Capítulo 20

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– Eu tenho a impressão que você não sai muito de casa – Alan comentou, vendo Gael encolhido contra o banco traseiro do carro de Judith.

Depois da consulta, Gael disse que iria embora. Como ele estava exausto e sonolento, Judith e Alan propuseram o levar para casa, já que ele estava sem seu carro. Gael odiava receber caronas.

– Eu não me sinto muito estável... – Confessou.

– Bem... A gente não te contou isso, mas nós vamos buscar Ícaro depois te levaremos para casa, ok? – Sua voz hesitou e Gael o olhou frustrado.

– Eu não estimo ficar na presença de crianças – Se lembrou do quanto crianças não se importavam de se sujar. Sentiu calafrios, pensando na quantidade de germes que elas carregavam no corpo. E suas piores recordações rementiam a crianças.

– Ícaro é um garotinho muito gentil e nós só vamos buscá-lo. Logo depois iremos te levar para casa – Prometeu Alan, vendo Gael olhar perturbado para a cadeirinha de segurança ao lado.

– Alan, você pode trazê-lo até aqui? Eu vou estacionar no final da rua – Judith alertou enquanto o ômega já tirava o cinto.

– Você quer junto comigo? – Perguntou, abrindo a porta de Gael que assentiu rapidamente.

Ele preferia ficar com Alan do que com Judith. Não era por mal, mas sim porquê Gael selecionava muito bem as pessoas que entravam em sua vida. Ele estava abrindo frestas na sua muralha de tijolos que havia construído em torno de si. Mas elas eram mínimas, e até então ele só havia feito isso para Alan.

Um passo de cada vez.

Um tijolo de cada vez.

– Você não precisa ir junto comigo até a casa dele. Você pode me esperar – Gael negou, dando corridinhas até que estivesse ao lado do ômega que se surpreendeu por ele estar próximo.

Alan não gostava da parte de Gael que era sensível a toques. Mas ele entendia que às vezes precisava se afastar um pouco para entender obras de arte. E era isso que Alan estava aprendendo: a fazer arte sem tocar em telas ou pincéis; fazer música sem cordas, apenas com palavras gentis. Porque quando ele menos percebesse, estaria sentindo a alma melodiosa de Gael.

Mas até então ele precisaria de paciência.

– Por que está me observando com tanta precisão? – Ter Alan olhando para ele era mais desafiador do que ter outras pessoas focando em seus olhos.

– Você é tão estranho...

Percebeu Gael o olhar surpreso, antes de tudo transformar-se em indiferença novamente.

Isso significava que ele estava bravo e, porra, não era estranho no sentido ruim. Tentou se explicar, mas Gael o interrompeu com sua voz neutra:

– Poemas, telas, livros e pesquisas se tornarão algo eterno e famigerado se forem diferente de todo o resto. Ser igual aos outros é ser irreverente a si mesmo, é perder fragmentos seus na esperan...

Alan interrompeu, dizendo que não era nada daquilo, mas quando viu os cílios de Gael tremerem, ele entendeu o quanto ele estava cansado. Foi ai que notou que isso era o que Gael escutava ao longo de sua vida.

Puta que pariu....

Alan estava tentando ser melhor, mas então ele mesmo dava um jeito de ser o pior.

– Gael, eu sinto muito... Eu estava me referin...

– Dói! – Ouviu a voz de Ícaro dentro de casa, seguidos de leves murmurinhos de choro, antes de ouvir passos rápidos como se alguém estivesse correndo.

StrangerWhere stories live. Discover now