Capítulo 14

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1.

Estávamos todos reunidos na sala de estar da casa da Tábata. Os pais dela não estavam. Eles trabalhavam confeccionando uniformes para hotéis e restaurantes. E aquele era o dia da entrega dos uniformes. A casa era nossa. Ela chamou todos nós para conversarmos pessoalmente. Não queria que houvesse mal entendido no que tinha a dizer.

Eu estava em pé de braços cruzados roendo as unhas das mãos. Roger estava sentado na poltrona mexendo no celular. Daniel estava se servindo de suco de tangerina e um pedaço de lanche de frios que estavam sobre a mesa de centro. Fernando estava em pé embalando o bebê de um lado para o outro.

A priori o encontro havia sido marcado para que todos pudessem ver e presentear Felipe com presentes e mimos, mas como estaríamos a sós e tendo em vista o nível de intimidade que todos tinham com Tábata, o papo ia além de uma visita amistosa para conhecer o seu filho.

Voltar à casa da Tábata era estranho. A casa parecia menor. Quando namorávamos, as cores das paredes eram pastéis. Eles devem ter feito uma reforma para acomodar o quarto do bebê. Aproveitaram e pintaram a casa inteira com um tom de cinza bem claro. A sala era enorme e haviam janelões que davam para o jardim descoberto e para a garagem coberta com telhas canaletões que iam até a calçada. Na sala haviam dois sofás, uma poltrona, uma rack com uma televisão e do lado oposto da porta havia um aparador repleto de porta retratos. No passado havia um porta retrato nosso ali. Era uma foto que tiramos no dia da formatura em que Daniel e Paulo brigaram dentro do banheiro. Outras fotos deviam ter passado por aquele aparador. Tábata e Daniel, Tábata e Fábio, Tábata e Roger, e a que estava naquele momento em exposição era a da Tábata com o Fernando.

— Gente, meu filho não é a coisa mais linda do mundo? — Ela disse ao voltar da cozinha trazendo uma pilha de guardanapos e colocá-los sobre a mesa de centro.

— Anda logo, Tábata. — Falei roendo a última unha do dedinho. — Estamos há mais de meia hora falando só do Felipe. Não estou aguentando de ansiedade para saber quem de nós é o pai do bebê.

Todos pararam o que estavam fazendo e olharam fixamente para Tábata. Ela ergueu as mangas da blusa e pegou o bebê das mãos do Fernando dizendo:

— Nenhum de vocês é o pai do Felipe. O pai dele não está aqui nessa sala.

Olhei para Daniel. Ele ainda mascava um pedaço de lanche quando ela disse isso. Ele apenas fechou os olhos. Lembrei da história que me contou e a confirmação estava prestes a vir à tona. Roger cerrou o cenho e olhou seriamente para Tábata. Fernando meneou a cabeça, certamente já sabendo o que ela tinha a dizer.

— O pai do meu meu filho é o Paulo. — Ela anunciou.

2.

Ao ouvir que o pai do filho da Tábata era o Paulo, na mesma hora toda a sala e as pessoas ali presentes se desfizeram em uma nuvem de fumaça multicolorida e assim que ela se dissipou eu me vi parado ao lado de um outro eu e do Daniel. Estávamos os três em frente ao Coffee Club, Paulo e Luiz estavam próximos e Luiz tossia, pois a fumaça de seu baseado havia entrado nas vias erradas.

— Tem certeza que não querem? — Ele perguntou estendendo a mão para o Daniel.

— Melhor não. Não é, Daniel? Ae, Cabeção. O Daniel já te falou o que ele fez da última vez que fumou um baseado? — Paulo falou dando uma piscadinha rápida e segurando o pau sobre a calça enquanto Luiz estava curvado, tossindo, tentando se desengasgar.

Olhei para o Daniel e ele ficou olhando firme para o Paulo, envergonhado. Em seguida falou:

— Cale a boca, Paulo.

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