A Trigésima Quarta Carta

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Campos Verde, julho de 2019

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Campos Verde, julho de 2019

Querido Moabe,

Eu estava observando um pôr do sol maravilhoso depois de ter corrido mais de dois quilômetros com Mozart, estava tão distraída com a austeridade da beleza da Criação que se não fosse Mozart começar a latir freneticamente eu teria levado um enorme susto, pois inesperadamente e de uma forma muito silenciosa, Josafá apareceu onde estávamos.

Ele sorriu ao me ver e depois de cheirá-lo Mozart voltou ao seu estado de inércia quase absoluta, me deixando numa situação constrangedora. Porque com ele latindo eu tinha um motivo para arrastá-lo de volta para casa, mas com ele silencioso seria literalmente uma missão de arrastar um cachorro com mais de trinta quilos por mais de dois quilômetros, me obrigando a conversar com Josafá. E a primeira coisa que ele me perguntou depois de me cumprimentar foi se poderia me fazer uma pergunta, eu disse que sim e achei que fosse algo sobre minha recém estreia no Rocha Eterna, o grupo de louvor dos jovens, mas era de cunho mais pessoal.

-- Por que você está me evitando, Laura?

-- Não evito você, apenas não gosto de ficar na sua companhia -- falei sem pensar em como aquilo poderia soar ofensivo, mas quando eu fico nervosa tendo a falar com alto grau de sinceridade.

-- Nossa -- ele fechou o semblante imediatamente e pensou por alguns segundos, aproveitei para corrigir, mas ele começou a falar junto comigo e o deixei continuar. -- Desculpa.

-- Desculpa?!

-- É me desculpa por ser tão horrível que você mal consegue permanecer dois minutos na minha presença.

Doeu tanto ouvir aquilo, Moabe. Foi uma facada certeira no meu coração. Foram quase que as mesmas palavras da Ruth quando brigamos.

-- Não. Não é isso, Josafá, eu nem mesmo sei que tipo de pessoa você é -- falei gesticulando demais. Outra característica de quando fico muito nervosa, e eu nem sabia porque estava tão nervosa para início de conversa. -- Eu perdoei você, ficou no passado. Eu só fico incomodada porque você nem mesmo parece lembrar.

-- Me lembrar? -- Ele parecia muito confuso. Então eu soube que ele não se lembrava e senti minhas bochechas esquentarem muito.

-- Do que aconteceu quando eu voltei a primeira vez para Campos Verde.

-- Laura, eu realmente não sei do que você está falando -- naquele momento ele me olhava como se eu fosse louca.

-- Você não tem um irmão gêmeo que eu não conheço, por acaso?! Porque é a única explicação para você não lembrar, ou talvez foi tão irrelevante que você esqueceu.

-- Meu Deus, Laura me diz de uma vez o que foi que eu fiz.

-- Quando eu voltei para Campos Verde em dois mil e dez a gente ficou e dois dias depois nos encontramos no churrasco dos pais da Becca e você chegou com a sua namorada. Lembrou agora?

-- Não é bem assim que eu lembro.

-- Como não?! Não fui eu que iludi você.

-- Eu nunca iludi você, Laura. Eu beijei você e estava determinado a terminar com a Thalita, mas você disse que havia sido apenas um beijo e estava envergonhada, que era para eu esquecer. E eu me obriguei a esquecer.

-- Eu nunca disse isso.

-- Disse sim, Laura. Em uma mensagem de texto, eu que fiquei magoado, porque nem mesmo conversar comigo você quis. Então contei pra Thalita e ela riu, porque também havia beijado outro rapaz e ficamos bem.

-- Tão bem que ela te abandonou no altar -- eu não queria ter dito aquilo, Moabe, mas escapou. Ele me olhou com seriedade e mais uma vez minhas bochechas esquentaram -- desculpa. Não deveria dizer isso. -- Então a coisa mais estranha aconteceu, ele riu.

-- Eu não fui abandonado no altar, Laura.

-- Ela ter ido embora duas semanas antes do casamento é praticamente a mesma coisa.

-- Esse é o problema das fofocas, elas nunca contam a verdade. Thalita não me abandonou, nós percebemos que não nos amávamos o suficiente para casar. Quando éramos crianças nossos pais disseram que iríamos casar e parecia natural concordar com eles e por isso namoramos desde sempre e teríamos casado com toda a certeza se o que sentíssemos um pelo outro fosse amor de verdade e não apenas um gostar quase que fraterno.

-- Isso é sério?

-- Sim. E ela foi embora porque recebeu uma proposta excelente, não tinha porque ficar. Nossas brigas sempre giravam em torno disso, a vontade dela de ir embora e a minha de não querer deixar Campos Verde.

-- E vocês não perceberam antes de organizar o casamento que não se amavam?

-- A gente achou que gostar fosse suficiente, mas graças a Deus percebemos que não era.

Conversamos por mais algum tempo, Moabe, no fim de dez minutos eu não estava com vontade de sair correndo, só de me esconder por acreditar nas fofocas que faziam. Ele disse que também havia uma fofoca sobre mim, a de que eu estava completamente falida, que era por isso que tinha voltado para Campos Verde. Ri pois mesmo sendo uma enorme mentira, parecia uma verdade para quem olhava de fora, afinal, eu passo os dias no sítio, acompanho com frequência minha mãe nas visitas, ajudo meus avós na feira aos sábados (deixaram de ir aos domingos, porque "são muito velhos para continuar com essa rotina exaustiva", palavras do seo Jeremias depois de ser convencido pela Mara a tirar um dia para descansar) e o principal, meu guarda-roupa se resume as mesmas quatro saias e meia dúzia de blusas que uso desde quando cheguei aqui. Admito que minhas saias estão um tanto gastas e as blusas mais largas do que eu gostaria, mas minha aparência é a última coisa que me importa, sério, se as roupas não estão rasgadas e continuam cabendo em mim por que vou me dar ao trabalho de comprar novas? Eu já tenho dois vestidos, uma saia e duas blusas bem bonitos e novinhos que minha mãe comprou para mim e são minhas roupas de sair. Não vou comprar roupas novas só para mostrar para as pessoas que eu tenho dinheiro.

Não vou mesmo, Moabe.

A conversa com o Josafá me lembrou porque não vale a pena acreditar nas conversas alheias.

E também me fez mandar uma mensagem para a Mimi e a sua super memória, porque eu tenho certeza que nunca enviei nenhuma mensagem para Josafá dizendo que eu tinha me arrependido do nosso beijo. E a Mimi estava aqui comigo na época, ela com certeza vai me fazer lembrar desse suposto SMS e o porque fiz algo tão idiota.

Mozart está aqui do meu lado na cama completamente exausto, eu só queria saber como um cachorro tão enorme quanto ele consegue entrar silenciosamente no meu quarto sem que minha avó veja, ou talvez, assim como eu, ela fingi que não vê e simplesmente aceita que deixar ele dormir aqui é muito melhor que carregar trinta e dois quilos escada a baixo.

Com amor,
Laura.

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Surpresa!

Agora que estamos na reta final as cartas (que estão todas concluídas, falta apenas dar uma revisada na 39° e no epílogo) serão publicados com maior frequência!

Comemora!!

Ps. Não esquece a estrelinha, okay? Okay. E me diz o que está achando. 😊😊

Beijos e chocolates,
Juliane Patrícia, 01/10/2019

[CONCLUÍDO] CARTAS À MOABE - O Encontro de Uma Mulher Com Seu DeusOnde as histórias ganham vida. Descobre agora