Capítulo 2

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Alan, Judith e Elias estavam sentados em uma das mesas do refeitório, esperando a chegada de Gael.

Desde que Alan entrara na universidade ele observava Gael discretamente. Ele sempre via o garoto na biblioteca fuçando entre as estantes e por vezes na informática. Ele conseguiu decifrar que ele era tímido e reservado, embora brilhasse feito um farol com sua aparência única.

Alan já tinha pensado em conversar com Gael. O ômega tinha um jeito todo carismático que deixava as pessoas confortáveis, mesmo com sua habitual arrogância e malícia. Essa era uma vantagem de ser sociável e bonito: ter qualquer um que desejasse. Era fácil manipular pessoas quando elas gostavam de ser manipuladas. mas Gael não era desse tipo. Depois que tinha visto que o albino mal conseguia ficar perto dele sem querer se afastar, o fez se sentir incomodado. Alan não estava acostumado com pessoas que o repeliam.

– Você está estressado, está comendo muito rápido – Elias informou, roubando uma pedaço do sanduíche de Alan.

– É a Judith. Ela sempre me deixa irritado – Mentiu.

– E vocês já pensaram sobre o que vamos falar com Gael? – O alfa emendou. – A mentira tem perna curta, era o que minha avó sempre falava.

Elias era um garoto calmo e sereno. Era bom tê-lo no grupo: enquanto Alan e Judith era explosivos, ele sempre estava lá para colocar panos quentes. Ele possuía o estereótipo perfeito de um alfa: alto, firme e empoderado. Tinha cabelos castanhos curtos e olhos verdes; músculos, mas não tanto quanto Alan que passava horas na academia. Olhando de longe, os dois pareciam alfas perfeitos.

– Ele parece ser fácil de enganar, não esquenta – Alan disse, despreocupado.

– Eu sou o quê? – Uma voz perguntou curiosa, fazendo Alan quase cair da cadeira.

– Gael! – Judith exclamou, fuzilando o ômega com o olhos. – Sente-se aqui do meu lado. Ficar perto de rapazes que fedem feromônios agressivos dá enjoou em pessoas como nós, não é?

– Enjoou? – Franziu o cenho. – O que quer enunciar com isso?

– Ômegas, somos ômegas – Judith sorriu forçosamente, desapontada por sua piada não ter sido entendida.

– Alan é um ômega. Eu deveria ficar intimidado? – Olhou para Alan discretamente através de suas lentes de contato. Era difícil ter olhos tão claros sem ser quase cego.

Os três amigos se entreolharam.

– Você sabe o nome dele? – Elias ergueu suas sobrancelhas.

– Você sabe que eu sou um ômega? – Alan cortou, chocado.

Continuava sufocante ser ômega. Às pessoas sempre o veriam como sentimental e frágil, e isso era o que Alan não gostava de ser chamado. Ele odiava ser um alvo nas ruas, ter as responsabilidades toscas de um ômega de ficar sonhando acordado com um alfa que controlaria sua vida. Alan jamais gostaria de alguém acabando com sua liberdade, por isso tinha trabalhado em não parecer um ômega.

– Você exala um aroma doce, consigo constatar isso só de ficar adjunto a sua presença.

Alan demorou um pouco para recuperar o fôlego. Ninguém nunca tinha apostado que ele era um ômega, e agora Gael estava afirmando que ele era um. Esse lance de sentir os feromônios era muito anexado a ideia de um alfa que conhecia perfeitamente seu ômega, não um estranho que não sabia nada sobre ele.

– E você sabe nossos nomes? – Repetiu Elias, surpreso.

– Você é Elias – Disse Gael, vasculhando sua bolsa que havia trocado depois de Alan ter encostado o que não era seu.

Gael tinha ficado vários minutos lavando sua mochila, especialmente no lugar onde Alan tocou. Ele odiava contato, qualquer um.

– Caralho, você é uma espécie de médium? – Elias se empolgou.

– Não – Gael fez um expressão estranha. – Eu sempre vislumbro-os na biblioteca. Vocês falam alto, consigo ouvi-los precisamente.

