XXXVIII

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Ícaro chegou na delegacia e se deparou com o policial Edgar no portão, que logo o olhou dos pés à cabeça.

- O que você quer, rapaz? - aquele velho tom de desdenho.

- Eu vim falar com o delegado Martinez.

- Isso não é mais hora para visitas, rapaz.

Ícaro suspirou, incomodado por ele ter usado a palavra "rapaz" duas vezes.

- Diga que é o sobrinho dele, Ícaro Vines.

- Se é sobrinho do delegado, então por que não usou seu telefone para ligar para ele dizendo que está aqui?

Para a sorte de Edgar, Ícaro não era como Simons, ele não agia por impulso. Quando não precisava fingir ser um idiota, era na verdade muito refinado e polido, tanto na postura quanto nas palavras. Tinha classe e muito autocontrole, e era exatamente isso que o estava impedindo de arrancar fora o coração daquele policial merdinha naquele mesmo instante.

Para a salvação de Edgar, o delegado Martinez surgiu pela porta logo em seguida. Seus olhos expressaram surpresa ao ver Ícaro ali.

- Este rapaz disse que é seu sobrinho, delegado. - se pronunciou Edgar.

- Sim, ele é. Deixe-nos à sós, oficial Edgar. Aproveite e vá tomar um café. - o delegado deu a ordem, ainda encarando Ícaro.

- Sim, senhor. - obedeceu o policial.

Ícaro e o delegado Martinez permaneceram em silêncio até que Edgar estivesse longe o suficiente.

- Eu já não avisei para não aparecer aqui na delegacia, Vines? - começou o delegado.

- Eu não podia esperar, tio. Descobri uma coisa importante.

- O que houve? Trouxe o que seu pai pediu?

- Sim. - e tirou do bolso a seringa contendo o sangue de Érika. - Aqui está.

O delegado Martinez pegou o objeto da mão de Ícaro.

- Então, o que você descobriu?

- Talvez tenhamos um problema.

- Que tipo de problema? Fale logo de uma vez! - bradou o delegado, impaciente.

- Uma bruxa.

O delegado Martinez empalideceu-se. Aquilo não era possível, não tinha como ser.

- Que história é essa, Vines? Desde quando faz esse tipo de piada?

- Não é piada, tio.

- E como você tem tanta certeza disso? - o delegado exigiu saber.

- Simons me contou.

- Aquele vampiro de merda nem sabe direito o que ele mesmo é.

- Eu não teria tanta certeza disso. - Ícaro rebateu.

- E por quê?

- Eu vi a detetive, lembra? E ela já está quase 100% curada. Mesmo com os poderes dela, levaria mais tempo. Simons me disse que quem cuida da detetive é a melhor amiga. Ela se chama Doralice. Pense delegado, como a melhor amiga não saberia o segredo da outra? Como viria de longe para cuidar dela se não soubesse?

- Bruxas não existem, Vines. A P.S. Foundation cuidou disso há muito tempo atrás.

- Melhor prevenir do que remediar.

O delegado resolveu se dar por vencido.

- Tudo bem, eu ligarei para o seu pai. Vou pedir reforços. Agora vá.

Edgar apareceu logo em seguida com um copo de café na mão. Ele soprou o vapor e bebeu um gole, observando o delegado e Ícaro se cumprimentarem em uma despedida. Ícaro lhe lançou um olhar ameaçador e Edgar congelou por um instante. Ele não entendeu o motivo da súbita reação em seu corpo. Afinal de contas, poderia acabar com aquele garoto mimado com facilidade.

- Não sabia que tinha um sobrinho, senhor delegado. - comentou o policial.

- Sabe como é o trabalho, não permite que a gente tenha tempo para conversar sobre a vida pessoal.

- Mas está tudo bem, senhor?

- Tudo ótimo, oficial. Volte ao seu posto. Tenho que ir agora. Tenha uma boa noite, Edgar.

🦇

Em casa, o delegado Martinez pegou o celular e telefonou para o doutor Vines. Ele atendeu no terceiro toque.

- Martinez? - o doutor disse do outro lado da linha.

- Sim, sou eu.

- Conseguiu a minha amostra? - perguntou o doutor Vines.

- Sim, estou em posse do material. Mas talvez tenhamos um problema.

- O que houve?

- Ícaro me contou que há uma bruxa cuidando da detetive Érika.

- Impossível! - bradou o doutor Vines do outro lado da linha.

- Foi o que pensei. Mas gostaria de solicitar mais homens para a missão. Somente por cautela profissional.

- Bruxas não existem, Martinez. Cuidamos disso há muito tempo. Você conhece a história.

- Eu sei. De qualquer forma, solicito uns homens à mais, por gentileza. - o tom de voz do delegado parecia ter uma espécie de súplica.

- Que seja. Mas me traga a garota o mais depressa possível. - ordenou o doutor.

- Estou trabalhando nisso. - e desligou o telefone.

🦇

Pela manhã, o delegado Martinez chamou pelo policial Eliot. Entregou-lhe uma encomenda, destinada ao prédio da P.S. Foundation em Only Faster. Deu instruções específicas ao policial para não abrir a embalagem e para entregar somente na recepção do prédio endereçado. Eliot pegou a viatura e se dirigiu para a cidade vizinha.


Durante o trajeto, percebeu na pista marcas de pneus que levavam para fora da estrada. Resolveu parar e verificar do que se tratava. Desceu do carro e traçou o caminho pelas linhas escuras no asfalto. Adentrou na floresta, quando avistou um carro. Eliot conhecia aquele veículo, era do seu parceiro, Alan. Verificou dentro do carro e descobriu que Alan não estava ali. Talvez tivesse caminhado até a cidade, pois não era tão longe dali. Se perguntou o porquê de o amigo não ter telefonado então. Decidiu que descobriria o motivo assim que chegasse em Only Faster.

A EscolhidaWhere stories live. Discover now