Almoço tenso

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Almoçamos aquela típica comida do interior. Arroz com feijão, frango ensopado, angu, abobrinha e salada. Tava tudo uma delícia. E de sobremesa tivemos um pudim de leite condensado. Maravilha.

Tava tudo muito bom, mas não podia adiar mais o motivo da minha visita. Tomei coragem e comecei.

- Mamãe e papai, preciso conversar uma coisa com vocês.
- Pode falar, minha fia - disse minha mãe.
- Quando fiquei sabendo que tinha esse problema de incontinência, eu fiquei arrasada. Mas aos poucos eu fui aceitando e também aceitando o fato de eu ter de usar fralda. Depois de uns tempos descobri que a Sabrina tem o mesmo problema que eu. E por causa disso nos aproximamos mais e mais. E em decorrência dessa aproximação acabamos percebendo que gostávamos mais uma da outra para sermos apenas amigas. E dessa amizade nasceu um amor muito forte entre nós duas.
- Isso qué dizê que tão namorando? - perguntou minha mãe.
- Sim mamãe, é isso mesmo. Eu e a Sabrina não somos só amigas, somos namoradas.

Nessa hora a cara do meu pai que já era séria, fechou ainda mais. Levantou de rompante e entrou no quarto batendo a porta forte, mas antes soltou um " sem vergonhice".

- Papai !!! - gritei
- Deixa Alice. Depois eu converso com ele - disse minha irmã calmamente.
- Eu já sabia disso - disse minha mãe, séria.
- Co...como assim...eu não disse nada...
- Eu sô sua mãe. Acha que eu não te conheço? Desde que ocê chegou eu vi o chamego entre ocêis duas.
- Dona Maricota - disse Sabrina, que até então estava calada - a sua filha é a pessoa mais linda e maravilhosa que conheço. Eu a amo tanto que quero protegê-la o tempo todo.
- Eu vi o jeito que tava cuidando dela hoje quando chegaram da rua. Lavando os machucado dela.
- A gente não escolhe de quem a gente vai gostar - disse eu - se a senhora conhecesse a Sabrina um pouquinho mais, ia saber oque eu estou falando. Essa menina é maravilhosa.
- Oque esse povo daqui vai falar.
- Ninguém precisa saber...a gente nem mora aqui. Nos nem demos as mãos no nosso passeio na cidade.
- Minha fia - disse minha mãe olhando pra Sabrina - eu sei que ocê é uma boa moça. Eu num tenho nada contra ocê. Mais ocêis duas tinha de procurá uns rapais procês namorá. Menina num namora com menina.
- Nos não gostamos de meninos mãe.
- Porque não? Tem uns moço tão formoso por aí.
- Mamãe, se algum rapaz soubesse do meu problema, de eu ter que usar fralda, ia caçoar de mim até o fim da vida, além de espalhar pra todas as pessoas que ele conhece e as que não conhece também. Eu e a Sabrina sabemos muito bem oque cada uma passa e juntas nos ajudamos. A nossa união faz isso ficar menos pior. Uma razão da gente encarar isso com mais tranquilidade é o nosso amor, uma pela outra.
- Uai sá...num tinha pensado desse jeito ainda.
- A Sabrina foi uma anja que apareceu na minha vida, e tenho certeza que ela pensa o mesmo de mim.
- É isso mesmo - enfatizou a minha namorada - antes eu era calada, tímida e depressiva, mas depois que comecei a namorar a Alice, tudo mudou. Hoje sou uma garota alegre, falante e otimista.
- Divera? - quis saber minha mãe.
- Sim, mamãe... é isso mesmo.
- Uai meninas, já que ocêis gosta uma da outra e isso tá fazendo bem procêis, eu num vô nem assuntá mais não.
- Aí mamãe, muito obrigada...a senhora é uma mãe e tanto viu.
- Eu quero ver é ocêis feliz.

Depois daquela conversa fomos pro meu quarto, deitei na cama e enchi a fralda. Tava apertada pra fazer cocô, mas fiquei com medo da minha mãe escutar o barulho. Fui fazendo sem reserva e a fralda ficou beeem cheia. 

A Sabrina olha pra mim de um jeito que já sabia oque era:

- Não, não... não vou me limpar agora. Primeiro vou tirar uma soneca.
- Tudo bem. Mas fiquei numa dúvida. Quando eu falei pra sua mãe que tinha mudado, ela respondeu falando, divera. Oque é divera?
- É algo como: uau, que informação legal, mas isso é verdade mesmo?

Em resposta a Sabrina começou a rir. E por fim falou:

- Uma palavrinha só, é tudo isso.
- Aqui eles abreviam tudo.

Já ia dormir quando escutei a minha irmã entrando no quarto dos meus pais. Nas casas do interior as paredes não chegam até o teto. Tem a parede e o telhado, então fica aquele vão. Aí da pra escutar nitidamente.

- Papai, queria conversar com o Senhor - falou minha irmã calmamente.
- Oque foi... você tem uma namorada também? - perguntou ele rispidamente.
- Não papai...eu nem tô namorando.
- Veio falar sobre sua irmã né. Você sempre defendeu ela.
- Papai. Tadinha dela. Ela tá doente.
- E pur causa disso tem de namora muié?
- Foi a única pessoa onde encontrou apoio além de mim. A Sabrina tem o mesmo problema dela e uma ajuda a outra.
- Mas tem de ajudar namorano?
- Quando elas começaram a se ajudar, elas começaram a gostar uma da outra. Elas são proibidas de amar?
- Não, mas...
- Então...elas tinham tudo em comum, cada uma supria as necessidades uma da outra. Acabaram de apaixonando. Elas tem culpa disso?
- Mas é que...
- Papai... não fica bravo com ela não. Ela sempre foi uma filha exemplar. Nunca deu trabalho pra vocês. Ela veio aqui principalmente pra pedir a autorização de vocês. Olha pro senhor ver o tanto que ela é responsável. Podia continuar namorando lá em BH e vocês nem iam saber. Mas ela quis vim aqui falar com vocês pois mesmo estando longe ela tem respeito principalmente pelo senhor. Por favor, num fica bravo com ela não. Nessa hora ela precisa do apoio de vocês.
- Tá bão...mais tarde eu falo com ela.
- Obrigada papai...o senhor é um amor.

Quando eu olho pra Sabrina, que estava atenta a conversa, ela olha pra mim e faz um coraçãozinho coreano. Eu respondo fazendo o mesmo com um sorriso no rosto. Agora sim, poderia tirar um cochilo.

Acordo umas quatro e meia. Vejo a Sabrina dormindo. Que linda. Saio sem fazer barulho e vou tomar um banho. Tiro aquela fralda cagada e coloco ela numa sacolinha e dou um nó apertado antes de jogar no lixo. É como eu faço pra não deixar o ambiente com um cheiro desagradável. Tomo um banho caprichado e quando volto pro quarto encontro minha namorada com os olhinhos abertos.

- Quer tomar um banho amor?
- Preciso.

Enquanto ela foi tomar banho, eu coloquei uma fralda limpinha. Também vesti uma calça jeans cintura baixa e uma blusa de malha branca que não era das mais compridas, de modo que toda vez que eu sentava a fralda ficava a mostra.

Quando a Sabrina voltou do banho eu saí do quarto pra ela se vestir. Não queria dar má impressão prós meus pais. Logo em seguida a Sabrina sai com uma calça vermelha e uma blusa branca com estampas indianas. Lembrei que essa calça dela era de cintura baixa também, igual a minha.

Fomos tomar a café da tarde. Como sempre, tinha muita quitanda. Aquelas guloseimas com leite puro era um manjar. Que delícia. De repente meu pai entra na cozinha, vem em nossa direção e diz:

- Minha fia. Quero que me desculpe pelos meus modos. E se você gosta dessa moça, que ocêis seja muito feliz com ela.

Voei no pescoço do meu pai dando um abraço apertado nele. Ele ficou sem jeito e custou a retribuir o abraço.

- Eu te amo muito papai, e não queria fazer nada pra chatear o senhor, nem a mamãe. Mas eu precisava da aprovação de vocês pra ficar tranquila. Muito obrigada.
- Tudo bem, minha fia.

Acabei de tomar meu lanche com muito mais sabor. Ao terminar eu fui até o quarto onde minha irmã estava. Lasquei um beijo da bochecha dela e disse:

- Você é a melhor irmã do mundo sabia.
- Sabia - disse ela com um sorriso sapeca.
- Você foi genial com o papai hoje. Acredita que ele veio me pedir desculpas. Quem diria o velho Nenzinho pedindo desculpas, ainda mais pra filha. Eu fiquei pasma.
- O papai é um doce. A gente só precisa saber aonde mexer pra esse doce aparecer.
- E você é uma especialista nisso. Mana, pode contar comigo pra qualquer coisa que você precisar viu.
- Vou me lembrar disso heim.
- Oque você fez é impagável.
- Você merece. E eu te amo muito viu.
- Eu sei disso. E com sei !!!

Quando fui saindo com a Sabrina eu avisei minha mãe:

- Mãe, nós vamos ali na casa da Maria viu!
- Não fica até tarde tomando sereno não.
- Tá bom mamãe.

A história de Alice Onde as histórias ganham vida. Descobre agora