Judith começou a ficar nervosa. Será que Gael tinha ouvido a parte que ela disse que tinha pena dele?

– A biblioteca era para ser um ambiente comedido e silencioso – Insinuou, deixando Alan irritado.

– Finge que ninguém conversa por lá – Debochou, cruzando os braços fortes na frente do corpo.

– Você quer falar sobre pequenas proibições? Bem, eu já te vi tragando maconha no campus, Alan. Isso me soa atrozmente ilícito – Comentou calmo, alheio ao choque que Alan estava recebendo. – E certamente você não estava usando Cannabis sativa com finalidades medicinais.

Judith e Elias trancaram um riso, enquanto Alan tentava se recuperar da alfinetada.

– Tá, e o que você tem a ver com isso?

– Potencialmente nada. Sua vida não me interessa.

Elias não conseguiu parar de rir, até que Alan desse um soco em suas costas e os dois começassem a rosnar um para o outro.

– Ei! Que putaria é essa? – Gritou Judith, fazendo os dois se calarem.

Gael olhou para Alan com nojo; detestando pessoas que só usavam o lado irracional, e Alan parecia ser exatamente esse tipo.

O albino tinha percebido o quanto o ômega o encarava nos corredores. Era estranho um garoto como Alan, com seus cabelos vermelhos compridos – que chegavam um pouco acima do peito –, suas várias tatuagens e seus olhos azuis acinzentados que refletiam a alma selvagem, olhar para alguém como ele.

Alan era o oposto de Gael: cheio de músculos saltados, sociável e um tufão em pessoa. Nunca que o albino pensaria que seu jeito chamaria a atenção dele.

– Se controlem! – Brigou Judith. – Eu sinto muito. Alan é um ômega diferente, senão ele entenderia como nós nos sentimos com esse comportamento.

– Nós?

– Você é um ômega – Alan cortou, rude.

– Isso não soa como uma indagação – Percebeu Gael, olhando para os piercing que Alan tinha na boca, se perguntando se aquilo não atrapalhava para beijar. Depois de tantas bocas que ele tinha visto Alan roçar pelos cantos da universidade, Gael não se surpreenderia se o ômega tivesse herpes.

– Porque não é – Alan ascendeu seu isqueiro, brincando com o fogo e parecendo arrogante até nisso. – Você tem bem o tipo de ômega: indefeso, baixo e delicado. Dá para ser mais visível do que isso?

Gael não respondeu nada durante um tempo, digerindo a hipocrisia de Alan demoradamente. Era engraçado um cara como ele — que definitivamente não parecia um ômega — falar sobre esteriótipos.

– Só porquê eu pareço não significa que eu sou

– Improvável – Deu de ombros, desafiador.

– Bem, então fique estupefato, porque eu sou um alfa.

Alan estava boquiaberto enquanto Judith e Elias olhavam Gael em choque, parecendo céticos também.

– Que piada – Mas podia ser verdade, Gael não exalava cheiro agridoce. – E eu uso vestidos cor-de-rosa durante às aulas.

– Pense o que desejar – Disse Gael, se levantando da mesa. – Sobre o que a senhorita tencionava dizer: apenas me encontre nos laboratórios de química que poderemos dialogar sobre qualquer inconveniência que implica a loja.

Esfregou as mãos enluvadas, antes de olhar diretamente para Alan, uma áurea estranha tomando conta do ambiente, o que fez o ômega se encolher um pouco.

Alan não tinha certeza se eram ferômonios ou se apenas tinha se sentido hipnotizado com o olhar de Gael. Aqueles olhos tão claros e tão tranquilos agora pareciam firmes e ameaçadores.

– Entretanto, não me intime para encontros displicentes com pessoas descorteses só por conta de sentimentos empáticos como a pena. Eu estou na minha clausura tácita por um motivo, e não preciso que ninguém se intrometa – Arrumou sua postura impecável, colocando sua mochila nas costas. – Até mais, senhorita.

E com isso saiu, tão silenciosamente quanto tinha aparecido.

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