Capítulo Trinta: O Veneno da Víbora

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AQUELES DOIS ÚLTIMOS dias correram muito mais depressa do que eu tinha pressuposto. E, assim, o primeiro dia em que os combates em duplas aconteceriam finalmente chegou. Tanto havia acontecido desde a última vez em que pisei nas areias ferventes daquela arena. Dessa vez, não estaria desacompanhada: Dashaira era a minha parceira e a minha mais confiável aliada, ao menos por ora.

Pelas regras, lutaríamos em duplas, um contra um ou dois contra dois, isso não importava. Para que uma dupla avançasse para a próxima etapa ambos os lutadores tinham de chegar ao final da batalha com vida. Além disso, era requisito que a dupla adversária estivesse morta ou incapacitada de continuar a luta até o término da primeira hora. Eles não parariam o combate caso uma de nós fosse ferida, tampouco considerariam nossa opinião na questão. Uma vez que as grades se fechassem, quatro competidores pisariam nas arenas, mas apenas dois — e de preferência da mesma dupla — teriam permissão para deixá-la.

Nossos adversários eram temíveis. De Bokham eu pouco sabia exceto o que era de conhecimento geral: ele era jovem, um soldado, segundo o que alguns diziam. Feroz e elegante, seu desempenho em batalha independia da escolha de sua arma. Mas quem de fato tirava meu sono era Meon, o gracioso e letal envenenador do reino de Éberus. Suas lâminas banhadas em veneno eram perigosas demais para serem ignoradas; bastaria um corte mínimo e a batalha estaria perdida. Eu ainda me recordava com calafrios dos efeitos devastadores do seu veneno no meu corpo.

Além disso, teríamos desafios adicionais para nos preocuparmos. Todos os anos, os organizadores do Torneio Trissolar os selecionavam e os mantinham em segredo de todos até esse dia. Eu estava tensa, tinha dormido pouco na noite anterior, e a ansiedade estava me dilacerando. Apesar disso, até que estava lidando bem com tudo se considerasse as consequências que se abateriam sobre mim caso falhasse, sendo a mais grave delas, indubitavelmente, a minha morte.

Apenas quatro de nós, os melhores dos melhores, avançariam para a próxima rodada. Eu tinha de ser um deles, falhar não era e nem mesmo sequer foi algum dia uma opção. Que minhas deusas me protegessem e que me agraciassem com mais uma vitória.

O sol mal havia nascido quando eu deixei a mansão na companhia de meu senhor em direção à Arena. Ele havia me instruído e treinado o máximo que o tempo curto o permitiu fazê-lo e eu estava grata por isso. Mas agora tudo dependia de mim — e de Dashaira, e da graça e benevolência de Bashir e Meriath.

Mesmo que ainda fosse cedo demais, um grupo notável de espectadores já se reunia perto dos portões principais da Arena, queriam os melhores lugares, é claro, para assistir ao próximo massacre. Deusas, que eu concedesse a eles o melhor espetáculo de suas vidas, rezei e minha alma estremeceu junto da de Cadius.

Eles me reconheceram obviamente. Alguns até mesmo chegaram a gritar pelo meu nome. Já outros optaram por se referir a mim pela maneira como fui batizada através do sangue que derramei e das vidas que já ceifei, Natie'nah Ivi'ehradai, entoando-o como numa espécie de culto à minha pessoa.

— O que significa? — perguntou meu senhor quando passávamos pelos portões, deixando a pequena multidão para trás.

Eu ergui o queixo, orgulhosa, para respondê-lo:

— A Fúria Prateada das Arenas.

Ele me ofereceu seu silêncio como resposta a isso, um silêncio taciturno e contemplativo, e eu não dei muita atenção a esse fato. Sabia que apesar de tudo Gorah ainda tinha sentimentos mistos quanto à minha participação no torneio devido à sua experiência pessoal com a violência brutal que ditava as regras naquelas arenas.

Percorremos uma das galerias internas até alcançarmos o pavilhão para onde os competidores seriam levados e mantidos até a hora da luta. Dashaira não havia chegado ainda, nem Meon ou Bokham. Eu era a primeira. Ótimo, isso me daria mais tempo para me preparar.

Nysa - A Campeã de AstherOnde as histórias ganham vida. Descobre agora