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A floresta de Setville estava coberta por uma densa neblina, um vento pairava sobre as copas das árvores, fazendo as folhas farfalharem. Sophia corria desesperadamente, gritando por socorro em um ritmo frenético e desesperador. Mas não havia ninguém por ali que pudesse aparecer em seu auxílio e salvá-la, alguém que pudesse ouvir seu clamor por ajuda, exceto seu predador, que sorria ao ouvir o medo agoniante daquela garota. Simons estava em êxtase, deixando Sophia com a falsa esperança de que havia conseguido escapar de seus caninos, com a centelha de liberdade que poderia sair dali com vida. Mesmo à uma boa distância, ele era capaz de ouvir seus passos, as batidas pulsantes fora de ritmo do seu coração. Mais cedo, os dois haviam se conhecido em uma festa de escola. Simons chamara muito à atenção daquela moça. Seus olhos azuis profundos, o cabelo preto e a pele terrivelmente branca deixavam evidente que ele era o cara novo que tinha ouvido as amigas falarem uma semana antes. Claro que Sophia também era atraente para ele, com os cabelos loiros, os olhos verdes e um sorriso poderoso, que fazia os rapazes ficarem com as pernas bambas. Após uma troca de olhares constantes, foi ela quem resolveu se aproximar e puxar assunto. Foi chegando de mansinho e não demorou muito, os dois estavam dando gargalhadas como se fossem velhos conhecidos. Era evidente que havia muita atração entre os dois, um misto de familiaridade e desconhecido.

— Parece que eu te conheço há tanto tempo. — Sophia disse para ele.

— Também estou com a mesma sensação. — Simons concordou.

— Minhas amigas falaram sobre você. — comentou, dando um gole em sua bebida.

— Espero que não tenham falado tão mal. — ele sorriu.

— Pra falar a verdade, elas acham você um gatinho.

— E você, o que acha?

— Só vou saber depois que ouvir seu miado.

Os dois caíram na gargalhada.

Sem querer perder tempo, Simons deu o próximo passo.

— O que acha de irmos para um lugar mais reservado? — sussurrou no ouvido dela.

Sophia pareceu considerar a proposta, com os dedos polegar e indicador no queixo e, alguns segundos depois, concordou. Ele pegou na mão dela e a conduziu por entre os outros convidados.

Os dois saíram da festa sem serem notados. Em eventos adolescentes assim, ninguém realmente presta atenção ao que de fato acontece, estando mais empolgados com sua própria diversão. Sophia entrou no carro com Simons e eles seguiram para o tal "lugar mais reservado" que ele mencionara. Ele deu algumas voltas pela cidade como se procurasse um lugar ideal para ficar à sós com Sophia, até que seguiu por um caminho. Ela não percebeu quando pegaram uma estrada que ela não conhecia, ou simplesmente fingiu não perceber. Seguiu cantarolando a música que tocava no rádio do carro, uma voz doce e afinada, de vez em quando trocando beijos com Simons. Os lábios dele eram estranhamente frios, mas o beijo era quente, com um hálito envolvente, o tipo de choque térmico que atiçava, que dava tesão. Após uma boa parte do trajeto, Simons parou o carro em um acostamento e ficou em silêncio. Sophia olhou em volta e depois o encarou com um sorriso malicioso nos lábios.

— Vamos transar dentro do seu carro ou na mata, Simons? — ela perguntou, já com a mão na camisa dele.

— Não vamos transar, Sophia... — ele respondeu em um tom seco, deixando a frase no ar.

Ela se afastou e o encarou com certa surpresa.

— Ah, não? Então por que foi que você me trouxe aqui? — ela perguntou, achando que era uma brincadeira dele.

— Porque estou faminto... de sangue. — ele concluiu.

Sophia continuou sorrindo sem entender, mas o sorriso foi se desfazendo em seu rosto ao ver os olhos de Simons ficarem escuros e sua expressão mudar totalmente. Os olhos dela se arregalaram e ela percebeu seus caninos ficando cada vez mais longos. "Oh, meu Deus. É você!", ela disparou, "Você é o assassino!". O terror tomou conta e Sophia abriu a porta do carro e correu em direção à floresta, gritando no tom mais alto que sua voz era capaz de alcançar. Simons apenas observava, com as mãos no volante. A emoção da caçada era o verdadeiro prazer para ele, e não havia como escapar. Ele desceu do carro e caminhou calmamente em direção à mata, não tinha pressa, a noite estava ao seu favor. Embrenhou-se entre as árvores, perseguindo o cheiro exalado pelo medo daquela garota. O medo de suas vítimas tornava bem mais fácil localizá-las ali na floresta de Setville, era quase como se pudesse vê-la de perto, sem ainda ter chegado lá.

Sophia sentia o coração pulsando forte no peito, a respiração ofegante e o cansaço tomando conta, lutando contra o próprio corpo em uma descarga de adrenalina. Ela continuou correndo, sentindo uma forte dor abaixo da costela, mas a ignorava com relutância. Seu único objetivo era conseguir ajuda. Mas não teve tempo de pensar na hora do desespero, só agora se dava conta de que deveria ter corrido em direção a cidade. Sentia que estava perdida, mas talvez a salvo daquele monstro. Ela precisava parar, respirar e recalcular a rota. Ela parou perto de uma árvore para recuperar o fôlego, exausta, a respiração descompassada, lutando para não desmaiar. Então ela ouviu os galhos acima estalarem e, quando olhou, viu Simons pulando em cima dela, que a agarrou com força e deixou-a completamente imóvel. Ela não tinha mais forças para tentar lutar.

— Hummmm, sinto o gosto do seu medo. Tem cheiro de jantar. — foi o que o seu assassino disse, loucamente domado por um olhar cheio de intenções inteiramente brutais e sanguinárias.

Antes que Sophia pudesse ter qualquer reação, ele cravou com força os caninos no pescoço dela, saboreando seu sangue até a última gota. Deixou o corpo dela cair no chão, desfalecida. Um filete de sangue escorreu pelo canto dos seus lábios e ele passou a língua, seguindo com um sorriso condensado de satisfação completa em seu rosto. Estava deliciosamente saciado e bem... por enquanto.

A EscolhidaWhere stories live. Discover now