Capítulo 15

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Buzinas vinham de todos os lados, ao encontro do ouvido de Dr. Alan. Estava parado nas ruas do centro. Um trânsito infernal dominava aquele lugar. O psicólogo parecia o único homem paciente, ali presente, pois todos os outros carros apertavam desesperadamente suas buzinas como se algo fosse mudar.

- Seu idiota! Vai ficar parado aí mesmo? - um homem ao lado do carro de Dr. Alan gritou à um caminhoneiro. - Depois me passa o endereço do lugar que comprou sua carteira de motorista.

O psicólogo apenas balançou a cabeça.

Estressados por nada...

Demorava cerca de minutos para conseguir andar poucos metros. O médico, em seu carro, elaborava um plano para sair daquele engarrafamento. Pensava em vias que poderiam facilitar o acesso a casa de sua próxima cliente. Lembrou-se, então, de uma ruela a qual fazia um desvio para uma ponte. Conseguia ver o trajeto completo em sua mente.

Finalmente conseguiu uma brecha para entrar na ruela. Entrava delicadamente com seu carro, e conforme passava, liberando espaços pela parte de trás, outros carros já ocupavam esses.

Ia se afastando aos poucos da confusão sonora. Quando o som das buzinas diminuíra percebeu que o rádio de seu carro não estava funcionando. Chiados eram a única coisa audível vindo desse. Soltando uma das mãos do volante começou a mudar a estação, porém nada se alterava. Os chiados permaneciam como se fosse um problema geral. Antes que pudesse desligá-lo, pôde ouvir bem ao fundo uma voz.

- Olá Dr. Alan! A gente ainda não se conhece, mas uma amiga me contou sobre o senhor. - uma risada histérica soou mais alto que o chiado.

O psicólogo arregalou os olhos. Diminuiu a velocidade do carro.

- Queria conversar um pouco com você. Posso te contar meus sonhos? Eu tenho dois enormes sonhos... - a voz continuava.

Dr. Alan sentia suas mãos gelarem e sua respiração passou a se delimitar lentamente. Longos suspiros devido ao nervosismo. Com a mão um pouco hesitante desligou o rádio, cessando os chiados junto a voz da garota. Mordeu o lábio inferior.

- Tsc... Tsc... Tsc... - um barulho no banco de trás parecia reprovar a atitude do médico. - Aquele barulho era relaxante. Não podemos conversar sobre meu sonho ouvindo aquilo?

O psicólogo prendeu o ar em seu pulmão. A voz da garota vinha do banco de trás, não do rádio. Ficou parado, completamente estatelado. O carro parou na ruela deserta.

- Oh... Perdão! Ainda não me apresentei. Pode me chamar de Mel... - riu novamente histericamente.

Com o rabo do olho, Dr. Alan pôde ver a mão pequena da garota à seu lado. Lentamente, por instinto talvez, voltou a visão para o retrovisor. Uma garota estava sentada no banco de trás de seu carro. Lambia rapidamente um pirulito colorido, e tinha os olhares voltados também para o espelho. Regressou o olhar para a rua imediatamente.

- Saia do meu carro... Agora! - falou sem muita coragem. Gaguejava.

Não teve uma resposta imediata.

- Que pena. Queria tanto brincar com você...

Logo em seguida um vento percorreu seu corpo. Todos seu pelos se arrepiaram. Em um súbito movimento virou seu tronco para trás. Não havia nada ali, exceto um pirulito caído sobre o banco. Sua atenção voltou-se, então, para o rádio. Estava ligado e uma música infantil de ninar ressoava bem baixo. Com um movimento de mão desligou-o imediatamente.

Ruídos surgiram do lado de fora do carro. Algo parecia estar sendo arranhado. Pela janela viu a garota andando paralelo a seu carro. Cabeça virada ao chão. Com o cabelo amarrado dos lados, o psicólogo pôde ver seu rosto sorrindo. A mão não era visível. Não era necessário vê-la para saber o que ela fazia. Com algum instrumento afiado arranhava a lataria do carro.

Vamos Brincar, Kat?Wo Geschichten leben. Entdecke jetzt