Capítulo 14

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Quatro anos. Esta era a quantidade de tempo que Neteyam estava conosco. Após mais um dia como qualquer outro, Liö e Neteyam estavam preparando suas refeições enquanto eu analisava a Grande Árvore. Ela, naquele dia em particular, não estava produzindo Atokirinas. Analisei seus galhos e raízes, mas parecia estar tudo certo.

— Zaya, não vai se juntar a nós? — Neteyam perguntou num tom mais elevado de voz, tentando chamar minha atenção.

Mas eu o ignorei. Sentia que havia algo errado.

— Zaya, aconteceu alguma coisa? — Dessa vez fora Liö quem perguntara.

Minhas mãos começaram a ficar trêmulas e meu estomago revirado. Alguma coisa estava acontecendo no Mundo Exterior. Hesitante, caminhei até a entrada do Bosque com Liö e Neteyam atrás de mim. Eu estava desconfiada de que se a Árvore Sagrada estava vazia, o Bosque em contrapartida estaria cheio. Esse era o modo de minha mãe me alertar.

E para minha angústia, ele estava lotado.

Como naquele dia há quatro anos, era impossível ver as margens ou o próprio lago pela quantidade incontável de Atokirinas. Mesmo me sentindo mal, sabia que devia começar a fazer meus deveres. Respirei fundo e comecei a levar os Atokirinas errantes para o centro do Bosque.

Liö e Neteyam me ajudaram, calados. Eu sabia que eles dois estavam me olhando preocupados, mas o que realmente estava me preocupando era se essa guerra algum dia terminaria. Quando segurei o último Atokirina em minhas mãos, Neteyam se aproximou de mim.

— Acho melhor ver como a Árvore Sagrada está. — Disse baixinho.

— ... Hoje não teremos Atokirinas puros. Apenas recém chegados.

— Zaya, vá descansar. Deixe que eu e Liö cuidemos daqui. Vá ficar com Eywa.

Neguei com a cabeça. Meu olhar estava perdido naquela paisagem branqueada. Neteyam tentara pegar o Atokirina que estava comigo, mas eu não permiti, o que deixou o azulado confuso.

— Sabe de qual espirito este Atokirina veio? — Minha voz saira mais trêmula do que achei que sairia.

— Não. Quem era?

— Coronel Miles Quaritch.

Neteyam se espantou com a informação.

— Achei que humanos não poderiam se tornar Atokirinas após suas mortes. Por que ele está aqui?

— Humanos não podem retornar como Atokirinas, então... Este aqui... É um Atokirina puro. Eywa fez novamente a junção de almas.

— E por que ela faria isso com ele?

— Ela está me dando uma escolha.

Neteyam deu um passo para atrás, receoso.

— Zaya, o que você vai fazer?

Eu estava tentando controlar o que estava sentindo, mas a raiva estava começando a me consumir. Todas aquelas almas tiradas à força, tantos seres vivos mortos sem terem qualquer culpa ou participação não me deixavam pensar com clareza.

— Neteyam... E-eu acho melhor não ver isso.

— Zaya, lembre-se que há um espírito puro aí dentro.

— Há mais do Quaritch neste pequeno, do que alguém novo.

— Por quê você tem que escolher isso?

Voltei meu olhar para o rosto assustado de Neteyam.

— Porque não posso permitir que você tenha que fazer isso. Liö, por favor, você pode...?

Com os olhos marejados, Liö se aproximou de Neteyam e o abraçou, fazendo com que o mesmo ficasse de costas para mim. Da primeira vez que Quaritch teve seu destino selado, Neytiri tirou-lhe a vida com uma flecha em seu coração. Mas isso não fora suficiente para acabar com esta guerra. Agora, estava nas minhas mãos decidir se Quaritch retornaria ou não.
Como uma junção de almas, parte do poder de Eywa percorria por aquele pequeno Atokirina, o que também pesava em minha decisão.

Olhei para Liö, apenas para ter certeza de que estava fazendo a coisa certa, e ela assentiu, abraçando Neteyam com força.

— Faz o que tem que fazer, Zaya — Disse ela. — Tá, tudo bem.

Ok.

Respirei fundo e fechei minhas mãos com toda a minha força. Era como se eu tivesse tirado um peso de minhas costas, embora eu ainda sentisse todas aquelas mortes. Abalada, deixei Liö e Neteyam ali e caminhei até a Árvore Sagrada, onde sentei-me sobre suas raízes. Abracei meus joelhos e fiquei um tempo ali, até minhas mãos pararem de tremer. A marca do Atokirina ficara em minhas mãos, como uma lembrete deste dia.

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Quando escureceu, Liö veio ao meu encontro. Ela se abaixou a minha frente e tocou meus braços, com um sorriso reconfortante.

— Como você está?

— ... Eu não sei.

— Você fez o que precisava. Não se martirize tanto.

— Eu o matei.

— Pense que agora Neteyam e sua família não terão mais motivos para fugir. Eles terão uma vida tranquila agora. Bom, isso se o humanos não voltarem a atacar Pandora novamente.

— Eu juro que se eles o fizerem... Eu mato cada um deles! — Falei entredentes.

Liö colocou suas mãos em meus ombros, me lançando um olhar preocupado.

— Zaya, não. Eywa não permitirá isso. Lembre do que ela disse: sempre haverá um alguém em que poderemos confiar. Nem todos os humanos são ruins. Jake e Dra. Grace são o exemplo disso. Não deixe que a raiva a consuma, Zaya. Por favor.

Soltei um suspiro fraco, tentando me acalmar.

— Você está certa, me desculpe.

— Tudo bem. Só... Mantenha a cabeça no lugar, está bem?

Assenti, desviando meu olhar.

— E Neteyam? — Indaguei.

— Está triste pelas mortes. E preocupado com você. Conversei um pouco com ele e me parece que o mesmo está mais tranquilo agora.

— Que bom. Acho que não tenho cabeça para falar do retorno dele agora.

— Ah, não. Não precisa por agora. Em nenhum momento ele tocou no assunto, então, acho que ele sabe que esse é um momento bem delicado pra você. É claro, que em algum momento, vocês terão que falar sobre isso.

— Eu sei.

— Já tomou alguma decisão sobre isso?

Voltei a olhar para Liö. Por um momento eu cheguei a pensar em ficar e deixar que Neteyam voltasse sozinho, mas eu já havia tomado a minha decisão.

— Irei para o Mundo Exterior com ele.

Liö sorriu.

— Fico feliz. Você e ele merecem essa chance.

Liö levantou-se e me ajudou a levantar também. Uma vez de pé, Liö ajudou a tirar algumas sujeirinhas de meus cabelos e corpo.

— Me pergunto se ficarei bem sem você lá comigo. Precisarei dos seus conselhos a abraços mais do que nunca.

— Você vai ficar bem. É mais forte do que pensa e é muito corajosa também. Você tem mais gentileza no seu dedo mindinho do que qualquer outro Na'vi tem no corpo todo — Ela segura meu rosto com suas mãos — Estarei aqui sempre que precisar, está bem? Mas espero de coração que não precise e que aproveite cada momento.

Comovida com suas palavras, abracei Liö fortemente. Eu estava com medo do que poderia acontecer no Mundo Esterior, mas estava determinada a conhecê-lo.

Zaya - Princesa De PandoraWhere stories live. Discover now