Capítulo 49

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Kat gritava. Poucos minutos antes, sua mãe tinha pedido para que essa esperasse em frente a casa com Dona Célia, no entanto, as coisas não estavam normais nos últimos dias. Enquanto Dona Célia esperava com sua neta para entrar na casa, a respiração pesada das duas foi interrompida por um ranger agudo e irritante. Relutante, Kat virou o rosto e viu a maçaneta girando em vão. Uma volta para a esquerda, e uma volta brusca para a direita, mais uma para a esquerda e novamente em um baque para a direita.

- Vovó... - a pequena gaguejara suavemente, mas Dona Célia conseguira detectar o medo em sua voz.

Seguindo o menear de cabeça de Kat, a avó da criança virou para a porta e viu o girar e ranger. Foi apenas nesse momento que se deu conta do que fazia o barulho. Em seguida, sons abafados imitavam passos no interior da casa, correndo de um lado ao outro. Dona Célia ouviu risadas e gritos se escondendo no interior daquelas paredes que ela tanto conhecia. A pressão em seu peito foi absurda, quase a fazendo desmaiar novamente. Cerrou os olhos na esperança daqueles ruídos sumirem, mas nada. Pareciam apenas ficar mais nítidos.

Sarah!?

O timbre da voz que gritava no interior era idêntico ao de sua filha. Dona Célia não sabia se era loucura, realidade ou Teddy brincando com sua mente. Abriu os olhos ao se lembrar de que a chave de casa estava em seu bolso.

Célia! Sarah falou para esperar por ela. Não é ela quem está na casa. É coisa da sua mente!

A avó de Kat se rebatia em pensamentos. Sinapses que tentavam organizar os pensamentos, mas iam de encontro aos desejos de Dona Célia.

Seu instinto de mãe sabe que é ela. Você não iria confundir a voz de sua filha, não é, Célia? Abre a porta logo para ajudar ela. É agora ou você e Kat serão as próximas a brincar com ele.

Quando Dona Célia se deu conta, sua mão já estava segurando a chave na porta prestes a destrancá-la.

- O que você está fazendo, vovó? A mamãe pediu pra esperar ela. - Kat disse preocupada. Seu pés estavam encolhidos na cadeira de rodas, com medo do que poderia acontecer. Ainda não conseguia digerir a ideia de seu urso ser o verdadeiro mal naquele lugar.

- Sarah precisa de ajuda, querida. - Dona Célia girou o pulso e o clique da porta bastou para que essa abrisse sorrateiramente.

A luz na sala se dava em diferentes tons de penumbra. As silhuetas dos objetos e suas respectivas sombras se misturavam macabramente como as luzes de um carrossel que gira rapidamente e é impossível descobrir qual cavalo é qual. No entanto, de uma maneira aterrorizante. Parecia que tudo colaborava para o que viria a acontecer.

A porta parou semiaberta e Kat ameaçou se levantar quando a avó começou a levá-la para dentro.

- Não, vovó, a mamãe pediu pra esperar. O Teddy deve ta aí dentro, eu não quero ver ele de novo. - a roda de sua cadeira empurrava o chão e avançava no interior. - Vovó, você viu a maçaneta girando. Ele ta aí, ele ta aí. - seus olhos se enchiam de lágrimas, mas não escorria nada. Tentou colocar o pé esquerdo enfaixado no chão, mas a dor se mostrou insuportável.

- Sarah precisa de ajuda e eu não vou te deixar aqui fora sozinha, Kat. - Dona Célia mordeu o lábio, hesitante em entrar na casa que não saíra durante muito tempo. Sentia-se confortável naquele lugar, mas não naquele instante.

A porta abriu com o empurrar da cadeira, permitindo uma maior quantidade de luz penetrar no lugar. A escada que dava para o corredor, logo em frente a porta de entrada, era a coisa mais bem iluminada naquele recinto. Com o canto de olho, tentou ver o que acontecia no andar de cima, mas nada além de pequenos raios que chegavam rasos no corredor.

- Vovó, o que você está fazendo? - Kat perguntou com as mãos tampando o rosto. Preocupada, com medo, sem entender o que estava acontecendo.

A resposta, contudo, não veio da voz que esperava.

- Ela está tentando te proteger, Kat. Olha que doce de vó, não? - ela conhecia a voz. Era Mel, ou melhor Sarah. Mas não podia ser.

- Teddy? - sussurrou inevitavelmente e logo se culpou apertando as pequenas unhas contra seu lábio.

- Ficou com saudades? - a voz agora tomara sua verdadeira identidade. Era Teddy imitando a voz de sua amiga. Tentou compreender de onde essa vinha, porém era impossível. Parecia ecoar de todos os lados possíveis para todos os cantos da casa. Ele queria ser ouvido. - Sua avó queria proteger a família, mas, na verdade, apenas fez nossa brincadeira começar antes da hora. - uma gargalhada fétida pareceu gritar bem ao seu ouvido.

Kat desatou a chorar. A avó prensou seus dedos no suporte da cadeira e tentou afastar a neta da casa, retornando para o lado de fora. Seus pés insistiam em desobedecer. Quando finalmente conseguiu, girou a cadeira rapidamente. Sua coluna estalou com o movimento brusco, o que fez Dona Célia segurar um grito, que no instante seguinte se libertou.

O olhar das duas se debateu com o local onde era para estar a parede e concomitantemente gritos desesperados emergiram de suas gargantas, queimando as paredes dessa durante o trajeto. Um líquido vermelho escuro, cor de sangue, escorria sobre a antes parede. Sua consistência gosmenta parecia brilhar com a pouca luz e emitia um odor de podridão.

- Já querem sair? Assim eu fico triste, não começamos nem mesmo a brincar. - Teddy era sínico e macabro. Parecera sussurrar algo indecifrável e riu maliciosamente. - Poderia esperar Sarah, mas acho que vamos fazer uma surpresa pra ela. Você se lembra do que ela gostava de brincar, Célia?

Dona Célia não precisava ver a fase do urso para imaginar a linha que delimitava sua boca com um sorriso humanamente horrendo. Suas mãos suavam segurando a cadeira de rodas, e seus olhos estavam vidrados na sua neta encolhida. Kat mantinha as mãos no rosto, escondendo o choro e evitando olhar para o jogo de sombras.

- Não se lembra da brincadeira preferida de sua filha? Que decepção! - sem obter respostas acrescentou.

Dona Célia permaneceu em silêncio, limitando-se a descer as mãos até o corpo de sua neta, para abraçá-la e reconfortá-la. Kat tremia gélida e se remexeu assustada ao toque de sua avó.

- Sou eu, querida. - a senhora sussurrou.

- Por enquanto... - as gargalhadas ecoaram sinistramente tranquilas pela pele das duas. - Agora vamos brincar de pique esconde.

No segundo seguinte, Dona Célia sentiu algo a puxar bruscamente para trás.

Vamos Brincar, Kat?Unde poveștirile trăiesc. Descoperă acum