Passagem entre dois Mundos

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    Anastácio viu de longe quando os portões que a levariam para o outro mundo surgiram.
Não eram exatamente portões. Era a passagem mágica entre dois mundos, dois enormes arcos prateados vigiados por duas criaturas aladas, o corpo longo e escamado completamente negro, asas de morcego no dorso e olhos verdes faiscantes.
Eram bem menores do que os dragões que Anastácio vira até agora, tinham o corpo mais fino e longo e sibilavam como cobras furiosas, se enroscando e escalando os arcos prateados.
Jack respondeu sua pergunta antes de ser feita:
   —São dragões tiranos, uma raça menor e mais assassina. São poucos que ainda vivem e são selvagens.
Anastácio se arrepiou no corpo inteiro, o que era bem raro. Ela só se arrepiava em situações de extremo medo ou quando vomitava.
Uma visão atravessou sua mente e ela arregalou os olhos tentando enxergar a realidade, mas em vão. Ela estava numa floresta estranha, e névoa pairava sobre o solo verde cheio de musgo enquanto chovia e trovoava forte.  Vultos escuros passavam por ela disparando por entre as árvores e emitindo sibilos agudos, e ao seu lado estava uma garota alta e branca, de cabelos curtos estilo emo, com uma espada ninja em cada mão e sua bochecha estava cortada.
   —Fuja Anastácio, nem mesmo você pode escapar dele!—Sua voz estava fraca como se viesse de longe, mas sua aparência era de quem gritava sob o barulho da chuva e dos trovões. Anastácio balançou a cabeça com veemência e gritou de volta:
   —Venha comigo! Não posso deixar que você morra!
A garota a olhou com um sorriso triste e os olhos brilhando.
   —Ah, pode sim... —respondeu.—Eu não sou importante, você não sabe a perda de tempo que é me salvar...
Anastácio voltou à realidade e Jack a segurava enquanto pendia mole na sela, com uma expressão de como se fosse completamente normal pra ele segurar garotas que caíam em visões de repente.
Ela se ergueu como um raio e afastou seus braços com um tapa, furiosa por ter sua mente dominada tão facilmente. Bufou quando ele levantou as mãos com um sorriso divertido de desculpas e disse:
   —Me desculpe senhorita, você parecia um tanto indefesa.
Eletirando sarro de mim?! Anastácio pensou furiosa e se virou para a frente. Era por isso que não gostava de garotos. Eles só se aproveitavam das garotas indefesas ou bonitas e no fim as dispensavam, enquanto elas achavam que eram amadas e davam o melhor de si.
E depois, pensou, sofrem em silêncio

Os portões estavam a uns setecentos ou mais metros de distância e se aproximavam rapidamente, até que Anastácio percebeu mais dois dragões pousados no gramado do pequeno penhasco na frente dos portões, que se estendia uns doze metros á frente da passagem mágica.
   —Graças aos deuses... —Murmurou Jack atrás dela ao ver os dois. O sol saiu de trás das nuvens e iluminou os portões e a pequena paisagem em volta, as escamas dos dragões brilharam e Anastácio sentiu seu coração pular, talvez de alegria ou ansiedade... Ela olhou de relance para a garotinha na garupa do dragão verde.
Seu olhar ainda era triste, mas quando o sol iluminou seu rosto ela fechou seus olhos e deixou o vento bagunçar seus cabelos castanhos, esquecendo por alguns momentos a dor de deixar sua família, sem que soubessem de nada.
Ela abriu os olhos e encontrou o olhar de Anastácio, que sorriu pra ela. Ela sorriu de volta fazendo uma cara de quem diz: "Que reviravolta... Ainda não acredito."
Anastácio deu de ombros e sorriu. Era exatamente o que ela também pensava no momento.

O dragão de Edward parecia ser o maior até agora. Ele voava um pouco mais alto que os outros, na formação de V e lançava uma enorme sombra nos dois que seguiam atrás. Anastácio conseguiu deixar a raiva de lado e perguntou ao garoto:
   —Quantos Cavaleiros ainda vamos encontrar? Como eles são?
Jack sorriu de um modo vencedor e seus olhos azuis refletiram a luz do sol.
   —Você logo vai descobrir.

Edward olhava para os outros Cavaleiros interessado. Já havia descoberto o motivo da tristeza de Sam quando Garra de Prata entrou em contato com o dragão roxo Pikan. A não ser ele, todos haviam conseguido encontrar e trazer os jovens em segurança, e agora só faltavam dois pra completar o grupo: Kady e Shilamir. Eram os dois que já esperavam nos portões da Terra da Geada. Eles eram os guerreiros mais experientes entre os Cavaleiros e sempre iam em lugares com maior número de inimigos onde os jovens corriam mais perigo.
A situação não estava nada boa. Kady estava com o braço da espada ferido e um corte feio no rosto, e seu dragão laranja, Bizza, estava com a asa esquerda fraturada em vários pontos. Shilamir parecia bem além de alguns cortes e arranhões.
Dina desmontou e correu até lá assutada.
   —Kady! Você está ferida!
Kady deu de ombros, o que foi um erro horrível, seguindo uma dor cortante do ombro até a mão e ela forçou um sorriso.
   —Dina.
   —O que aconteceu?—Edward perguntou.—A quanto tempo estão aqui? — perguntou preocupado e apertou a mão de Shilamir num cumprimento.
Dina ainda jogava suas preocupações em cima da pobre Kady, e Shilamir disse sério:
   —Parecia que o inimigo sabia exatamente onde iríamos, havia tantos deles lá... —Ele olhou para Kady que aceitava uma bebida curativa de Dina, e disse:
   —Ela estava desmaiada quando viemos, e como Bizza estava com a asa quebrada tivemos que vir andando.
Anastácio não sabia se era impressão sua, mas pensou ter visto uma estremecida de dor no rosto do Cavaleiro. Ele estava ferido e tentava esconder.

Cavaleiros de DragõesWhere stories live. Discover now