CAP 46 - Combustão espontânea

741 151 286
                                    

— A gente se vê na segunda? — Perguntei a ela enquanto descíamos as escadas na frente do prédio. 

Ela olhou pro chão, dando um sorrisinho de lado com a língua na ponta do canino, apoiando a ponta do skate no chão e segurando a outra ponta com a mão. Ao olhar pra mim, ela empurrou com o pé a tábua de madeira pro chão, o arrastando pra frente e pra trás na rua.

— Nunca quis tanto ir pra aula de História.

Eu olhei ao redor e sorri. A rua estava vazia e mamãe estava no apartamento. Ela olhou ao redor também, logo depois olhando por todo o meu rosto, seus olhos pulando de um lado pro outro.

— Eu-

— Então- — Falamos ao mesmo tempo. Ela riu, chacoalhando um pouco os ombros pra cima e pra baixo e arrastou o skate pra frente e pra trás de novo.

Eu queria tanto beijar ela. Meu coração batia tão rápido que eu tinha a mais plena certeza que a qualquer instante entraria em combustão espontânea. E aí iam chamar os bombeiros e minha mãe meteria a cabeça pela janela se perguntando o que tinha acontecido e o bombeiro ia falar que eu tinha virado um incêndio e Maxine ia ter que se explicar. Dizer que não foi ela que botou fogo em mim com algum isqueiro que ela sei lá por qual motivo tinha no bolso. Mas ela estaria mentindo porque foi culpa dela sim. Mas ninguém saberia que ela é uma mentirosa porque eu já teria morrido e nunca mais ia poder beijar ela de novo porque eu virei pó.

— Beleza, então até segunda, Mad. — Ela sorriu. Mas minha mãe devia estar na cozinha e a cozinha tem uma vista direta pra rua, onde nós estávamos. Olhei pra janela. Ela não estava lá. Mas mesmo assim, vai que ela chegava na hora.

— Até. — Antes que ela tomasse impulso pra descer a rua, eu dei um beijo em sua bochecha, logo em seguida olhando ao redor. Ela ficou vermelha. Olhei pra cima. Mamãe não estava na janela. 

Ela olhou pra janela também.

— Tá tudo bem. — Ela me deu outro beijo na bochecha e pegou minha mão furtivamente, a alisando com o polegar que tinha um anel preto. — Até mais.

Então, ela pegou um impulso com o pé e desceu a  rua indo de um lado para o outro enquanto olhava pra trás, pra mim, de vez em quando. Eu fiquei pra trás, parada no meio da rua, a observando se afastar de mim, os cabelos negros correndo com o vento, debaixo do boné. Mesmo depois que ela virou a esquina, eu permaneci parada, olhando na direção em que ela tinha ido.

O vento bagunçava meu cabelo. E ela bagunçava minha cabeça. E meu cabelo também.

Deitei na minha cama. Não, não me deitei, eu me JOGUEI na minha cama e escondi minha cara debaixo de um travesseiro. Encontrei meus fones de ouvido e os coloquei, pulando algumas músicas até encontrar uma que fosse boa pra me sentir frustrada.

— Que droga. — Resmunguei com a voz abafada. Afastei o travesseiro da cara e olhei pro meu mural, lembrando que Max tinha escrito alguma coisa ali. 

Me levantei e fui olhar o que era. Abri a boca e dei um passo pra trás quando percebi que ela desenhou um coração entre eu e ela numa foto e escreveu "Max esteve aqui" com uma caveira desenhada em uma das fotos que eu tinha dela. Pelo menos era um coração pequeno, talvez mamãe não percebesse.

Quando eu fui tomar banho antes de dormir, eu tive a brilhante ideia de cortar meu cabelo no chuveiro usando uma tesoura de unha que estava em cima da bancada. Cortei nas laterais e atrás, me lembrando do dia em que Jonathan o cortou perto da piscina. Flashes apareceram na minha cabeça sem nenhum tipo de aviso. Correndo, ouvindo ameaças, pedindo pra eles me deixarem em paz. Eu não tinha feito nada de errado. 

A Vida Absolutamente Ordinária de Amanda Pritchett ⚢Where stories live. Discover now