Quem sou eu? II

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Já em casa, não conseguia parar de pensar nas coisas que havia conversado com João e, que, descobrimos que ambos tínhamos a mesma tarefa!

Depois de formado ainda voltei ao Pedro II Internato porque uma das colegas de sala inventou de montar uma peça de teatro para inaugurar o teatro que havia ali e nunca havia tido uma peça de teatro.

Começar tudo isto do zero pode ser chamado hoje de loucura! Escolhemos a peça: O Diário de Anne Frank. Depois tínhamos que pensar em ensaios, depois de definidos quem faria qual personagem. Escolher um nome para o teatro pois ele ainda não havia ido batizado. Escolhemos Teatro Universitário Pedro II. Conseguimos uma gráfica para fazer o clichê para imprimir os envelopes dos convites para a estreia.

Junto com isto, leitura do texto, ensaios, visita a outros teatros onde assistíamos as peças, de graça depois de contar nossa história.

Ensaiamos algumas vezes até no espaço que existia da UNE (União dos Estudantes do Brasil) num prédio da Praia do Flamengo, no Rio de Janeiro.

Seguíamos nossas atividades paralelas de divulgação e de equiparmos o teatro pois nem aquelas luzes que iluminam o palco existia. Tudo na base da troca! Colocaríamos os nomes dos doadores no material de divulgação.

Fomos ao Estúdio da TV Tupi na Praia da Urca, entregar os convites no Programa Flávio Cavalcanti (assim imaginávamos que aumentaria a bilheteria...).

E seguimos ensaiando. Éramos todos amadores. Só o menino que fazia às vezes de Diretor tinha algum conhecimento. Mas aprendemos a fazer.

Chega o dia da estreia e estávamos todos uma pilha a ponto de esquecer de um item que era um grande e tenso momento na peça: as batatas! Tínhamos levado pão. E numa artimanha que não sei como saiu, inventei um novo texto para trocar as batatas pelo pão. E partilhamos o pão para que ninguém comesse mais do que o outro. Seguimos em frente até o final. Aplausos longos e lágrimas em nossos olhos.

Depois, sentados na beira do palco contamos alguns detalhes do Diário de Anne Frank, uma menina judia que viveu com sua família escondida durante a Segunda Guerra Mundial... Bom, para saber mais, comprem o livro.

Ficamos, ali, um tempo enorme. As pessoas tinham vontade de saber mais. Até como conseguimos fazer tudo aquilo acontecer sem que "gente grande ajudasse".

Como eu posso apagar isto que agora veio solto na minha cabeça, passando para o teclado onde estou escrevendo? Não acredito que vá conseguir.

Não lembro mais os nomes de todos. Minha cabeça já não ajuda nesta tarefa. Mas a emoção ainda mora no meu coração.

Como posso esquecer, ou apagar as coisas que aconteceram naquele mesmo internato quando eu estudava o que naquela época era ginasial (hoje segundo grau)? Muitas vezes ficávamos "de castigo" pela bagunça que fazíamos. Todos enfileirados no imenso corredor dos dormitórios sem poder sentar ou se encostar. O inspetor saía de nossos olhos e voltava sorrateiramente para pegar (e aumentar o tempo) dos que burlassem as ordens. E os dias de "ataque aéreo", quando todos nós, após o sinal de dormir ficávamos batendo nos armários de aço fazendo um barulho muito grande mesmo sabendo que iríamos para o corredor ficar de pé.

E, quando no inverno ninguém queria tomar banho frio às 5h30 da manhã? Um dos meninos não gostava mesmo de banho. Amarramos ele na cama e levamos para de baixo do chuveiro. Na hora do sinal para acordarmos, um de nós abriu a torneira e ele tomou banho ali, amarrado na cama... E tantas outras coisas que hoje parecem bobas mas que eram a nossa forma alegre de viver.

Como desencaixotar, como disse Fernando Pessoa? Na realidade isto está lá dentro, há muito tempo guardado à sete chaves e, que, por algum mecanismo vou aqui relembrando e uma coisa puxando a outro e mais outra.

Saiu mais um pedaço de mim...

Terapia - Muitas VidasWhere stories live. Discover now