O sentido da vida

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João me acordou hoje perguntando qual seria o sentido da vida. Antes de qualquer outra coisa perguntei a ele o porque dele querer saber isto, assim, "do nada".

Preciso entender isso porque estou tendo dificuldades de lidar com a minha.

Paro. Olho para um lado e para o outro. Converso com algumas pessoas e elas me falam coisas diferentes.

Resolvi pensar mais a respeito. Buscar onde pudesse ter alguma luz. Só sei que me sinto perdido. Sem foco. Sem um sentido próprio pelo qual eu possa lutar. Estou há dias assim. Tudo sem sentido. Oco. Sem norte. Sem uma trilha para me aventurar a seguir.

Falei com a Juliana e ela me devolveu com a ideia de eu fazer uma reflexão.

Olhando assim, para os outros, começo a perceber que não vou encontrar uma receita de bolo dessas que vem num caderno de nossas bisavós, passando pelas filhas até os dias de hoje. Todas repetindo a mesma receita e sempre saindo uma maravilha.

Eu começo a perceber que hoje em dia não existem esses "cadernos". Falam em releituras. Falam em versões atualizadas e cada um vai criando a sua receita. Me parece que isto acontece com cada um de nós.

Volto no tempo e olho para minha mãe: qual foi o sentido da vida dela? Se preparar para um dia casar, ser mãe, cuidar dos filhos e do marido. E fez isso zelosamente bem. Mas e minhas irmãs? Já tiveram outros caminhos, objetivos bem diferentes até pelo fato de estarem vivendo num mundo diferente. As dificuldades e as facilidades são muito diferentes entre elas.

Isto me faz ficar ainda mais tonto de tanto pensar. Meus neurônios não param de zanzar pelo cérebro. De vez enquanto percebo uma faísca como se houvesse um curto-circuito. Me assusto. Desvio o pensamento para outra coisa e lá vou eu.

Não sei se para todo mundo isso é crucial mas tem sido uma "necessidade" para mim. Tento pelo menos buscar alguma coisa que me anime a seguir em frente sem pensar muito nas necessidades ou consequências.

Nos últimos anos, quando isso tudo começou a mudar dentro de mim, busquei o artesanato como ocupação e terapia, observando minha mãe e irmã fazendo crochê. Não me senti atraído por isso. Achei que não teria os predicados necessário. Mas as linhas e cores me levaram a misturar com pedras, madeiras, arames e outras coisas. Pesquisa daqui e dali começaram a sair brincos, colares, cordões e por fim terços tibetanos. Me animei com algumas poucas vendas. Investi em pesquisa de formas e materiais para as embalagens e assim o tempo passou. E, de repente, não mais que de repente, tudo acabou. Não haviam mais clientes e tinha estoque de material.

Procurei, então, manter o foco nas linhas e cores e fui aprender tecelagem. Meio que amadoristicamente consegui fazer meu primeiro tear. Pequeno mas o necessário para aprender as técnicas mais rudimentares. Fiz algumas peças com ele. Fiz um novo já com algumas melhorias e comecei uma peça maior. Parei não havia feito nem 25% do pensado.

Voltei para as madeiras ao descobrir pessoas que faziam entalhes em tronco de árvores com machadinhas. Depois com formões de diversos tipos, facas e outros instrumentos. Fiz algumas colheres, pequenas, dessas usadas em saleiros. Pensei na substituição das de plástico. Desenhos de formato "minimalista", como chamam. E fui aperfeiçoando. E vendendo. Até que os aborrecimentos passaram a ser maiores do que as alegrias em função de serem feitas num dos cantos de uma sala de apartamento. Havia sempre farpas e poeira que eu não as vias e isso incomodava pessoas. Parei. Ferramentas e madeiras ficaram em caixas a espera de um sonhado lugar para poder voltar a fazer.

Neste ponto cheguei no fundo do poço. A ansiedade de descobrir um sentido para o que me restava de vida me levou a uma profunda depressão. A tristeza me derrotava. Nada do que pensava continuava a fazer sentido. E ai, fui procurar ajuda.

O psiquiatra me ouviu durante mais de uma hora. Bendito achado! Ao fim me medicou e me deu um encaminhamento para um psicólogo.

Já lá se vão sete meses nesta montanha russa. Alternando momentos de tranquilidade e de medo com a descida, rodopiando ou de cabeça para baixo com medo de chegar ao fundo do poço novamente. Não desejo isso para ninguém. Foram dias muito ruins. Apenas aprendi, ou permiti que ficassem mais fortes na minha cabeça o maior aprendizado: preciso pensar mais em mim. Cuidar mais de mim. Me divertir. Claro, ajudar os outros mas não por iniciativa minha, um hábito que cultivei por todos estes anos que já vivi.

Preciso encontrar este "novo" sentido para minha vida. Me sinto, como já disse para a Juliana, perdido de noite numa floresta em noite nublada. Medo do desconhecido, de não conseguir sair dali. Isso me incomoda e me assusta. Me deixa inseguro. Sento, me encostando numa árvore e rezo, pedindo ajuda aos céus. Relâmpagos clareiam mas não consigo ver as estrelas que pudessem me indicar uma saída.

O filme da minha vida começa a passar com mais frequência na minha cabeça. Coisas boas e outras nem tanto. Servem apenas como tentativa de descobrir uma nova possibilidade, uma saída, uma escolha por mais errado que possa dar mas que me permitiriam tentar.

O que eu posso esperar? O que eu devo desejar? Muitas das alternativas eu mesmo as descartei por chegar a conclusão que eram inviáveis por diversas causas: idade, corpo físico, dinheiro e até, medo de uma aventura sozinho. Tudo junto e misturado.

Hoje, fico prostrado, olhando para o teto sem nada que me faça levantar e ir para a rua porque até caminhar no meio da multidão me incomoda. Começo a ver a individualidade das pessoas não se incomodando com o próximo. A agressividade de muitos e isso vai mexendo comigo profundamente. Sempre que necessário vou e volto logo para casa onde, de uma certa forma, me sinto mais seguro apesar das incertezas de estar aqui. Já pensei em sair, pegar a mochila e um ônibus e ir, sem rumo até que desista e volte ou não. E vou ficando aqui, sentado nessa poltrona passando os dias.

Tento ligar a TV e só tem desgraça. Mentiras, intolerâncias que acabam me deixando apavorado com o que possa vier pela frente. Me dou conta de estar rezando e pedindo, sempre, ajuda dos céus apesar de saber que temos a nossa parte a fazer.

E continuo sem saber qual sentido dar à minha vida para seguir em frente. Como diz aquela música "que Deus me proteja de mim e da maldade das pessoas boas..."



Terapia - Muitas VidasWhere stories live. Discover now