Dezembro II

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No sábado em que o Joel acordou aconteceu a festa de despedida do João Vitor. O nosso grupono WhatsApp, o do time de futebol,  fervilhava com mensagens desconexas (pra mim) e fotos do pessoal bebendo, vídeos de danças embaraçosas e piadinhas internas que eu não entendia mais. Dos participantes desse grupo, só eu e o Daniel não havíamos comparecido à festa. Isso não os impediu, porém, de esfregar na nossa cara que não havíamos sequer sido convidados.

Silenciei o grupo pelo máximo de tempo permitido pelo aplicativo e parei de abrir as mensagens quando elas chegavam. Eu não merecia aquilo.

Na primeira segunda-feira das férias, nós voltamos ao hospital – eu, o Sander e o Daniel. O resto do time e as meninas tinham ido visitar o Joel no domingo, então sabíamos que ele estaria sozinho – quero dizer, tão sozinho quanto ele poderia estar, né. Os parentes iam e vinham nos corredores e, apesar das restrições, o quarto sempre tinha três ou quatro pessoas sentadas no sofá-cama.

O médico afirmou que, depois do resultado da bateria de exames que ele fizera, Joel voltaria para casa provavelmente naquela semana mesmo. Os testes iniciais indicavam que ele estava bem, só um pouco desnutrido e com inchaços temporários em algumas regiões. As consequências da bebedeira tendiam a virar uma página esquecida na nossa vida, ainda bem...

Por ter ficado tanto tempo numa cama, porém, Joel teria que fazer fisioterapia para recuperar a desenvoltura dos movimentos. Afinal, seus músculos estavam todos flácidos e molengas. Isso não era lá grande coisa, porque ele se recuperaria com o devido acompanhamento.

– Vai ter que malhar bastante pra acompanhar a gente, hein! – eu brinquei, apertando o bíceps caído dele. Joel me deu um tapinha e um chega pra lá risonho.

– Nem vem. Malhar só se for na outra vida. Eita coisa chata!

A gente riu em conjunto, mas ele estava falando sério quando continuou:

– Não quero voltar pro time. – o silêncio foi palpável enquanto a gente se entreolhava e ele suspirava. – Já não me sentia parte dele há muito tempo. Acho que agora tenho a desculpa perfeita, certo?

Daniel respirou fundo.

– Acho que já não temos um time há muito tempo também.

Então ele contou que o João Vitor estava de viagem marcada para dali alguns dias e também da festa que rolou, coisa que o próprio JV não disse no dia anterior. Joel ficou surpreso, mas não tanto, ainda mais com a menção da formatura dos gêmeos e a volta do Sander para os EUA.

– Mas não é só isso... – Dani suspirou, o olhar nas próprias mãos. – Não dá pra chamar de time um conjunto de pessoas que se detesta, que não se apoia, que ao menor sinal de problema ou divergência simplesmente vira as costas.

Joel ficou calado por um momento, observando os movimentos tensos do amigo, e depois me mirou.

– Eu sei que vocês foram os únicos a vir me visitar. – seu queixo se contraiu, as marquinhas da pele mostrando o esforço do movimento. – E você tem razão. Não faço questão de tê-los por perto.

Sander e o Daniel estavam sentados cada um de um lado meu, no sofá. O quarto estava vazio, por milagre, e percebi que a tensão ainda não tinha diminuído quando o Dani abriu a boca novamente.

– Eu não vim-

– Eu sei. – Joel o cortou. – Mas sei que não foi porque não quis. Você tem seus motivos. – e sorriu. – Eu te conheço.

O braço do Sander fez pressão no meu e eu engoli seco. Joel continuava sorrindo pra nós e pediu que o Dani não sentisse remorso, porque ele estava feliz de tê-lo ali naquele dia. Feliz porque sabia que ele se importava o suficiente, o bastante.

Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}Onde as histórias ganham vida. Descobre agora