Capítulo XIX

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No dia seguinte, decidimos não ir na festa. Benny apareceu para nos dar uma carona, mas já estávamos absortas demais nas comédias românticas que nos faziam chorar para sair de casa e encarar o mundo real.

- Isso aqui tá uma bagunça. – ele comentou, ao entrar no meu quarto.

Ele estava certo. As cobertas nos envolviam até o pescoço, os lenços de papel se espalhavam ao nosso redor, a única iluminação vinha da televisão e nossos olhos estavam inchados. Dei de ombros e funguei.

- Estamos sofrendo. – respondi.

- Por quê? – ele fez um gesto impaciente com as mãos. – Eles não estão mortos, só não podem mandar notícias agora.

- Nós sabemos, mas sentimos saudade. – Julie respondeu, suspirando triste.

Benny nos encarou em silêncio por alguns instantes.

- Não se afoguem nas lágrimas enquanto estou na festa. – meu vizinho tentou fazer uma piada, mas não rimos. – Não gosto muito de funerais, e eu precisaria explicar para os namorados de vocês o que aconteceu.

Sua expressão se tornou séria. Despediu-se e saiu de lá, deixando-nos sozinhas novamente. A situação estava tão deprimente que meus pais estavam evitando vir no meu quarto e conseguimos acabar até mesmo com a aura animada e brincalhona do Benny. Max era o único que não parecia se abalar. Mesmo estando no trabalho, mandava mensagens de vez em quando, perguntando sobre o enredo das histórias.

O filme de agora falava sobre um casal separado pela guerra (Julie escolheu muito bem o que assistiríamos hoje), e a narrativa seguia o drama da garota que tentava seguir a vida longe do amado. Agora, a cena mostrava a garota chorando desesperadamente, olhando para os céus como se pedisse ajuda para as forças divinas.

- Nós somos um clichê, amiga. – Julie me encarou, genuinamente chocada.

- Você realmente só percebeu isso agora? – apontei ao nosso redor. – Olha a nossa situação.

- Ben estava certo. – ela concordou, com um suspiro.

Voltamos a assistir ao filme e choramos muito (muito mesmo) quando descobrimos que o marido dela morreu e ela precisou lidar com o luto. Não conseguimos evitar os pensamentos em relação aos nossos próprios amores. O que faríamos se eles morressem? Como conseguiríamos seguir em frente? Não sei como as coisas perderam tanto o rumo, mas chegou um momento da noite em que estávamos soluçando e tentando consolar uma a outra.

Foi quando Benny abriu a porta de novo, segurando uma sacola de supermercado.

- Parem já com isso. – seu tom de voz era autoritário. As únicas vezes que o vi falando daquele jeito, era quando estava no gelo gritando com os colegas de time durante as jogadas.

Olhamos para ele, sem entender. Ele fechou a porta com força. Encolhi-me por conta do barulho.

- Eles não estão mortos. – afirmou. – Então, parem de agir como se estivessem. Além disso, homem nenhum deveria ser o centro do universo de vocês.

Nunca pensei que ouviria Bendyk Budziszewski falando esse tipo de coisa. Ele olhava, furioso, de uma para a outra. Não ousamos falar.

- Elizabeth, você tem seus quadros e seus sonhos. – prosseguiu, voltando sua atenção para mim. Em seguida, virou-se para minha melhor amiga. – Juliette, você tem suas esculturas e maquiagens. O mundo não acabou, suas merdinhas.

Julie parecia tão sem reação quanto eu.

- Sem contar que vocês têm amigos maravilhosos como eu que desistem de festas porque estão preocupados com as duas choronas. – ele resmungou, tirando da sacola o que tinha comprado: um pote de sorvete.

Arte & GuerraWhere stories live. Discover now