Capítulo Vinte e Oito: A Lâmina do Deus da Morte

681 68 101
                                    



UMA EXPLOSÃO DE luz e calor atingiu Thades em cheio no seu rosto, na altura dos olhos. Uma explosão cuidadosamente calculada e contida a fim de não ferir sua refém, e causada por mim, pela minha magia.

Ele bramiu tanto pela dor quanto pelo susto, e caiu de costas no colchão, liberando a garota que mantinha como escudo. E foi para ela que eu corri, amparando-a quando ela se atirou, em lágrimas, direto para mim. Cerquei-a com meus braços e a afastei da cama, colocando-me de joelhos diante dela, em guarda, enquanto Thades ainda se contorcia na cama, uivando e amaldiçoando-me.

Olhei para Zyora que havia acabado de encantar sua longa cimitarra com a mesma magia alva e fascinante da qual me lembrava na arena, empalidecendo e cobrindo a lâmina esguia com uma fina crosta regelada. Mesmo sem retribuir meu olhar, falou-me:

— Bom trabalho até aqui, Mensageira. Agora, ele é meu.

Assenti e encantei uma de minhas adagas com fogo azul e profano. Olhei para a escrava, que tremia de medo, e tentei acalmá-la com um tom de voz manso combinada a uma expressão relaxada.

— Não tenha medo, nós te tiraremos daqui. Mas tenho que te libertar primeiro.

Mesmo fremida, ela concordou, engolindo em seco, e virou suas costas para mim para que eu pudesse trabalhar na coleira de ferro no seu pescoço. Percorri o aço de boa qualidade com meus dedos, por sorte não havia magia embutida. Usei a adaga encantada para cortar aço como se cortasse manteiga. Era um trabalho muito preciso, pois não pretendia feri-la por acidente.

No momento em que a libertei, mandei que corresse para fora do quarto e que me esperasse na porta. Ela o fez. Voltei-me para Zyora e Thades, colocando-me de pé no canto do cômodo. Ele havia acabado de se recuperar, ainda que a pele ao redor dos seus olhos estivesse muito vermelha e irritada. Usava apenas uma calça de linho branca e o torso nu estava molhado de suor. Ele desembainhou uma espada bastarda de uma bainha de couro negra ornamentada. A espada tinha uma pedra ametista no seu pomo e o aço era negro como a noite.

Encarava Zyora como ela o encarava: com uma cólera fria e destrutiva consumindo seu olhar. Ignoravam-me por completo — não que eu preferisse o contrário.

Thades descartou a bainha de sua espada e murmurou palavras ásperas sob a respiração ofegante. Arfei quando a sua lâmina acendeu numa bola de chamas alaranjadas. Então ele também era um Encantador. Isso tornava a batalha entre ambos, no mínimo, mais interessante.

Olhei de Thades para Zyora, mas ela parecia não haver se abalado com a habilidade recém-descoberta que ele possuía. Mesmo que seu rosto jamais traísse nada, nem mesmo uma única emoção. Ela era treinada demais, experiente demais, intrigante demais.

— Vou fazer com que se arrependa por ter invadido minha casa, Assassina — ele ladrou, colocando-se em posição de ataque.

Zyora o imitou, afastando as pernas e flectindo os joelhos, posicionando sua espada pálida muito bem. Ela não respondeu à provocação, claro que não o faria, era Zyora no fim das contas: sempre prática e calculista.

Num piscar de olhos eles avançaram um contra o outro, atacando e defendendo, avançando e recuando. Cada passo, cada movimento dos braços era um espetáculo à parte. E se Thades se virava bem frente a uma das assassinas mais afamadas dessa terra violenta, Zyora mais uma vez dançava ao invés de lutar. Tão graciosa e segura de si mesma, evadindo cada golpe e aparando a espada em chamas de Thades com sua cimitarra feita de gelo.

Poderia tê-la assistido lutar por horas sem me cansar da sua graça e da sua leveza, da agilidade e flexibilidade do seu corpo, e da força dos seus músculos. Acabou tão rápido quanto começou: num movimento errado de Thades, Zyora aproveitou a abertura e lançou-se para frente numa investida perfeita. Sua cimitarra se enterrou fundo no peito de Thades num golpe silencioso e limpo. Ele largou a espada para segurar a lâmina que atravessava seu peito, mas jatos de sangue vertiam pela ferida funda, empapando seu torso e fluindo para o chão acarpetado. Os sons que emitiu ao se engasgar com o próprio sangue que lhe enchia a boca não foram nada agradáveis, mas satisfizeram enormemente uma pequena e perversa parte minha.

Nysa - A Campeã de AstherOnde as histórias ganham vida. Descobre agora