Abril V

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Naquele sábado no shopping, almocei todo impaciente. Engoli meu sanduíche e escutei o Miguel descrever pra minha mãe centímetro por centímetro a carta do tal jogo que o Lucas tinha e que ele não tinha. Ela, por outro lado, ficou perguntando sobre esse "meu amigo do colégio" e me fez questão de aponta-lo entre as mesas. Se eu tivesse dito que o Sander não era daqui, a senhora dona Fabiana provavelmente teria se apresentado ali mesmo.

Isso é coisa de todo pai, né? Saber quem são os colegas, as pessoas que a gente conhece... Como minha vida inteira estudei com as mesmas pessoas, minha mãe ficou curiosa de saber quem era esse cara "novo" com "nome esquisito".

Por sorte, quando o Rogério chegou da loja pra engolir o sanduíche dele também, o assunto já tinha morrido. O Miguel foi o único (além de mim) que não esqueceu do que tinha acontecido, e ficou insistindo pra eles passarem na livraria assim que acabássemos de almoçar...

Dei um jeito de dizer que tinha um compromisso de última hora e que minha mãe devia leva-lo pra comprar o que ele queria, e que depois voltassem pra casa pra descansar. Andar com criança no shopping é muito cansativo, vou te falar, viu? Mesmo que o Miguel tenha nove anos e seja um amor, ele é agitado quando quer, anda na frente, fala sem parar... Uma tristeza.

O Rogs completou dizendo que tinha que ir pra casa se arrumar porque ele sairia cedo naquele sábado, então colocou mais pilha pros dois irem embora rápido.

O timing de tudo foi meio perfeito. A gente entrou na livraria, o que o Miguel queria comprar estava praticamente na primeira estante. Ele pegou, minha mãe pagou num caixa sem filas, e logo eles estavam indo pro estacionamento com um Rogério andando a 120 por hora na frente, pra pagar rápido e pegar o carro rápido. Me despedi deles e disse que voltava mais tarde, que não era pra se preocuparem.

Era quase três e meia da tarde quando catei meu telefone e busquei o número do Sander na agenda. Ele atendeu no segundo toque, dizendo que estava acabando de se despedir do pai e do Lucas, e que me encontraria em frente ao cinema. Eu estava mais perto, então cheguei primeiro.

O saguão estava bem vazio para um sábado à tarde. Fazia um tempão que eu não ia ao cinema, nem me lembrava do último filme que assistira. Eu costumava ir depois do colégio, quando todo mundo ficava matando hora pro treino de futebol, quando estávamos no fundamental ainda e os gêmeos, já no ensino médio. Eles tinham uma carga horária diferente da nossa, então só conseguíamos nos encontrar todos de tardinha... E isso já fazia dois anos.

Espera... Dois anos que eu tinha ido ao cinema?!

Enquanto pensava naquilo, o intercambista chegou de mansinho. Parou na minha frente, sorriu meio desconcertado e indicou o guichê pra comprar os ingressos com a cabeça.

Eu indicaria os caixas eletrônicos, em que dá pra comprar com cartão, mas imaginei que o Sander não tivesse um cartão de crédito pra poder gastar à vontade, né? Então teríamos que enfrentar a pequena fila do caixa mesmo.

– Qual filme você quer ver? – ele me perguntou.

– O que você quiser. Você me convidou, não foi?

Nós rimos e ele assentiu, olhando a lista dos que estavam em cartaz.

Eu não ligava muito pra que filme fosse, falando a verdade, então nem prestei atenção nos nomes nem nada. Uns cinco minutinhos depois, Sander apontou um qualquer na grade de programação que era exibida num painel eletrônico ao lado a bilheteria.

– Pode ser esse? – olhei os outros filmes e não deixei de reparar que o que ele apontava tinha a duração mais longa: mais de três horas e meia no conforto do escurinho. Alarguei o sorriso e disse que sim.

Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}Where stories live. Discover now