Capítulo 25

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Eu não sei quantas vezes dormi e acordei. Tampouco sei por quanto tempo chorei por vários motivos diferentes, mas estava certa de que passei a maior parte do meu tempo consciente chorando.

Decidi manter meu celular guardado na bolsa em modo silencioso até chegar na casa da minha avó. Considerando que ele estava assim desde a manhã do meu aniversário, eu poderia jurar que devia ter trilhões de chamadas perdidas, mas eu não estava nem um pouco a fim de conferir.

Depois de várias paradas pra descanso, mais de três mil e quinhentos quilômetros percorridos e três dias de viagem, eu enfim cheguei à rodoviária de Castanheiras, uma das menores cidades de Rondônia.

Era fim da tarde quando desci do ônibus com minha bolsa do lado olhando em volta procurando minha avó, e não demorou muito até que a encontrasse no meio da multidão, então acenei para chamar sua atenção e ela se virou pra mim. Sorrindo, correu em minha direção, mas então parou de repente, seu sorriso dando lugar a uma expressão preocupada.

- O que houve, querida?

Suspirei, ciente de que tinha tomado todo o cuidado possível pra esconder os sinais de tristeza que estavam em mim, mas uma das principais características da minha avó era poder perceber tudo o que uma pessoa não estava disposta a falar, e prever até o que ainda não tinha acontecido. Ela podia, por exemplo, prever a queda da bolsa de valores ou perceber com apenas uma observação, se um marido era fiel ou não à sua esposa.

Seu sexto sentido era incrivelmente preciso. Ela nunca errava.

Sorri, tentando parecer confiante.

- A viagem foi longa, vovó. Estou tão cansada... - Antes que ela tivesse chance de dizer qualquer outra coisa, eu a abracei apertado.

- Oh, meu bem... eu sei que isso não é tudo, mas vou deixar você me contar o que aconteceu no seu tempo. - Ela me soltou e segurou meu rosto entre as mãos. - Vamos?

Eu fiz que sim com a cabeça.

Minha avó era quase simples, daquelas senhoras que ainda seguiam as regras antigas, usando somente saias abaixo dos joelhos e roupas exageradamente fora da moda. Ela não usava nenhum tipo de maquiagem nem acessório, exceto a única e solitária aliança que ainda mantinha no dedo da mão esquerda, apesar de ser viúva há sete anos.

Eu sabia que seu cabelo - já com seus primeiros fios grisalhos - era longo, embora ela o mantivesse preso em um coque durante a maior parte do dia. O traço do seu rosto me lembrava meu pai. Os mesmos olhos negros, o mesmo contorno do queixo, o mesmo sorriso...

Talvez por isso eu me sentia tão confortável com ela, mesmo a conhecendo tão pouco.

Por toda a viagem até sua casa eu falei o mínimo possível, deixando que ela preenchesse o silêncio com informações de como seria minha vida ali.

Minhas regras eram simples. Eu não tinha permissão pra sair da cidade nem ficar até dez horas fora de casa, avisar onde eu estava indo, com quem eu estava indo e que horas eu voltaria, não fumar, não tomar bebidas alcoólicas, não levar pra casa pessoas que ela não conhecia...

Bem, nenhuma delas era complicada o suficiente pra eu não seguir à risca.

Quando o táxi estacionou na frente de uma calçada, eu desci olhando em volta.

Vovó morava na frente de uma praça, mas de modo algum aquela praça me lembrava a de Santa Teresa. Existia apenas o tronco de uma árvore alta, livre de qualquer folha e flores. Em volta, quatro bancos velhos estavam posicionados formando um quadrado espaçoso. Há algum tempo dois deles deviam ser amarelos e dois vermelhos, mas agora a ferrugem tomava conta de praticamente todo seu espaço. Nenhuma grama. Nenhuma planta. Nada verde.

Apostas do destinoWhere stories live. Discover now