Capítulo 63

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Angeline narrando:

A princípio não doeu. O choque que Thomas me causou foi tão grande, que por um longo intervalo de tempo isso foi tudo o que eu senti: choque.

Mas ele me soltou... e então doeu. Deus, como doeu. Não meus braços, a dor que se alastrou por eles foi tão insignificante que eu mal senti. O que doeu mesmo foi algum lugar dentro de mim que eu não consegui localizar, algum lugar tão profundo que certamente não existia em nenhum livro de anatomia. Foi uma dor pontiaguda e intensa que se expandiu depressa para cada pequena parte do meu corpo me deixando tonta e desorientada, e tudo o que eu fiz foi correr.

Corri para o casebre da minha mãe e desabei sobre sua cama, me encolhendo como uma bola como se assim eu pudesse bloquear a agonia. Logo as lágrimas irromperam para fora através dos soluços mal contidos e dos meus olhos fechados. Eu não consegui evitar. Existia tanta coisa pelo que chorar... então chorei por todas as Izzys, que lutam diariamente contra algo pela qual não merecem passar. Por todas as Samanthas, cujos filhos foram tirados de seu seio tão cedo. Por todos os Thomas, que apesar de tanto sofrimento não conseguem buscar conforto no único lugar onde realmente o encontrariam.

Em meio às lágrimas braços gentis me ergueram da cama e me aninharam com carinho, sustentando meu corpo fraco e me proporcionando o conforto com a qual eu me familiarizara havia tempo. Abracei minha mãe e chorei mais.

Ela me ninou como uma mãe acalenta um bebê recém-nascido ao acordar no meio da noite, murmurando baixinho uma cantiga que não cantava há anos. Ela teve paciência para esperar. E quando eu finalmente me acalmei, ela me deixou encolhida, se levantou e foi até a cozinha sem dizer nada, voltando minutos depois segurando uma xícara de porcelana.

- Tome. - Pediu a estendendo para mim.

- O que é isso?

- Chá. Vai te fazer bem.

Peguei a caneca de sua mão enquanto ela se sentava ao meu lado e tomei um gole pequeno antes de abaixá-la e olhar para o movimento preguiçoso que a fumaça fazia ao invadir o ar.

- Como... como a senhora soube?

- Eu estava limpando o salão de festas com a Eileen. - Ela respondeu suavemente, escolhendo as palavras. - O grito dele chegou até lá.

Apertei os lábios.

- Então ela também ouviu.

Minha mãe suspirou e balançou a cabeça num gesto afirmativo.

Ótimo.

- Bem... parece que a bíblia que você encontrou no quarto dele não significava nada, afinal.

Ela não respondeu, apenas me observou em silêncio como se perdida em seus próprios pensamentos. Tomei outro gole do meu chá e encolhi os ombros tentando evitar novas lágrimas.

- Sabe, eu só estava tentando ajudar.

- Eu sei, meu bem. - Minha mãe acariciou meu cabelo com a mão. - Mas algumas vezes, a maior ajuda que a gente pode oferecer é o silêncio.

- Silêncio? - Franzi a testa para ela. - O que eu posso fazer por ele em silêncio, mãe?

- Nada. - Ela sorriu, balançando a cabeça para os lados. - Não é você quem faz, querida, é Deus. Talvez esse seja o problema... você está tentando fazer tudo, e esquecendo que Ele é quem tem o poder.

Suspirei desviando os olhos outra vez.

- Parece que Deus está achando divertido dificultar as coisas.

- Dificultar as coisas? - Minha mãe inclinou a cabeça para olhar meu rosto.

- Thomas estava evoluindo, mãe. Ele foi à igreja, leu a bíblia... e então Deus levou a Izzy. - Apertei os lábios e olhei para cima, as lágrimas renascendo ao mencionar o nome da menininha. - O que Ele espera com isso?

Um plano para nós (PAUSADO)Where stories live. Discover now