Flor da meia-noite

37. Não minta para um mentiroso

Oito milissegundos depois...

— Não vai me convidar pra entrar?

— Ai meu deus — Saí do meu espanto e me levantei, descendo as escadas logo em seguida, correndo na verdade, quase tropeçando. Enrolo meus braços ao redor da sua cintura e me permito sentir seu cheiro — Claro, é claro, entra.

— Valeu.

Jordan deixou o capacete em cima do balcão, e parecia bem à vontade. Percebi que ela já esteve tanto aqui que claro que se sentiria a vontade, não era do feitio de Jordan ficar tímida. Ela e David eram tão diferentes.

Ela se sentou no sofá e eu a segui completamente desconfortável. O que diabos estava acontecendo? Jordan em Ellicot? Jordan na minha casa? Jordan no meu sofá? Jordan bem ali na minha frente?

— Por onde você andou? Eu te procurei em Riverland, em todos os cantos, mas não tive nem sinal seu.

— Eu não cheguei a ir.

— O quê? Ah... — Fico sem palavras. A sensação é de ter perdido as memórias dos momentos mais importantes e relevantes da minha vida. E de novo, o que diabos estava acontecendo? O que diabos aconteceu?

— Você está diferente, Flor.

— Bom, foi um ano — Sorrio e mexo no cabelo — Acho que todo mundo está diferente.

— É eu sei.

— Por que não foi à Riverland?

— Eu ouvi a sua mensagem.

Abro a boca. Fecho a boca. O processo se repete algumas vezes até eu decidir que não tenho mesmo o que dizer. Por que Jordan gostava de fazer isso comigo? O que tinha de tão interessante em mim quando eu ficava sem palavras? Era bem mais fácil ela simplesmente colocar as cartas na mesa de uma vez.

— Eu voltei — Ela decide continuar, sabendo que não estou em condições de formar uma palavra sequer. Respiro fundo e apoio o queixo nas mãos. Onde você esteve? Não preciso perguntar por quê, ela já entende pela minha expressão — Soube do que estava acontecendo na festa e então corri até lá, mas já era tarde demais, estava tudo vazio e quebrado. Sentei em um tronco me perguntando se tinham pegado você, e eu juro que não me perdoaria se isso tivesse acontecido. Até que te vi entrando no carro com o David. Então eu resolvi sair por aí, conhecer outros lugares, te dar um tempo. Eu ia voltar antes de você ir para Riverland, mas você foi de supetão sem avisar ninguém.

— Ah Jordan — Chego mais para frente e pego sua mão — Você é tão teimosa e orgulhosa, garota, que me perde.

— Me desculpa.

— Devia ter me gritado, feito qualquer coisa, eu teria voltado com você, teria ido a qualquer lugar com você. Teria deixado qualquer um para trás por você. Passei todos esses meses achando que você tinha me abandonado.

— Eu realmente sinto muito, mas você merecia ser feliz.

— Eu nunca precisei de muito pra ser feliz, você bastava — Acuso.

— Não tenho tanta certeza. Sinto muito.

Permiti-me tocar seu rosto, sentir os contornos de sua mandíbula, observando os traços que eu lutei tanto para não esquecer. As sobrancelhas grossas e definidas, os olhos negros como a noite, a pele pálida, o cabelo macio e seu corpo quente.

— Mas não sinta, você está aqui agora, está viva, comigo.

Ela sorri, e aquele sorriso é como a visão do meu próprio paraíso.

— Não acredito que alguém conseguiu fazer essa menina sorrir — Miriel diz descendo as escadas e eu percebo o que estava acontecendo. Afasto-me sentindo culpada e o loiro segue para a cozinha.