CAPÍTULO 24

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Boa leitura!♡

  DEPOIS DE conversar com a Val, fui para casa, tomei um banho e me joguei na cama. Eu chorei escondido de Liu debaixo das cobertas, admito. Não queria que ele me visse tão vulnerável e  frágil daquele jeito. Tomei  alguns calmantes naquela noite para dormir,  tinha que recarregar as minhas forças emocionais para no outro dia voltar bem para ela. 

No dia seguinte quando eu voltei foi um dos meus piores dias, ela estava muito, mas muito vulnerável emocionalmente. Amanda me recebeu com os olhos inchados de tanto chorar naquela noite. Me relatou que dona Damares estava muito emotiva. Respirei fundo e pedi a Deus para me dar as armas certas para enfrentar mais um dia de escuridão. 

Minha mãe estava tão ruim que nem tinha forças para rebater comigo quando eu comecei a cantar para ela alguns hinos da harpa. Eu até arrisquei falar a palavra de Deus. Contei algumas histórias que mostravam o amor de Deus pela humanidade e como ele era especialista em trabalhar na vida das pessoas através da dor. A dor muitas vezes ela vinha não para nos fazer fraco, mas sim para nos fortalecer.

Para tentar distraí-la  comecei a falar de orquídeas, o seu quarto estava repleto deles. Liu pagou a uma floricultura para trazer todos os dias a sua flor favorita aqui no hospital. Achei tão nobre essa atitude! 

Minha mãe adorou. Comecei a perguntar o nome de todas e ela me respondeu pacificamente. 

Na hora do almoço a enfermeira trouxe uma bandeja.

Ela olhou para a bandeja que estava no seu colo com desejo quando de repente começou a chorar. Sem entender muito me levantei preocupada.

— Eu não aguento mais, se eu estou à beira da morte por que ela não me leva  logo para o abismo?  — ela falava entre o soluço. 

— Alice, o fardo é muito grande. Se eu for comer eu sei que eu vou colocar tudo para fora e minha garganta não aguenta mais. Eu estou com fome, admite, mas não tenho forças para aguentar as consequências se eu comer. — sem saber o que fazer eu peguei a mão dela. 

— Eu sinto muito, sinto por não poder fazer nada para ajudá-la. 

Ela chorou depois disso, pedi pra enfermeira tirar a comida do quarto, já que ela não ia comer, não ia deixar ali. 

Tentei reanimá-la mais nada do que eu dizia ou fazia tinha resultado. Que doença terrível! Ela acaba não apenas com quem a possui como também com todas as suas voltas. Literalmente ele foi um tsunami nas nossas vidas, destruiu tudo por onde passava. 

Quando já estava na porta a minha mãe me chamou, ficou me olhando ali sem dizer absolutamente nada por alguns instantes até resolver falar. 

— Muito obrigada por tudo. — falou e eu vi sinceridade no seu olhar. Mais uma vez eu disse que não precisava agradecer, inclinei a minha cabeça e lhe deu um beijo no rosto e ela surpreendentemente me devolveu outro.

Assim que cheguei em casa Liu preparou para mim um café com algumas torradas, engoliu em seco e esfreguei os olhos inchados, prometi a mim mesma que ia me controlar. 

Liu olha para mim ao se aproximar.

— Eu sinto muito por tudo isso , eu acredito que não seja fácil, mas você tem que comer, a perda de peso que você está tendo é muito visível e isso está me aterrorizando.  — ele beija o topo da minha cabeça. 

— E a propósito, chorar faz bem, segurar o choro que não é bom. Você não precisa segurá-lo por mim. Já te falei, chorar não é sinal de fraqueza, mas se for fraqueza, que seja fraqueza então. Ninguém é forte o tempo todo, Alice.  

Depois de escutar tudo isso, não consegui mais manter minha promessa e chorei, chorei e chorei muito. 

De olhos fechados, Liu me levou para o quarto em seus braços e me colocou na cama, eu nem tinha tomado banho. Eu acredito que ele se esforçou muito para fazer isso por mim, porque ele não suportava  que a gente viesse direto da rua e deitar-se na cama com as mesmas roupas.

 Depois mesmo de olhos fechados eu percebi quando ele deitou ao meu lado e então eu adormeci.

De manhã o hospital me ligou para me informar que ela nos deixou pela madrugada, e na mesma hora o meu coração parecia que iria sair pela boca. Ao pensar que ontem foi o nosso último dia juntas, apertou meu coração. Um pouco no automático eu tomei um banho e depois de chorar alguns minutos debaixo dele fui junto com Liu para o hospital. Ao chegar lá encontramos Amanda debruçada sobre o corpo da nossa mãe ao choro. Foi algo que eu não estava preparada. Como alguém está preparado para aquilo? Eu senti quando todo ao meu redor começou a  girar de repente, e então a escuridão me dominou. 

Ao acordar eu estava em outro ambiente mas confortável digamos assim. Ao olhar para a direita, encontrei Liu um pouco assustado me olhando de volta. Ele pegou a minha mão e levou até o seus lábios e plantou lá um beijo singelo. 

Quando lembrei do que tinha acontecido me levantei da cama rápido. São nesses momentos que a gente percebe como  insignificante somos perante a vida, queria poder fazer alguma coisa, mas não sabia como. Passar por isso tudo de novo era agonizante e aterrorizante para mim. 

As lembranças de Amanda em cima da minha mãe aos gritos era perturbador, ela me pareceu tão indefesa, tão assustada. 

Depois eu fui para casa e pedi ao meu marido para ficar um pouco sozinha. Na varanda do quarto  fiquei olhando para a fria chuva de julho que começará a cair. Eu queria que meu coração se acalmasse, pois desde sempre nós sabemos que assim é a vida: nascemos, crescemos e morremos, e nada podemos fazer para mudar isso. Rico ou pobre, um dia vão embora uns de uma maneira mais dolorosa do que outros, porém todos partimos. E assim como fomos feitos da terra voltamos de volta para ela.

O funeral dela foi simples e rápido. Havia poucas pessoas, apenas alguns amigos do seu bairro, os pais de Liu que me deram apoio, Val com sua família, alguns conhecidos da Amanda. Todos nós fomos enterrá-la.  Marcos abraçada a Amanda a consolava constantemente. Eu já estava um pouco mais calma, ela sofreu tanto! Em meio às lágrimas, Amanda relatou que ela teve tanta dificuldade de respirar que o seu pescoço ficou bem inchado. A minha irmã ficou sentada vendo a vida da minha mãe indo embora, e quando ela se foi uma enfermeira ajudou a trocá-la de roupa. Ela foi enterrada com as roupas que queria. Era um vestido verde simples que tinha ganhado do papai pouco antes dele ter partido também. 

Depois que ela foi colocada na cova, aos poucos as pessoas foram indo embora.  Eu fiquei um pouco relutante de ir, mas acabei vencida por Lincoln que insistia em me levar pra casa.

Despedidas são muito dolorosas, mas elas são necessárias. Esse grande planeta nada dura para sempre. Mais cedo ou mais tarde, temos que dar adeus a quem amamos.

  

🍃🍃🍃

Então, é isso.

Meu Anjo Azul #2/ Segunda EdiçãoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora