2. A escola de magia

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Kurdis franziu a testa ao observar o portão pequeno, torto e sem graça, com quase toda tinta verde descascada.

— Pensei estarmos indo para a escola.

— Exatamente. É aqui.

Kurdis olhou ao redor, ainda duvidando. Era uma casinha velha, caindo aos pedaços, espremida entre duas construções feias, porém maiores. A calçada toda esburacada tinha poças de lama e havia dejetos fedorentos em toda parte. Um estreito jardim que antecedia a porta tinha vasos e plantas mortas.

O bairro era um lugar estranho, pobre, mal cuidado e com pessoas maltrapilhas vagueando por ali. Membros de sua família e círculo social nunca frequentariam um lugar como aquele.

— Estava esperando o quê? Um palácio? Ora, pare de torcer o nariz! Abra a porta e entre de uma vez!

O garoto baixou a maçaneta e entrou carregando apenas uma trouxa com seus pertences nas costas.

O interior era úmido, escuro, sujo e cheio de teias de aranha. Os móveis estavam quebrados.

— Essa espelunca é a escola da Ordem Maihari?

— Sim. E sua primeira tarefa aqui é fazer uma limpeza decente.

— E eu sou lá um criado? Eu não vou limpar esta pocilga!

Kurdis não viu de onde veio o golpe. Se é que aquilo foi um golpe. Com o rosto colado no chão, sentiu a textura da sujeira acumulada.

Que porcaria é essa?

— Ei! Me dexx shair...

Era como se um diromi estivesse sentado em cima do rapaz. Sentia um peso imenso sobre si, mas não conseguia ver nada com o canto dos olhos. Até mesmo falar estava sendo difícil.

— Escute, rapaz. Sei que você cresceu numa família abastada. Foi mimado, mas eu preciso que entenda. E entenda depressa: se não estiver disposto a seguir minhas ordens, e depois, os preceitos de nossa ordem, você estará morto.

Dão dá pa.. reshpir... cof, cof...

Lorran fez um gesto com as mãos e o rapaz conseguiu se desgrudar do chão. O ar invadiu seus pulmões que já queimavam. Seu corpo doía e não conseguiu ficar de pé de imediato.

Ah, seu desgraçado! Será que o destino de todos meus professores será morrer queimado?

— E só para deixar claro, eu não falo morto no sentido figurado. Eu digo: literalmente morto. Só há uma opção para você se quiser viver: aprender magia e tornar-se um de nós. Ou então, morrer. Compreendeu?

— Sim.

— Muito bem! Então, como estava dizendo: hora da limpeza.

Kurdis se levantou bufando. Estreitou os olhos e encarou Lorran.

— Eu não tenho medo de cara feia. Venha, vou lhe mostrar onde fica o material de limpeza.

Droga! Saí das mãos de um babaca para cair nas mãos de outro! Se eu pudesse voltar atrás... Ainda estaria em casa, pelo menos.

— Abra a porta — o feiticeiro indicou com seu cajado, dando três batidinhas nela. Era feita de metal. Uma porta pequena ao lado da escada. O rapaz obedeceu, mas a maçaneta soltou em sua mão.

— Isto sempre acontece.

— Vocês deviam consertar esse lugar!

— Que tal você mesmo fazer isto?

Lorran apoiou-se no cajado e suspirou. Seus olhos verdes, cansados, ficaram perdidos por uns instantes.

— Isso é algum tipo de jogo?

— Jogo? Sim... Um jogo. Diga-me, jovem Kurdis, o que sabe sobre magia?

— Só o que os livros dizem... E histórias. Como a história do guldo Freymuth que derrotou...

— Não perguntei sobre bruxos. Perguntei sobre magia.

Kurdis encolheu os ombros. — Não sei... É o que dá poder aos magos?

— Pelo visto, os livros que leu não serviram para nada. Magia é o nome que os leigos dão para aquilo que não entendem. É um poder? Sem dúvida. É apenas algo inexplicável que os magos fazem? Não. A magia é a verdade que está oculta. Aquele que aprende a enxergar essa verdade, pode então acessá-la.

— Então é assim que vai ser? Aprender magia seria como desvendar enigmas? Eu ia muito bem aprendendo sozinho, sem ninguém para me mandar limpar uma espelunca fedorenta!

— Com o tempo você vai rever essa sua insolência. Eu já fui jovem, até entendo. — Lorran tirou a maçaneta das mãos do rapaz, colocou-a de volta na porta e ouviu-se um clique.

— Pronto, aí está.

Kurdis ficou olhando a maçaneta remendada e pensando sobre a natureza da magia.

Destruir e consertar. Esses são dois lados da magia.

— O que está esperando? A casa não vai ficar limpa sozinha.

— Você poderia usar magia para fazer isso, mestre Lorran.

— Ficou com vontade? Bem, quem sabe você não possa descobrir um jeito de fazer isto por si só? Qual a verdadeira natureza dessa casa? Você consegue perceber?

— Ser nova e limpa?

— Não, nada disso. Veja as tábuas de madeira no chão. Acha mesmo que elas sempre estiveram aí?

Outro enigma. Eu odeio enigmas!

— Mova-se! Tem água na fonte lá atrás. A casa não vai ficar limpa sozinha. E é melhor ela estar limpa quando eu voltar, isto é, se você estiver interessado em jantar.

Demônios! Esse maldito está me convertendo numa porcaria de serviçal! Agora tenho que trabalhar para arranjar um prato de comida.

O Bruxo e a Foice SombriaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora