Capítulo 62

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Thomas narrando:

É lógico que não estava em meus planos assisti-las da porta da igreja. Em algum momento confesso que imaginei que conseguiria entrar, mas sejamos francos: igreja não é meu lugar. No fundo Angeline também sabia disso.

Entretanto, quando sua voz suave invadiu o ambiente lá dentro sendo transmitida para fora, por mais que eu tentasse permanecer onde estava não fui capaz de controlar o impulso de vê-la cantar. Não era como se eu pudesse evitar. Angeline era como um maldito ímã e eu o metal, totalmente vulnerável a ela.

E então aconteceu: enquanto permanecia parado na porta hipnotizado por sua voz se misturando à voz de Izzy, algo dentro de mim começou a se desfazer como um castelo de areia atingido pelas ondas de um oceano furioso. Era como se a melodia entrasse na corrente sanguínea limpando qualquer impureza que encontrasse pelo caminho, invadindo o coração em forma de uma substância que não existia na tabela periódica e cicatrizando feridas que eu nem sabia que ainda estavam abertas.

Percebi a mãe de uma das crianças esconder o rosto no ombro do esposo chorando compulsivamente e de algum jeito eu a entendi. Aquilo não era apenas uma música; era uma promessa de que o que quer que estivesse passando, ela não estava sozinha.

Quando me despedi das crianças e Killian minutos mais tarde eu tentei, mas não consegui sufocar a necessidade de conversar com Samantha sobre algo que eu evitava conversar com qualquer pessoa. Afinal de contas é fácil alguém te dizer como superar algo que nunca precisou superar, mas se torna um tanto difícil quando essa pessoa assume seu lugar. A dor da perda que eu senti quando ainda era criança estava prestes a assumir o coração de Samantha, e mesmo sorrindo da maneira como ela estava, eu tinha certeza que ela também sabia disso.

Acontece que nossa breve conversa não foi exatamente esclarecedora para mim. Pelo contrário: quando Angeline se juntou a nós eu estava indiscutivelmente mais confuso do que antes.

- Se quatro anos atrás você não tivesse tido a iniciativa de abrir o Clube, esse dia não teria existido. - Dissera.

Então falando hipoteticamente, se Deus existisse poderia Ele ter colocado Alice na minha vida como uma maneira de eu ajudar outras crianças no futuro? Logicamente eu jamais teria cogitado a ideia de abrir um Clube para crianças com câncer sem um motivo plausível, então... isso seria possível?

Droga, Thomas, o que houve com sua sensatez?!

Seja como for, contrariando todas as expectativas, pela primeira vez na vida eu me sentia perfeitamente inteiro; e de alguma forma absurda eu soube que não seria capaz de encontrar isso em outro lugar se não em uma igreja.

Não sei exatamente por que agradeci à Angeline - tampouco por qual motivo a abracei -, mas eu precisava disso. Eu precisava tocá-la, envolvê-la em meus braços, sentir seu coração pulsando junto ao meu. Eu precisava senti-la próxima por tanto tempo quanto fosse possível, e enquanto eu a tinha, duas simples palavras rondaram meus pensamentos: e se...? E se ela estivesse certa? E se a verdade estivesse estampada em minha frente esse tempo todo, mas eu simplesmente me negava a enxergar? E se...?

- Angie. - Ouvi a voz de Sarah se aproximando de nós e fui obrigado a soltá-la. - Irmã Rebecca pediu que você volte mais vezes. Ela estava com saudades de te ouvir cantar.

Angeline sorriu colocando o cabelo atrás da orelha.

- Tá, eu vou voltar.

- Estão prontas para ir? - Perguntei abrindo a porta do passageiro pra deixar Angeline entrar.

- Na verdade, ainda não. - Sarah disse se posicionando em minha frente, me olhando como se fosse me dar um sermão. - Sr. Strorck, aquela menina que o senhor viu lá dentro cantando com aquela garotinha... essa é minha filha. Isso é o que ela faz e isso define quem ela é. Eu sei que é primeira vez que o senhor a vê assim, então chegou a hora de eu perguntar... ainda a ama, apesar da crença dela?

Um plano para nós (PAUSADO)Where stories live. Discover now