a luta. Eu realmente não estava em minha melhor forma, mas não fazia diferença. O comandante me derrotou sem me atacar. ‘O peso da morte lhe deixa devagar, Adriel’, ele disse. ‘O que você sabe sobre isso, maldito?!’. ‘Você tirou a vida de três pessoas e eles haviam matado apenas duas. Isso faz de você pior que eles?’. ‘Claro que não! Eles mataram crianças! Mataram minha irmã e meu amigo! Eu os vinguei!’. ‘Se realmente acredita nisso, por que ainda não se perdoou?’.

“Eu não queria admitir, mas ele estava certo. E quando minhas pernas e meus braços se cansaram, sem nem ao menos ter chegado perto de atingí-lo, caí de joelhos e o facão escapou de minha mão. Nessa hora, ele se agachou e me estendeu a mão. ‘Celia, Grey e os três estão mortos. É impossível salvá-los agora, mas existem muitos que podem ser salvos. Você é um guerreiro como poucos. Volte e lute. Honre o nome de Celia e Grey; honre seu nome e, talvez assim um dia você possa perdoar a si mesmo’. As palavras daquele garoto me levaram às lágrimas. Com a ajuda dele, destruímos o facão e Dario me defendeu perante os oficiais, transformando minha pena em futuros serviços prestados ao reino.

“Desde então, mudei muito. Salvei incontáveis vidas e, mesmo com minha pena tendo se encerrado, não consigo me ver fazendo outra coisa. Hoje, entendo que eu e aqueles assassinos não fomos tão diferentes. A violência é a mesma, não importa a causa. A morte é o fim para todos, bons ou maus. Devemos estar cientes disso. Assim, se minha morte vier enquanto honro o nome de meus amados e meu próprio nome, não terá sido em vão.”

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Era Perdida: O Globo da MorteOnde as histórias ganham vida. Descobre agora