O n e

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      – O n e 

Fumo cinza abandonava os meus lábios, enquanto sentia todo o meu corpo a relaxar.

Desde que o racismo virou moda que esta era a minha rotina: Chegar a casa após um dia de tortura, fumar até a minha garganta não poder mais, chorar até que as lágrimas sequem, e por fim cortar a minha pele.

Naquela espelunca a que todos chamam de escola, eu sou julgada a cada passo que dou, julgada por ser alta, julgada por ser magra, julgada por ter o cabelo volumoso,  julgada pela minha cor de pele.

Não entendo como é que isto chegou a este ponto, não sei quando é que de repente troçar com alguém só por essa pessoa ter uma raça diferente da sua, tem piada.

 Toda a minha vida vivi a ouvir a minha mãe dizer que se eu acreditasse em deus, ele iria ajudar-me a passar qualquer coisa, mas eis que eu chego por fim, á conclusão que tudo não passava de uma mentira. Não que eu não acredite que ele existe porque lá no fundo, eu sei que ele existe, mas ainda assim ele não ouve as minhas preces.

Quando o meu cigarro chegou ao fim, atirei pela janela sem me importar se acertava em alguém que passava, era o quinto que fumava, e para ser sincera a minha garganta já tinha um certo ardor.

Não sei ao certo á quanto tempo estou neste quarto, mas desde que cheguei que choro e tenho plena noção que os meus olhos devem estar inchados, e os mesmo ardem tal como a minha garganta. Os meus lábios não deveriam estar muito melhores, sentia-os secos, desidratados.

Escorreguei pela parede fria do meu quarto até me encontrar sentada no chão, puxei os meus caracóis para trás, enquanto grunhia em frustração.

A minha mão foi de encontro a um objeto cortante: A minha lâmina.

Não precisei de pensar muito para saber como utilizá-la ou se deveria fazer mesmo isto, como disse este ato era já uma rotina.

A lâmina foi de encontro á minha pele achocolatada, e foi num movimento rápido que um fio de sangue apareceu no mesmo, a seguir a este, outro e outro veio, e como de costume apenas parei quando ouvi a porta de baixo a bater, o que queria dizer a que minha mãe já se encontrava em casa.

Entrei na pequena casa de banho do meu quarto – onde azulejos pretos e brancos formavam um padrão. – E segui para o lavatório lavando o meu pulso ensanguentado.

- Elaine? – Ouvi leves batidas na porta do meu quarto.

Coloquei a manga da camisola para baixo, e dirigi-me á porta, abrindo-a.

- Sim Isaac? – Abri a porta encontrando o meu irmão.

- A mãe pediu que viesses ajudar com o jantar. – Falou beijando o topo da minha testa.

Isaac, não era meu irmão de sangue, (embora eu o considerasse e chamasse de irmão) notava-se que não era meu irmão por ser branco, a minha mãe acolheu-o quando os seus pais morreram num acidente de carro. Eles eram um casal amigo da minha família, então o tribunal acabou por dar a custódia dele á minha mãe, visto que a sua avó não se encontrava em condições para o fazer.

Isaac era um rapaz alto, pele dourada, cabelos escuros penteados num topete agora um pouco despenteado. Tinha olhos grandes de um castanho esverdeado, fazendo-me lembrar das tardes que passávamos em família na quinta dos carvalhos território dos meus avós, os seus lábios eram médios, mas ainda assim, o lábio inferior era um pouco maior que o superior, eram rosados fazendo-me lembrar o meu gloss de pêssego.

- Eu vou já, e tu vens comigo! – Sorri ligeiramente, entrelaçando o meu braço no dele, fechando a porta com a mão livre.

- Se a cozinha acabar queimada, depois queixa-te. – Resmungou, dando um pequeno sorriso.

Racism | njhWhere stories live. Discover now