Capítulo 64

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  Ian estava com uma expressão extremamente séria, eu o conheço o suficiente para saber que ele quer ser ouvido, e fará qualquer coisa para ter minha atenção.
- eu tenho o direito de não querer falar com você! -falei mau humorada.
- eu sei, e respeito isso. Acontece Helena que eu preciso falar com você.
  Fiquei em silêncio.
- vamos, não tenho a noite toda! -falei dando as costas para ele e indo para a janela.
- não faça isso! -disse ele.
  Seu tom de voz me obrigou a me virar e encarar ele.
- não faça isso você Ian. Tem noção do quanto fui humilhada? Sabe o quanto eu sofri ouvindo as gracinhas do seu pai pelos corredores? Aturar Pietra se vangloriando? Eu não tenho sangue de barata Ian...
- eu sei Helena. É por isso que vim aqui! Você precisa me ouvir.
- estou ouvindo Ian!-falei irritada.
- sei que o que vou te dizer não justifica os meus atos, mas preciso que ao menos tente entender meu lado.
  Cruzei os braços com força para conter a vontade de estapear Ian.
- eu não sei explicar o por que fiz aquilo...
- e nem precisa. Está bastante óbvio para todos nós. Você precisava aliviar a tenção! É natural!
- que? Não Helena, assim você me ofende. De onde tirou essa ideia? -perguntou ele indignado.
- talvez eu seja esperta o bastante e tenha chegado a essa conclusão sozinha. Mas não foi isso. Seu pai fez questão de me falar isso. Ele disse que é coisa de homem e eu não entenderia.
- meu pai o que? Ah isso não importa agora!-disse ele frustrado.
- tem razão. Não importa! -falei com raiva.
- Helena, por favor entenda! Eu... Eu não sei o que aconteceu. Quando eu vi você e Dorian aos beijos, eu...
- você o que Ian? -perguntei séria.
- eu não sei!-disse ele passando as mãos no cabelo.
- imagino que não, já que não pode verbalizar isso!
- Helena, foi... Foi doloroso. Eu não conseguia entender o motivo daquilo. Fiquei cego de fúria. Você não entenderia...
- não Ian. Eu sou a pessoa que mais entende o que você sentiu.
  Ele me encarou por alguns segundos, parecia nunca ter pensado nisso, e ficou ainda mais claro que não quando ele cobriu a boca com uma das mãos e suspirou.
- Mas ao contrário de você Ian, eu não bebi até o esquecimento e não dormi com meu cunhado. Eu simplesmente preferi chorar no meu quarto, sozinha. Sem causar dor a ninguém.
- Helena, eu não fiz de propósito. Foi um acidente. Não planejei ir pra cama com Pietra. Eu a detesto. Eu estava bêbado Helena, bêbado e chateado. Uma combinação perigosa. Não me lembro de ter ido pra cama com Pietra, porque provavelmente pensei que fosse você... Porque era em você que eu estava pensando. Era com você que eu queria estar lá...
  Suas palavras me pegaram de surpresa e lágrimas ameaçaram a brotar em meus olhos.
- não! Não é assim que funciona.
  Eu ia expulsar ele do meu quarto, ia mesmo. Mas ao passar do seu lado para abrir a porta, Ian segurou meu braço e me puxou para que eu ficasse frente a frente com ele.
  Estávamos muito próximos um do outro. Nossas respirações estavam ofegantes. Nossos olhos se encontraram por uma fração de segundos antes dos olhos deles se desviarem para a região do meu colo. Seus dedos suaves fizeram um percurso perigoso, primeiro ele acariciou meu pescoço, depois mais abaixo e então muito próximo aos meus seios.
  Meu corpo reconheceu seu toque, e a tensão que eu estava sentido se transformou em outro sentimento, como uma necessidade.
- o que aconteceu? Esses arranhões. Como conseguiu?- perguntou ele suavemente em meu ouvido.
  Essa proximidade não me deixava pensar. Seus dedos continuavam me fazendo carícias. Sua boca estava próxima da minha. Ele beijou o canto o esquerdo da minha boca e me segurou pela cintura, me aproximando ainda mais dele.
- um gato me arranhou! -menti com a voz rouca.
  Ian não pretendia parar, suas carícias e seus beijos eram viciantes. Seu toque era como estar sonhando. E era isso, um sonho que virou pesadelo.
  Lembrei que suas mãos acariciaram Pietra. Que sua boca a beijou, que ele fez juras de amor a ela.
  Eu prometi a mim mesma que não deixaria ele me tocar.
- não me toque! -falei com raiva.
  Me desvencilhei de seus braços e fui diretamente para a porta do quarto.
- Helena, por favor...
- vá embora Ian!- falei com raiva abrindo a porta.
  Ian saiu lentamente e ficou parado lá me encarando.
  Antes que Ian pudesse proferir suas próximas palavras, umas batidas urgentes foram ouvidas.
- o que é isso? -perguntei assustada.
