XXII

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Como já esperado, nenhuma das equipes localizou ou teve algum sinal do paradeiro dos corpos. Érika não os levou para a estrada, pois estava determinada a ir lá sozinha. Ela e Edgar não trocaram palavras durante toda a rota, mas ela sabia que ele estava com o ego ferido por ter apanhado para uma mulher. Ao estacionarem em frente a delegacia, ela resolveu falar com ele.

- Você não está chateado pelo que aconteceu, não é?

- Eu? Claro que não! - respondeu em um tom exasperado - Isso aqui - apontou para o nariz -, isso aqui não foi nada.

- Tem certeza? E suas bolas, como estão?

- Detetive, você só me acertou porque me pegou de surpresa.

- Claro. Diga ao delegado que converso com ele amanhã. E vou levar essa viatura comigo hoje.


Edgar assentiu e saiu do carro.

Érika deu meia volta no veículo e ocupou o lugar do motorista, engatou a marcha e seguiu caminho, pegando uma rua por trás da delegacia. Ao passar pelos fundos do prédio, ela se deparou com o delegado Martinez conversando com alguém. Era um homem e estava de costas para ela. Ela não identificou o sujeito, mas sua postura lhe era muito familiar. O delegado a avistou e acenou para ela. Ela buzinou, esperando que a pessoa misteriosa também a olhasse, mas não houve reação da parte dele, continuando imóvel com algum documento na mão. Érika seguiu viagem.



Era 19:00h e ela sabia que Simons já estava no hotel, esperando por ela. Ele poderia esperar, afinal, tudo isso era culpa dele. Desde o começo foi culpa dele. Foi Simons quem a fez sair de Holden City para Setville. Foi Simons quem cometeu três homicídios. Foi Simons quem tentou matá-la. E era Simons quem estava fazendo-a questionar seus princípios. Talvez Simons também estivesse mentindo e teria sido ele que escondera os corpos em outro lugar, e agora estava tentando desviar a atenção dela. Ou era isso ou ela estava amolecendo e se deixando levar pelo charme rebelde dele. Conhecendo muito bem a si mesma, optou pela primeira hipótese.

Chegou ao local desejado. Pegou uma lanterna, sua arma e adentrou na tenebrosa floresta de Setville. Estava nublado e a luz da lanterna não era muito útil. Ela queria investigar isso sem precisar transformar-se em wolfwoman. Tinha apenas um lugar em mente ao entrar na floresta: aquele casebre. Pensou em qual seria a história daquele lugar, o motivo de ter sido construído em um local isolado. Mais ainda, era possível ter alguém por ali? Aparentemente, Simons era o único que se aventurava por aquela região. Manteve a arma em punho e continuou andando.

Meia hora depois ela já estava parada no local onde deveriam ter encontrado o segundo corpo na noite anterior. Estudou o ambiente e pensou o que uma terceira pessoa teria feito ao chegar ali. Se existia outro conhecedor da história, era evidente que sabia o que Simons era. Percebeu que não havia perguntado a ele se tinha contado para alguém sobre ser um vampiro. As pessoas sempre tem um melhor amigo para quem contar um segredo grandioso. Sabia disso porque havia uma pessoa que sabia seu próprio segredo. Simons teria contado para Ícaro? Homens gostam de se exibir. Mas Ícaro não parecia o tipo que aguentaria ficar de boca calada. E havia ainda uma outra possibilidade: e se as garotas tivessem sobrevivido? Ou pelo menos uma delas, de repente. Simons era inexperiente nesse lance de vampiro; era plausível supor que talvez ele não tivesse mordido direito.

Ela direcionou a luz da lanterna para o casebre e caminhou em sua direção. Lembrou-se do que havia dito para Simons sobre filmes de terror em lugares assim. Sentiu um certo calafrio e riu de si mesma. Meu Deus, ela era o próprio terror. Chegou em frente ao casebre. Ele não era pintado e a madeira era velha e gasta, a varanda estava tomada por ervas daninhas. Pisou no primeiro degrau da escada e a madeira rangeu. Érika foi subindo lentamente. Era claro que não havia ninguém ali, o ambiente era assustador. À menos que o demônio morasse ali.

Tocou a maçaneta da porta, virando-a lentamente. Foi quando sentiu algo pinicando em sua pele. Ela soltou a lanterna, cambaleou para frente e sentiu a visão ficando turva. Tentou virar-se para ver o que provocara tal reação, deparando-se com uma figura masculina, sem camisa. A luz da lanterna no chão não alcançava seu rosto, mas era possível ver o seu peito. Érika viu o símbolo e, mesmo zonza, o reconheceu como sendo o mesmo que estava desenhado na árvore perto da primeira cova: a cruz invertida dentro de um círculo.

Então veio o primeiro golpe. A figura desferiu um soco contra o rosto de Érika, fazendo-a atravessar a porta do casebre. No chão, tonta, ela não conseguiu levantar-se. Sua mente ficou sem foco, mas ela entendeu que aquela criatura não era humana. Érika tentou se transformar, mas foi em vão. Sem saber o que estava acontecendo, ela continuou tentando sem sucesso. Então uma voz lhe deu a resposta.

- HaHaHa, detetive, eu esperava mais de você. Mas estou impressionado que a injeção que lhe dei ainda não a tenha derrubado.

Aquela voz, onde já a tinha ouvido antes? Ela estava quase apagando, seus olhos foram ficando cada vez mais pesados e ela era incapaz de se levantar.

A figura misteriosa percebeu o esforço dela.

- Deixa que eu ajudo você. - ele disse.

Érika sentiu a criatura a suspendendo no ar e a arremessando contra a janela, fazendo-a voltar para o lado de fora do casebre. Em seguida, ela o sentiu em cima dela, a mão em seu rosto, apertando suas bochechas com força. Então uma dor invadiu seu peito, a criatura estava rasgando sua pele com as unhas. Ela não conseguia gritar, com o som sufocado em sua garganta. A figura cortou seu rosto, começando a enforcá-la em seguida. Érika estava quase completamente apagada, quando ainda conseguiu escutar uma segunda voz.

- Já chega! Deixe-a viver. Ainda vou precisar dela.

Érika reconheceu a segunda voz. Era a voz do... então ela apagou.

A EscolhidaWhere stories live. Discover now