Adicional I

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Henri

Paris é a minha oportunidade para o sucesso. Foi difícil deixar a minha cidade natal, mas isso foi preciso para que eu consiga ter a oportunidade de me tornar um jornalista de verdade.

Por isso estou aqui nesse apartamento que é minúsculo se comparado a casa dos meus pais, terminando de arrumar minhas coisas nessas prateleiras terrivelmente brancas e sem vidas para que elas fiquem com um pouco de cara de lar.

Lisa, a minha cadela fareja esse apartamento de ponta a ponta. Pelo visto não sou só eu que está achando esse lugar estranho, a final sempre moramos no mesmo lugar e creio eu que depois de quase vinte e quatro anos habitando o mesmo lugar, se mudar para outro apartamento em uma cidade razoavelmente distante de onde nasci seja um desafio e tanto.

As paredes desse apartamento são tão brancas quanto o Alasca e essa mobília cinza é desanimadora. Preciso urgentemente dar vida a esse lugar. Graças a Deus sou o cara certo para fazer isso devido ao meu eu pintor que vive em mim.

Agora são exatamente uma hora da madrugada, estou exausto devido a mudança, por isso me permito ir dormir.

Amanhã terei de me apresentar ao meu novo local de trabalho, uma revista de moda chamada La couture e preciso estar apresentável o bastante para que não percebam que eu passei o meu dia todo desempacotando caixas e mais caixas.

Eu gosto de moda, sempre achei interessante combinar peças de roupas, e acredito que isso seja una arte na qual poucas pessoas apressam por achar que roupas são apenas vestimentas para esconder nossa nudez.

Vou gostar de trabalhar numa empresa que tem esse tipo de foco, e bom, estou aceitando qualquer emprego para realizar o meu objetivo de me tornar jornalista.

Ao contrário da noite passada, o dia amanheceu frio, o que me deixou animado porque amo dias frios já que posso usar roupas com a minha cara. Por isso visto o meu terno preto da Louis Vuitton, a peça mais cara que tenho no meu guarda-roupa para impressionar todos os meus novos colegas de trabalho e especialmente a minha chefe.

Me despeço de Lisa que chora sem parar por ter que ficar sozinha nesse apartamento que só cheira a mofo e a fantasmas e parto rumo a cafeteria que fica a duas quadras do meu novo "lar" para procurar alguma bebida forte que tire a minha ressaca pós arrumação de mudança madrugada adentro.

Escolho um café preto, o meu favorito. E sem açúcar para evitar desvios na minha dieta. Para me dar uma animada e estimular meus músculos, vou até o trabalho caminhando visto que tudo ao meu redor favorece o meu ato, o tempo frio me impede de soar, estou com bastante tempo sobrando para uma caminhada e o trajeto é razoavelmente curto.

Acho que demorei uns quinze minutos para chegar na rua da La couture. Na Normandia eu costumava correr longas distâncias em um tempo ainda mais curto. Meu corpo treinado me possibilitou chegar até aqui sem que eu esteja acabado fisicamente.

O prédio da revista é bem bonito por sinal. Sem muitas cores, mas a sua pegada futurista contemporânea não deixa muito a desejar. As curvas desse prédio dariam uma bela de uma pintura sobre arquiteturas na atualidade.

Dou mais um gole no meu café, que devido ao frio não está tão quente quanto no início. Respiro fundo porque darei um passo muito importante na minha vida. Nessa empresa darei o meu melhor para realizar o meu desejo de trabalhar na área que mais almejo.

— A um novo começo. — Murmurei a mim mesmo dando meu último gole no café.

Ajeitei meu paletó para ficar perfeitamente alinhado. Quero pisar com o pé direito nesse lugar, por isso levanto minha perna direita para que eu de meu primeiro passo com ele.

Estou quase encostando meu calcanhar nesse asfaltamento irregular quando um carro freiou bruscamente em minha direção.

Não acredito que tentaram me atropelar logo no meu primeiro dia de trabalho. Eu sabia que a vida em Paris, por ser mais movimentada iria me requer mais cuidado, mas sinceramente não pensei que poderia ser quase atropelado aqui.

Tento ver a cara do motorista dentro do carro, mas falho miseravelmente visto que o vidro do automóvel é escuro. Só que isso não vai ficar assim, não mesmo.

