Setembro III

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Na penúltima semana do mês, tivemos a tradicional Feira de Ciências. No ano anterior, nem tinha reparado muito no que os outros grupos haviam feito – mesmo porque no dia da Feira mesmo eu nem participei, já que peguei uma gripe violenta. O médico recomendou repouso absoluto, senão meu pai, obviamente, teria me arrastado pro colégio de qualquer forma.

Nesse ano, contudo, eu não tinha a desculpa da gripe pra me safar; por sorte o segundo ano tinha menos trabalho que o primeiro. Assim, em vez de nos dividirmos em grupos menores, o trabalho deveria ser feito por turma: A, B e C. A minha sala, o 2º ano B inteiro ia ficar responsável por um projeto. O terceiro ano como um todo, inclusive, estava trabalhando em algo de robótica, pelo que o Sander me confidenciou.

Uma das partes chatas era reunir todo mundo e discutir civilizadamente o que cada um ia fazer nessa apresentação. Tivemos nossas aulas de Educação Física quase que cortadas – era a primeira que sumia quando tínhamos algo assim, no ano anterior foi a mesma coisa! É claro que eu não gostei da ideia, mas eu era a minoria e fiquei calado.

Nosso trabalho seria recriar todos os ecossistemas do mundo numa sala de aula. Isso incluía fazer maquetes, mexer com planta, água, bichinhos em miniatura e ter extrema habilidade de trabalhar em equipe.

Não era pra mim.

Mas eu juro que me esforcei. Fui a todas as reuniões, cortei raminhos para que se parecessem com pequenas árvores, grudei todos os meus dedos com cola na hora de montar umas maquetes... Não ficou bom. As meninas me tiraram do meio da bagunça quase que instantaneamente depois de ver o resultado desse meu esforço.

– Vai ficar lá fora, Renan! – uma delas disse. ­– A gente fala pro professor que você já contribuiu o suficiente, não se preocupa.

Rolei os olhos e passei, além do horário da Educação Física, todas as aulas de Biologia e Geografia – as duas matérias que a gente resolveu juntar para a feira – sentado no corredor do segundo andar do prédio. Tava um calor absurdo; me esticar nos azulejos geladinhos era gostoso até, ao som duma playlist ora relaxante, ora festeira.

Ficar observando as três salas também era legal; sabe, olhar quando não estão olhando de volta. Vi a Camila com o Diego diversas vezes, sorrindo juntos, fazendo piadinhas, brincando como duas crianças. Aquilo me deixava contente também. Vi a Isadora conversando com o Gabriel em diversos cantinhos, escondidos no meio dos intervalos... Não questionei nenhum dos dois depois, porque não era da minha conta, mas estava claro que alguma coisa rolava. Entre eles, com eles, vai saber.

Vi a Natália e o Carlos trocarem piscadelas e gestos obscenos à distância, como se ninguém estivesse presente. Fiz uma careta involuntária ao ver a cena, mas logo comecei a rir: era típico que fizessem isso. Eles já ficaram muitas vezes, mas todo mundo do time sabe que o capitão tem um apreço especial pela irmã mais velha dela, se é que me entendem. Não sei porque ele fica arrastando a asa pra cima das duas se no final não fica sério com nenhuma. Mas daí já é problema dele – e delas, de deixar ele brincar o tempo todo, certo?

Vi o Luiz Eduardo e o William andando de mãos dadas no corredor... E isso me deixou meio melancólico, mas de uma forma legal. Faz sentido? O que quero dizer é que eles pareciam tão em harmonia um com o outro que me davam certo gosto de olhar, de imaginar como era a relação deles... A confiança que eles passavam ao andar de cabeça erguida no meio do pessoal era invejável.

Tão invejável que eu resolvi fazer uma loucura no meio dessa preparação toda para a Feira.

Era a quinta-feira antes do evento, no horário da Educação Física do segundo ano e da aula de robótica do terceiro. Subi ao terceiro andar e chamei o Sander na porta da sala, alegando ao professor que o inspetor havia pedido que ele fosse até a diretoria atender um telefonema. Tudo mentira; nem sei como não me delatei ao cair na gargalhada quando ambos – o professor e o próprio gringo – acreditaram em mim.

Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}Tahanan ng mga kuwento. Tumuklas ngayon