VII

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Ao entrar no recinto, dois policiais a encararam subitamente. Ela deu bom dia e dirigiu-se a um deles, perguntando pelo delegado Martinez.

— Ele se encontra na sala dele. Do que se trata? — instigou o policial.

— Desculpe, mas o assunto é só entre eu e ele. — respondeu convincente.

— Se quiser falar com ele, tem que falar comigo primeiro. O delegado Martinez anda muito ocupado para atender necessidades ocasionais. — o policial riu, olhando para o parceiro que o acompanhou.

Ignorando o comentário grosseiro do oficial, ela continuou.

— Apenas diga a ele que meu nome é Érika Green.

O policial se contraiu. Era óbvio que ele já tinha ouvido falar dela. Baixou a cabeça, resignado, e disse:

— Perdão, senhora. Irei chamá-lo agora mesmo. — o policial ficou cabisbaixo.

— Obrigada. — Érika respondeu, levemente ofendida com o adjetivo "senhora". Mas preferiu entender que tinha sido um ato de respeito, mesmo diante do desrespeito no momento em que ela chegou. O policial pediu licença e saiu em busca do delegado.

Érika ficou ali parada, em pé, olhando o ambiente à sua volta. A delegacia era velha, com paredes perdendo a tinta e as grades de ferro descascando, que pareciam implorar por uma manutenção urgentemente.

— Então a senhora é o "reforço"? — perguntou o outro policial, fazendo aspas com os dedos, mas não desdenhosa.

— Por favor, não me chame de senhora. Olhe bem para minha cara, oficial.

— Desculpe, mas depois de tudo o que o delegado disse sobre você, eu não esperava alguém tão...

— Jovem? — ela terminou a frase por ele. — Não se deixe enganar pela minha aparência, "senhor". — conclui repetindo o gesto do policial, com direito a um sorriso soslaio.

No mesmo instante, o delegado Martinez chegou com o primeiro policial, acompanhando-o na sua retaguarda.

— Érika Green! — ele disse o nome dela mais como uma espécie de alívio em vê-la do que uma saudação.

— Delegado Martinez. — ela estendeu a mão para cumprimentá-lo. Ele retribuiu o gesto e colocou a mão esquerda sobre a deles, apertando levemente.

— Que bom que você veio, detetive Green. — deixou escapar um suspiro.

— Podemos conversar em particular? — ela pediu.

— Sim, é claro. Vamos para minha sala.
Érika o seguiu para dentro da delegacia, deixando os dois policiais os acompanhando com os olhos.

Já na sala, após Érika sentar-se, o delegado ofereceu uma xícara de café, que ela recusou gentilmente.

— Obrigada, mas já tomei bastante no hotel. Estou aqui para conversar sobre a carta que enviou para mim. — ela foi direto ao ponto.

— Graças à Deus você decidiu viajar até aqui. Setville precisa de você.

— Seu caso não me atraiu de início, confesso. Não me senti animada em viajar para um lugar fora da minha jurisdição. Garotas desaparecidas depois de uma festa? Acredite, já vi esses casos, e elas sempre voltam. Mas depois de ler suas palavras desesperadas nesse papel — ela disse, balançando a carta na frente dele — sobre um possível serial killer, resolvi vim olhar isso de perto e acabar com seus temores. Claro que quase mudei de ideia no último momento. Mas agora que estou aqui, vamos aos fatos. Cadê o arquivo do caso?

O delegado Martinez pegou uma prancheta com papéis e entregou para Érika.

— Essas são as garotas desaparecidas, detetive. Todas moças conhecidas e de caráter. Eu lhe asseguro que elas não aprontariam algo desse tipo com suas famílias. Já reviramos Setville inteira e não as encontramos. Não tenho muitos policiais e nossos recursos são limitados, mas ouvimos que você é a melhor.

Érika folheou as páginas do arquivo, lendo em voz alta para si mesma.

— Sophia Dunan, Madison West e Clarice Sinner, todas desaparecidas em festas adolescentes. Pegaram uma lista de convidados dessas festas e entrevistaram todos? — Érika perguntou, ainda sem tirar os olhos dos papéis.

— Como eu disse, nossos recursos são limitados.

— Certo. Então começaremos por aí. Antes de mais nada, ambos sabemos que não tenho jurisdição aqui, delegado. Preciso saber qual é a minha zona de autoridade.

— Você tem total autonomia. Pode usar o que temos. Está à sua disposição.

— Ótimo. Então é melhor começarmos agora. Iniciaremos pela garota desaparecida mais recentemente, Sophia Dunan. Temos que ir na casa onde ocorreu a festa e de uma lista de convidados. Mande seus homens para buscarem essas informações também nas casas em que as outras garotas estiveram. Quero saber quem as viu e quem falou com elas. Peça que anotem cada detalhe.

— Vou providenciar agora mesmo. — disse o delegado, assentindo.

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Os dois seguiram para a residência de Brenda Case, responsável pela última festa. Era uma mansão, de dois andares e com um belíssimo jardim na frente. O muro era feito de grades brancas, tornando possível visualizar o quintal. Havia uma enorme piscina na lateral, de cerâmicas azuis e trampolim nas bordas. Érika não esperava esse tipo de coisa por ali. Ela acompanhou Martinez em direção a porta. Ele tocou a campainha e aguardou. Quem atendeu foi a própria Brenda, ainda com cara de sono.

— Delegado Martinez, o senhor por aqui? A essa hora? — ela deixou escapar um bocejo. Estava vestindo baby doll de seda cor-de-rosa e usava pantufas — O papai já saiu. — Ela concluiu.

— Na verdade, viemos falar com você. Essa é a detetive Érika Green. Ela precisa lhe fazer algumas perguntas.

Brenda abriu mais os olhos para ver a oficial melhor.

— Ah, tá. Claro. Sobre o que é?

— Sophia Dunan. — Érika respondeu.

Brenda empalideceu. Estava evidente que mencionar as garotas desaparecidas assustava as outras moças, que temiam serem a próxima vítima. Pelo visto, Martinez não exagerou quando disse que todas estavam pensando se tratar de um serial killer.

Com a voz nervosa, Brenda respondeu:

— Tudo bem. Entrem. Mas só um minuto que vou subir e me vestir. — ela disse enquanto os guiava para um sofá na sala. — Fiquem à vontade. Volto em um instante.

— É uma bela casa. — Érika comentou para o delegado quando ficaram à sós.

— Os Case são a elite da cidade.

— Eu tento imaginar. — ela disse sendo evasiva.

— Estou ansioso para vê-la em ação, detetive. — Martinez disse, empolgado.

— Você mal pode esperar...

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