Capítulo Quarenta: A Escuridão da Noite

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AS HORAS SE ARRASTARAM torturantemente, testando-me e rindo da minha ansiedade crescente. Cadius, que àquela altura mostrava-se tão apreensivo quanto eu, aconselhava-me de tempos em tempos, ajudando-me a traçar uma estratégia que nos garantiria a vitória.

Era chegado o momento de enfrentar Rhyz na semifinal e me tornar a segunda finalista do torneio. Há algumas horas, o sol havia nascido no horizonte claro, anunciando como um arauto a proximidade do meu próximo confronto nas Arenas de Théocras.

Já num dos pavilhões internos da Arena e munida de todo o meu equipamento, fui ordenada a aguardar pelo combate. Também fui separada de meu senhor e patrono, todas as dicas que ele poderia haver me dado foram dadas. A partir dali era comigo, eu sabia. Que as deusas me ajudassem.

Finalmente, depois de esperar por muito tempo, eu fui convocada a acompanhar uma das sentinelas que me vigiava; conduzida então pelos já familiares corredores escuros de teto baixo. Ao final dele a luz diurna brilhava ofuscantemente através das grades de um portão também guardado por duas sentinelas. À medida que me aproximava, ouvi o uivo da multidão crescer nos meus ouvidos, acelerando a minha pulsação e fazendo com que um suor pungente brotasse na minha nuca.

Parei diante do portão fechado e a mesma sentinela que me levara até ali o abriu com um rangido estridente. Inspirei fundo e segurei meu escudo com mais força do que o usual. A tensão reverberava pelos meus ossos, a sede por vitória e por glória da plateia eufórica nas arquibancadas era como uma canção no meu sangue. Senti o cheiro da violência e da brutalidade impregnado naquelas areias amaldiçoadas e ferventes. As Arenas me chamavam, tal como a multidão.

— Que se cumpra a vontade das deusas — eu murmurei para ninguém em particular, sob a minha respiração errática, mas Cadius me surpreendeu ao acabar concordando.

Que assim seja, ecoou com reverência.

Dei um passo adiante, estranhando a rigidez nos músculos das minhas pernas, depois outro, e mais outro. Fui recebida sob muitos aplausos e ululações, um coro de vozes que se erguia a cada passo arena adentro.

Com o sol inclemente no meu rosto, abaixei os olhos para a silhueta solitária que vinha ao meu encontro, caminhando com a mesma displicência elegante com a qual eu me revestira para mascarar a minha ansiedade. Trazia na mão a sua lança de duas lâminas em forma de meia lua, elas captavam a luz do sol do meio-dia como espelhos.

Rhyz não me desapontara: vinha todo vestido em couro fervido negro. As tatuagens negras que cobriam toda a sua cabeça calva se destacavam contra o seu tom de pele bronzeado e ele trazia dois anéis coloridos pendurados na barba negra e comprida. Os olhos cor de azeviche me encaravam com fome. Ótimo. Ele também foi recebido com muito entusiasmo pela multidão e deixou bastante claro em sua expressão que sabia que era quase tão querido quanto eu pela plateia.

Levei a minha mão até as costas e desembainhei o meu Tributo da Deusa, segurando firme no punho para tentar descarregar um pouco da minha tensão. Eu me sentia muito mais segura e confiante com ela ao redor dos meus dedos e pronta para o uso.

Apertei o passo, mas não tanto, não queria passar a impressão errada para Rhyz ou para a plateia, e então nós dois havíamos nos reunido no centro da Arena. A aclamação da multidão cessou da mesma forma abrupta. Eu o encarei, e ele me encarou de volta. Seus lábios se curvaram para cima num sorriso provocador, os meus se curvaram para baixo com puro desprezo. Se olhares matassem, tanto eu quanto ele já estaríamos liquidados a essa altura — e o combate nem mesmo havia começado.

Acalme-se, criança, Cadius me advertiu, mantenha o foco; assenti, engolindo em seco.

Telak surgiu no pódio e sua voz soou clara e retumbante por toda a Arena.

Nysa - A Campeã de AstherOnde as histórias ganham vida. Descobre agora