Capítulo Onze: O Berço de Tudo

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QUANDO PASSAVA PELO PORTÃO para entrar, ainda sob os brados entusiásticos da multidão, algo curioso aconteceu.

Os soldados acabavam de encerrá-lo às minhas costas quando levantei a cabeça e me deparei com a próxima participante, pronta para entrar. Mas ao contrário do que se esperava, ela não demonstrava ansiedade ou transparecia nervosismo. Sua postura relaxada indicava na realidade muita segurança.

Estava encostada à parede úmida do túnel com os braços cruzados sobre o peito e foi aí que ela chamou minha atenção pela segunda vez, por usar uma armadura de verdade, não os corsoletes de couro cozido e batido, mas sim uma couraça de ferro leve sobre o torso, ombreiras elegantes e protetores que cobriam seus braços e pernas. As cores eram curiosas: preto e vermelho esmaltados.

Olhei seu rosto e ela olhou de volta para mim; sua pele tinha uma tonalidade olivácea bonita. Os olhos eram amendoados, mas nada tinham de doces. Fitaram-me com aspereza, até mesmo com hostilidade. E o longo cabelo negro estava trançado desde o topo da cabeça. Portava espada e escudo, assim como eu. Mas suas armas possuíam um refinamento único, não eram frutos do trabalho de qualquer armeiro ordinário, mas sim do melhor dentre eles.

A estranha continuou olhando para mim por um longo momento, até que os guardas abrissem o portão para ela. A garota, quase tão jovem quanto eu, desencostou da parede e passou por mim e pelo portão, pisando na arena.

Fiquei para trás, incapaz de me mover por um tempo, absorvendo o modo como reagi a ela e ela, a mim.

Olhei por cima do meu ombro para vê-la se afastar na direção do centro da arena. O sol brilhava em sua armadura e ela já carregava espada e escudo em cada mão. Aproximei-me do portão gradeado enquanto ela se reunia com seus oponentes. Esforcei-me para ouvir a voz clara de Telak por cima dos uivos da multidão. Ouvi três nomes que eram estranhos a mim, dentre eles aquele que eu buscava ouvir: ela era Dashaira, filha de Théocras.

Gostaria de ter ficado ali e assistido a sua luta, mas os guardas não permitiriam. Então me retirei antes que o combate se iniciasse, lamentando o espetáculo que eu sabia que estava perdendo.

Como estava proibida de me reunir com os demais lutadores, eu tive de seguir para outro pavilhão, completamente isolado. Mas, na metade do percurso, também me deparei com Alays, a garota de antes, que sorriu de forma dura para mim.

— Vejo que conseguiu, Mensageira. Devo lhe parabenizar?

Encarei-a com altivez e continuei seguindo para onde deveria seguir. Uma vez lá, encontrei Gorah, que veio na minha direção no momento em que me viu ali.

— Pelos deuses, você conseguiu! — rejubilou-se ao tocar meu rosto com ambas as mãos para averiguar se eu não estava ferida.

— Eu estou bem — garanti aos risos e meu senhor chupou uma respiração áspera antes de se afastar.

— Tem ideia do que fez, Nysa? O modo como os atiçou naquela arena? Chamou atenção desnecessária para cima de você, agora as expectativas deles serão sempre altas demais.

Eu avisei, Cadius me lembrou de minha imprudência mais cedo, mas acabei ignorando-o.

— E eu terei prazer de atendê-las, senhor — afirmei. — Cada uma delas. E cada vez que eu pisar naquela arena, darei uma luta tão grandiosa a eles que nem mesmo se lembrarão dos demais competidores.

Meu senhor Gorah afastou o cabelo dos olhos num gesto cheio de frustração.

— Combinamos que você se conteria, ao menos nas primeiras rodadas. Tem sorte de haver uma proibição, caso contrário os outros competidores veriam do que é capaz e isso colocaria um alvo imenso nas suas costas.

Nysa - A Campeã de AstherOnde as histórias ganham vida. Descobre agora