  Ian olhou escada abaixo em direção a porta. Não demorou para que novas batidas fossem ouvidas.
- fica aqui!-disse Ian descendo. - E tranque a porta!
  Obviamente, eu sou Helena De Castro. Eu não obedeço ninguém, nem se minha vida depender disso.
  Desci as escadas dois degraus por vez e vi Ian conversando com um homem na porta.
  Cheguei a tempo de ouvir a notícia que que mensageiro trouxe.
- Sinto muito em ser o portador dessa lamentável notícia Senhor Seymour. Mas infelizmente a carruagem em que o Barão e a Baronesa viajavam perdeu uma das rodas e também o controle. Foi um acidente terrível. É com pesar que lhe comunico a morte do Barão e da Baronesa de Bell Fontaine.
   Ian caiu de joelhos no chão e eu não pude resistir as lágrimas e soluços que me consumiram.
  O homem que trouxe a notícia se retirou em silêncio solidário ao nosso sofrimento.
  Ian estava desoldo no chão, ele nem se que chorava. Ele estava tão surpreso com a notícia que não tinha nehuma reação.
  Eu também não conseguia me mover.
  Eu lembrei da última vez em que os vi no noivado. Estavam tão felizes com a adoção de Maria. Izabel era sempre tão radiante, espontânea, amável, doce e prestativa. Ela era um amor de pessoa, tão nobre e sábia, tão elegante e imponente, uma verdadeira Baronesa em cada aspecto de sua existência. Não a conheci como gostaria, mas o pouco que convivi com ela foi o suficiente para me fazer amar ela como uma avó. A avó que eu sempre quis ter e nunca tive a oportunidade. Aquela com cabelos brancos e conselhos sábios sobre o amor. Aquela senhora que da vontade de abraçar só de ver seu sorriso sincero. A mulher mais impressionante, perspicaz, geniosa, espontânea e sofredora, mas no fim foi feliz. Feliz por ter encontrado o amor. Por ter sido amada e amado o suficiente para me fazer querer ser como ela. Digna de respeito e amor.
  Não tive muito tempo para conhecer o barão de forma mais íntima, mas memo assim o conheci o suficiente para dizer o quanto eu o admirava. Seu caráter, um homem íntegro, respeitando e de opinião forte. Um homem com grandes feitos e com muito para ensinar. Ele era o ideal de avô dos meus sonhos. Lembro-me do dia em que eu fiquei observando ele em seu momento de leitura, usando seu melhor terno xadrez, sentado com as pernas cruzadas, sua expressão de concentração enquanto segurava um livro aberto em uma mão e na outra uma xícara de chá. Seus cabelos grisalhos estavam desalinhados e seus óculos escorregando de seu nariz, mas isso não o incomodava. Naquele dia tive certeza de que eu o amava, assim como eu amava Izabel. Era um homem com tantas qualidades, tinha ótimos concelhos, era sensato e sempre era ouvido. Sua sabedoria era vista por qualquer um que se dispusesse a ouvir suas palavras. Ele sabia se impor, sabia ser desagradável e rude quando era preciso. Mas ele também era caridoso, bondoso e amável. Ele amava tanto Izabel e Ian, que lembrar do noivado me fez perceber que aquela despedida, foi realmente uma despedida. A última delas.
  Era o fim do casal mais maravilhoso, bondoso e amável que eu conheci. Era o fim de um amor. Morreram juntos, nenhum jamais terá que viver sem o outro. Nenhum deles terá que saber como é viver sentindo saudades do único amor de sua vida. Não precisaram viver se perguntando se a solidão era castigo por ter amado pouco. Eles estão juntos e em paz, isso me conforta.
  Caí de joelhos ao lado de Ian que estava com o corpo trêmulo.
  Ian me olhou nos olhos e vi tudo que passamos ali e percebi o quanto ele estava sofrendo. Ele amava de mais esses dois.
  Abracei Ian com força e ele correspondeu. Nossos soluços e lágrimas de saudades estavam ecoando pela casa, fazendo um eco assombroso.
- eles estão em paz!-sussurrei em meio as lágrimas.
  Ian não respondeu, apenas vi quatro velas aparecerem subitamente na escada.
- o que diabos está acontecendo aqui? -perguntou o Senhor Seymour irritado.
  Ninguém respondeu, apenas nosso choro estava sendo ouvido.
- O que está acontecendo? Helena está ferida?-perguntou Dorian.
  Ian levantou a cabeça e disse com a voz rouca:
- o vovô e a vovó... Estão mortos!
  Dorian abaixou a cabeça e sentou ao pé da escada. Vi seu corpo tremer mas não tenho certeza se está chorando. Pietra apenas ficou encarando o nada e o Senhor Seymour, bem não houve reação da parte dele.
  Infelizmente Virgínia não se conteve, ela desmaiou caindo da escada.
  A tristeza consumiu a família Seymour.

Casamento Arranjado [Completo]Where stories live. Discover now