45. Os Wux'shien

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Com os calos totalmente curados, e as botas amaciadas por longas caminhadas, Kurdis se aproximou da Torre Prístina sentindo boa disposição. Huon apontou para a edificação, do outro lado da montanha. A torre era um edifício largo, retangular e de aparência robusta. Um caixote construído com grandes blocos pedra cinzenta, mas com um topo levemente piramidal. Os últimos três andares eram progressivamente mais estreitos seguindo uma mesma proporção. A construção contrastava com as montanhas de rochas claras em tonalidades alaranjadas e bejes.

Para chegar ao local, havia uma longa ponte de madeira cruzando uma garganta. No fundo, corria um rio de águas caudalosas. Kurdis observou que o edifício parecia estar sozinho, sem casas ou outras construções nas proximidades. Parecia um lugar bastante desolado, ou mesmo, abandonado.

— Os Wux'shien realmente habitam a torre?

— Sim, din Daman. Extraem tudo que necessitam, água e alimentos de uma forte magia que habita seu interior. Ao menos isso é que me disseram... Eu nunca entrei na torre para saber.

A dupla cruzou a ponte e se aproximou da torre. Vista de perto, a fortaleza parecia ainda mais imponente. O portão principal era relativamente pequeno e tinha a cabeça de um dragão esculpida em seu entorno, de modo que a porta ficava circunscrita à boca da criatura. Eles caminharam até ficar a poucos metros de distância da entrada.

— E agora? — indagou Kurdis.

— Vamos aguardar — Huon cruzou as pernas e se sentou deixando a coluna ereta e segurando os joelhos afastados.

Guank se manifestou: "Eu não tenho a paciência de seu guia... Repita comigo..."

— Koun j'kan, merlina gulanz forreval! — Kurdis pronunciou as palavras, mesmo não sabendo o significado. Não se pareciam com o idioma kunério que vinha aprendendo, talvez, fosse uma forma antiga.

Imediatamente, ouviu-se o som de estalos atrás do portão. A pesada porta de pedra começou a deslisar para cima. O interior da torre era escuro, de modo que a boca do dragão esculpido tomou semelhança de uma entrada de gruta.

Huon teve um sobressalto, perdeu o equilíbrio e apoiou-se nos cotovelos para não cair para trás. Deixou escapar — Pelo braço de Vikander!

Antes que Kurdis pudesse avançar para entrar na torre, dois pontos de luz esverdeados surgiram em meio ao breu do interior. Eram como os reflexos de luz no fundo dos olhos de um gato. Aqueles olhos, embevecidos em fluxo de magia, pertenciam a um dos Wux'shien.

O sujeito magro, alto, caminhava em passos curtos e leves, quase como se estivesse volitando. Sua túnica escura revelou uma trama de bordados geométricos feitos com fios dourados, assim que a luz do sol bateu no tecido. Tinha longos cabelos pretos lisos e escorridos e um par de bigodes que desciam abaixo do queixo pelo canto dos lábios. As sobrancelhas eram grossas, severas. A pele marmorizada parecia não ver a luz do sol há muito tempo. Sua figura humana se confundia com uma aparição espectral. Assim que pisou para fora da torre, na luz do dia, seus olhos voltaram a parecer humanos, grandes, castanhos, amendoados e expressivos. Ele apontou o dedo para Kurdis, revelando sua mão cheia de veias e rugas. A mão de um ancião, mas seu rosto era o de um jovem.

— Qual seu nome estranho? — sua voz era suave, tranquila e baixa.

— Kurdis, da casa Daman.

— Eu sou Tian, guardião do portão. Por que veio até nós?

"Ajoelhe-se. Toque o testa no chão e peça acolhimento. Diga que é um iniciado, mas que deseja aprender mais."

Kurdis obedeceu à sugestão de Guank e prostrou-se diante de Tian.

O Bruxo e a Foice SombriaWhere stories live. Discover now