Capítulo Um: A Cidade das Arenas

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EU ME LEMBRO da sensação da liberdade, do seu gosto pungente na minha boca. Um sabor outrora tão facilmente ignorável.

Eu me lembro de outra época, ainda tão fresca na minha tenra memória.

Eu me lembro das luzes e da miríade de cores de Astradh. Centelhas e archotes, reluzindo no céu noturno de um oásis. Ruas luminosas de pedra branca e obeliscos tão grandiosos cujos picos tocavam o sol ao meio-dia. Templos monumentais com cúpulas de vidro colorido e vitrais retratando nossas deusas. À noite contaríamos estrelas, de dia, cristais e diamantes forrariam nossos leitos e vestes. Nossas nascentes eram claras, nossa fartura, bênçãos inenarráveis. Fartávamo-nos de tudo o que a terra tinha para nos oferecer de melhor e a água que jorrava de nossas fontes era a mais fresca e límpida.

Astradh era a joia mais preciosa de nosso povo e o símbolo de nossa opulência e favorecimento, a grandiosa capital do reino de Torandhur. Vivíamos um período de paz prolongado, nossas terras estavam além das marcas de uma guerra sangrenta e ambiciosa que já durava décadas.

Eu nasci em meio a esse luxo e vivi os meus primeiros anos rodeada de sedas, perfumes e joias. Eu sou uma Etérea. Neste mundo, aprendi que isso pode significar tanto uma benção quanto uma maldição.

Etéreos são ditos serem os mensageiros dos deuses, ninguém está mais próximo a eles do que nós. Já fomos uma casta mais predominante e influente, mas isso foi no passado. Governávamos junto aos reis porque somos sábios, incorruptíveis e repudiamos a violência em qualquer uma de suas formas. Mas, como eu disse, estes são outros tempos.

Vim ao mundo numa noite escura, sem luar ou mesmo estrelas e, por isso, fui chamada Nysa, porque a escuridão prevaleceu no dia em que nasci. Mas esta não foi a única razão pela qual fui considerada uma anomalia mesmo entre os meus: possuo um olho de cada cor, o que por si só já diz muito a meu respeito. A íris direita é da cor da grama mais verde ou da floresta mais profunda, o tom exato dos olhos de todos os meus semelhantes; a íris da esquerda, entretanto, é aquela que destoa dos demais da minha espécie, tão azul quanto o oceano sob o sol. Rejeitada por alguns que temiam a minha predestinação ou que eu me tornasse um arauto de mau agouro, fui acolhida por outros — e fui amada.

Dentro das espessas muralhas do palácio real, vivi uma vida livre de preocupações, embora restrita. Orávamos às deusas em busca de proteção e sabedoria, louvávamos o sol e a lua, e as estrelas com cânticos no idioma antigo, o idioma mágico — o idioma falado pelos deuses. Éramos adeptos de severos hábitos de leitura e de meditação, aprendíamos as histórias das estrelas e chamávamos a lua por seu nome verdadeiro. Tecíamos tecidos tão luxuosos que os deuses cobririam suas nudezes com eles, e lapidávamos diamantes e outras pedras valiosas para que ornamentassem os pescoços das divindades mais envaidecidas.

Apesar disso, contentávamos-nos com pouco. Não nos apegávamos às riquezas vãs desse mundo e palavras como ambição e ganância eram desconhecidas em nossos vocabulários. Éramos, não obstante, uma casta coberta de esplendor e de honrarias.

Nysa - A Campeã de AstherOnde as histórias ganham vida. Descobre agora