XLVII

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Érika sentiu a fúria tomando conta do seu corpo, o sangue quente correndo por suas veias e toda a sua força retornando. Ela não precisava mais da lua para se recuperar, a raiva dentro dela foi capaz de lhe trazer toda a energia de volta. Ela se pôs de pé diante de Ícaro. Ele a golpeou com um soco no rosto, mas Érika nem se moveu. Pela primeira vez, era possível ver medo nos olhos de Ícaro. Érika sorriu. Ícaro se afastou, mas ela o agarrou pelo colarinho, o pressionando contra a parede. Os olhos dela soltavam faíscas de fúria.

- Você não pode me matar, detetive. Eu sou imortal. - Ícaro disse.

- É o que vamos descobrir.

Ícaro finalmente iria entender o motivo de seu pai precisar tanto de Érika para seus testes. Ela era a melhor deles. Ela se transformou ali na frente de dele, um monstro gigante surgiu, imponente e imbatível. As mãos dela ganharam garras afiadas e preencheram todo o pescoço de Ícaro. Ali estava a verdadeira Érika: a Wolfwoman branca.

- Mesmo que me mate agora, você perdeu, detetive. Eu matei seu namorado e matei sua amiga. Tirei de você todos que ama. Também não vai conseguir fugir, a P.S. Foundation vai encontrar você.

Érika abaixou o olhar.

Tudo o que Ícaro dissera era verdade, tudo o que ela gostava e amava havia sido tirado dela. Não havia mais nada pelo qual lutar ali naquele lugar. Talvez, se tivesse agido no começo, as coisas não teriam tomado o rumo no qual havia chegado.

Então ela ouviu a voz de Doralice atrás de si.

- Caramba, isso fez cócegas! - ela levantou, colocando as mãos nas costas e se estralando.

Ela olhou para Ícaro.

- E aí, vampirinho. Você fala muito para quem nem é tudo isso. Érika, acaba logo com ele.
Érika, que tinha o rosto virado para olhar de relance a amiga, voltou-se para Ícaro. Ela sorriu e ele viu os longos caninos, muito maiores que os dele, formando um sorriso grotesco. Era o sorriso da morte. Érika apertou o pescoço dele, enquanto o mesmo se debatia, tentando em vão soltar-se, até ter a cabeça arrancada quando Érika fechou o punho completamente. O sangue jorrou no rosto dela e ela passou a língua, sentindo o gosto do fim.

- Pelo visto, existe mais de uma maneira de matar um vampiro. - ela disse por fim.

- Isso foi nojento. - comentou Doralice - Mas posso chutar a cabeça dele?

Ambas caíram na gargalhada.

- Amiga, só vamos sair daqui. - Érika disse.

Elas caminharam de mãos dadas até a porta, desceram os degraus e Érika parou. Ela se abaixou no local onde Simons morrera, passou as mãos na grama chamuscada, tendo os dedos cobertos pelas cinzas que ficaram. Ela levou as mãos até o rosto e desabou em lágrimas. Doralice pôs a mão no ombro dela.

- Temos que ir.

🦇

De volta a saída da floresta, Érika se deparou com os soldados da P.S. Foundation mortos, mas nenhum sinal do doutor Notório Vines. Doralice percebeu o que a amiga estava procurando.

- Ele fugiu. - comentou.

- E você deixou? - Érika pareceu confusa.

- A gente pega ele depois. Agora que sabemos o que é a P.S. Foundation e o que eles fazem, temos a chance de destruir algo grandioso.

- Primeiro vamos ter que resolver essa bagunça aqui. - ela continuava olhando ao redor.

- Relaxa, eu já planejei isso. É arriscado para mim, mas acho que consigo. - ela parecia nervosa.

- Do que está falando? - indagou.

- Um feitiço de esquecimento. Posso fazer a cidade inteira esquecer tudo o que aconteceu aqui, incluindo fazer esses corpos desaparecerem. Seria como se nunca tivesse acontecido: as mortes, o Simons, isso aqui. Só nós duas iríamos lembrar. Ou... posso fazer você esquecer também. - deixou a última frase no ar.

Érika refletia sobre o assunto. Após um longo tempo em silêncio, finalmente falou.

- Eu não quero esquecer.

- Temos que ir no hotel buscar suas coisas. Posso conjurar o feitiço na entrada da cidade. Mas temos que ser rápidas.

🦇

na fronteira da cidade, Doralice se pôs no meio da estrada. Juntou as palmas das mãos e iniciou seu ritual.

"Audite me, o sublimis magister. Nunc magnum hoc in nomen tuum, Bezael, mittite, ut omnes in hac urbe nati, hic perditi, obliviscamur. Ave, Bezael".

Érika assistia a tudo, observando com cautela, um pouco atrás da amiga. Nunca tinha visto Doralice usar tanto poder. Uma chama verde saía das mãos dela, indo em direção ao céu, espalhando-se e cobrindo toda Setville, caindo sobre toda a cidade logo após.

Érika voltou o olhar para a amiga. Notou que o cabelo de Doralice estava ficando completamente branco. O feitiço parecia estar quase completo. Doralice caiu no chão e Érika correu para ajudá-la.

- Está tudo bem! - Doralice a acalmou - Acabou agora. Nossa, nunca precisei recuperar as energias depois de um feitiço.

- Seu cabelo...

Doralice reparou.

- Eu super adorei meu novo visual. Espero que seja permanente. Agora me levanta daqui. Você dirige.

- Vai ser uma longa viagem.

Entraram no carro e Érika dirigiu de volta à Holden City, sem saber que levaria consigo uma parte de Simons em seu ventre, e que logo teria que voltar a Setville.

(Fim do primeiro livro)

A EscolhidaWhere stories live. Discover now