ATO 20

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Ter varias personalidades não é um problema. Problema é você morrer apenas com uma.

 Problema é você morrer apenas com uma

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— Que garoto estranho. Por que anda desse jeito?

— Porque ele é uma aberração, amiga, não vê? Olha só essas roupas.

Duas garotas cochichavam enquanto um pequeno rapaz passava no corredor das classes.

Era uma escola.

Crianças saiam de todas as direções com uniformes padrões, mas ele se destacava. Tinha cabelos curtos, loiro, pele branca e grandes cílios. Vestia roupas femininas. Um vestido curto, lilás com listras pretas. Calçava um coturno longo, sem cadarço, mas com várias fivelas de metal, e seus lábios estavam muito avermelhados, borrados de um possível batom. Ele caminhava rápido, de cabeça baixa, segurando livros por baixo do braço, ignorando presentes.

Em seguida tudo ficou branco.

Agora encontrava-me em um quarto rosa.

O mesmo garoto estava sentado na cama, de costas para mim. Observava um grande espelho redondo à sua frente. O lugar era claro, com brinquedos em volta. Casinhas, bonecas e blocos de madeira.

— Aqui está, meu amor. Quase atrasamos o medicamento desta vez — uma mulher de vestes brancas e longos cabelos castanhos escuros, carregada de uma pesada maquiagem branca, entrava no local segurando um potinho transparente com comprimidos vermelhos.

Ela sorria.

— Mamãe, por que minha voz tem que mudar?

— Porque você nasceu diferente. Uma menina deve se portar como uma menina, Petúnia.

— Mas eu não sou menina! — exclamava alterando o tom de voz — As outras crianças me ofendem na escola. Tudo por causa dessas roupas horríveis!

A mulher deixou o potinho cair no chão. Os comprimidos se espalharam por toda parte, uns para debaixo da cama, outros rolaram para trás dela. Na sequência, golpeou o menino com um tapa no rosto, fazendo-o cair em frente ao grande espelho, trincando-o.

Uma gota de sangue descia sobre o vidro, fazendo uma trilha em meio aos riscos da rachadura — Jamais repita um absurdo desses, Petúnia! — exclamou, abaixando e pegando o garoto pelos cabelos e prensando seu rosto no espelho quebrado.

— Essa é você! Olhe! Esta aqui é você! Uma garota. Você é o que eu te disser para ser. Vai usar as roupas que eu te disser para usar e se maquiar como uma garota deve se maquiar. Fui clara?

— S-sim senhora... — gemia com o rosto cortado repleto de sangue.

— Agora repita comigo: "Quando eu crescer, quero ser tão bela quanto a senhora" — o menino tremia. Lágrimas misturavam-se com seu sangue.

— Q-quando eu crescer... q-quero se tornar tão bela... quanto a senhora...

— Muito bem! E um dia você vai, minha querida.

O lugar se dissipou como névoa. 

Estávamos em um jardim, com vista de um belo sobrado. Uma garota escovava seus cabelos cumpridos enquanto observava seu gato branco, peludo miar.

— Quieto, Yang, não tem comida para você hoje — dizia aos murmúrios.

— Maravilhosa! — uma voz surgira de dentro da casa — Você está linda, Petúnia!

— Obrigada, mamãe. São os cabelos mais incríveis que a senhora já me dera.

— Foram caros, por isso valorize-os. A franja cobriu todas as cicatrizes, está vendo? Me desculpe por marcá-la daquela forma, mas foi necessário para aprender. Você entende, não entende?

— Entendo — sorriu ela, terminando de penteá-los e guardando a escova em seu bolso.

— Se continuar assim, um dia será mais bela do que eu! — a mulher abraçou-a e beijou a maçã de seu rosto — Feliz aniversário, filha.

Uma fumaça invadiu o lugar, e fui levada a outro cômodo da casa, parecia estar em um corredor. Petúnia estava parada em minha frente, de costas com uma enorme faca na mão esquerda e o gato a seu alcance.

A lua lá fora brilhava através de uma janela retangular, entreaberta e ventos suaves faziam seu vestido escuro se mover para os lados.

— Espelho, espelho meu... — sussurrava, caminhando para o fim do corredor, virando à esquerda. A segui. Ela entrou em um quarto mal iluminado, com um abajur aceso. Uma mulher dormia ali, de bruços.

— Espelho, espelho meu... — repetia parada em frente à cama. Petúnia ergueu o punho que segurava a faca e golpeou a mulher. Fechei os olhos em imediato. Eu não conseguia impedi-la. Não passava de uma intrusa em suas lembranças. —...existe uma face mais bela que a minha? — terminou ela, com o rosto ensanguentado, em cima do corpo da mulher.

Acordei sem fôlego.

Tirei rapidamente os fios que me interligavam, levantei da cama de Petúnia e sentei na minha, perplexa. Dante estava em pé, parado na entrada da ala feminina, observando-me.

— Isso o que você fez foi arriscado. Invadir o sonho de outra pessoa é quebrar uma das regras mais importantes do orfanato. Não quero imaginar se Petúnia descobrir.

— Prometa para mim, Dante — disse ofegante — Não conte a ninguém o que fiz aqui, por favor.

— Tudo bem. Não quero problemas para o meu lado também, mas... o que você viu lá? — perguntou.

— Vi o suficiente.

     — Vi o suficiente

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I - Onde Vivem Crianças IrrecuperáveisOnde as histórias ganham vida. Descobre agora