— Mais que merda é essa? Só pode estar bêbado! — exclamo. Realmente eu estou perplexo, não só porque quase morri, mais porque olha o meu tamanho. Tenho 1,84 de altura, como pode esse ser humano não ter me visto aqui?

Percebo que a porta do carro começou a abrir, então disparo:

— Não me viu aqui não? — minha voz saiu mais alta que o previsto. Mantenho a minha postura, eu sou o certo. Eu quem tenho razão aqui.

Ainda não consigo ver o motorista, por isso vou até a lateral do carro. E aí que dei de cara com uma mulher, que por sinal não era nem tão alta nem tão baixa. Seus cabelos era extremamente lisos num tom de castanho escuro que batiam um pouco a baixo de seus ombros, que particularmente ficaram super atraentes com essa blusa meio decotada.

Conheço bem esse tipo de mulher. Tenho duas teorias sobre ela, ou não tem habilitação ou acha que é dona do mundo.

Ela é muito bonita, não vou negar, mas eu não sou o tipo de cara que deixa uma mulher se safar de uma multa só porque assim, linda pra cacete.

Estudo o seu rosto. Daqui consigo perceber a imensidão de seus olhos negros — o que de alguma forma me faz conectar com ela. Talvez seja o meu fascínio por analisar as misturas de cores que uma íris pode conter —, seu nariz fino e sua boca arredondada e rosada. Se fosse em outras circunstâncias até a convidaria para sair, tomar um vinho talvez. Só que a beleza dela não muda o fato de que quase me atropelou.

— A sua intenção era me matar? Porque se for pode me avisar que eu mesmo faço isso. — falo alto o suficiente, mas ela não parece ouvir. Me analisava de cima a baixo como se eu fosse uma peça de roupa qualquer.

Pelo visto essa mulher quer me fazer de otário.

— Você está maluca? — pergunto tentando tirar o seu olhar de minha calça. Não acredito que ela está olhando entre as minhas pernas.

— Me desculpa, mas o senhor poderia falar um pouco mais devagar? Não entendi uma palavra se quer que o senhor pronunciou. — ela me reponde por fim fechando a porta de seu carro ridiculamente amarelo, ou devo dizer, seu instrumento de assassinato.

Fechei meu rosto. Minha teoria de que ela estaba me fazendo de otário está certa. Sério mesmo que ela fingiu não ouvir uma palavra se quer que eu disse?

— Você quer me matar, sua maluca? — indaguei entrando no seu joguinho. Não sei porque mais senti meu rosto esquentar, coisa essa que nunca havia me ocorrido.

— Me desculpe, mas eu não vi o senhor. — a cínica me respondeu. Mais que mulher cara de pau! Como assim ela não me viu? Olha para mim! Eu sou o cara que os amigos sempre acham primeiro no meio das festas, devido a minha altura.

— Além de assassina é mentirosa! — rebati ajeitando meu terno para mostrar controle. Não vou negar, é difícil não render a uma mulher bonita assim.

Pena que ela quis me matar, e sinceramente sou muito rancoroso.

— Olha só, primeiro: Eu não sou assassina porque eu não te matei, segundo: eu não sou mentirosa e terceiro acho que você já está grandinho demais pra fazer tanto drama. — a mulher fala com a voz determinada.

Respiro fundo. Tentei manter a minha voz menos sarcástica possível quando falei:

— Drama? Você quase me matou sua... — Hesitei. Queria xinga-la, mas não faço isso porque sou um perfeito cavalheiro. — ...barbeira! — completei. Esse era um excelente apelido para ela, combina certinho. — Você tem habilitação ao menos?

— Claro! E barbeira é seu... — ela mesma se interrompeu, me deixando confuso. Depois jogou seu olhar sobre seu carro e completou: — seu imbecil!

E então deu de costas antes que eu pudesse respondê-la. Tenho certeza que meu sangue está fervendo.

Como essa mulher consegue ser tão terrivelmente atraente e cabeça dura ao mesmo tempo?

Mal a conheço mais sei que é do tipo que acabaria comigo em todas as formas possíveis. Não sei porque mais pensar nisso faz minha respiração pesar.

Aonde mora o amor?Onde as histórias ganham vida. Descobre agora