Dezembro III

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O fim do dia trouxe uma chuvinha gostosa para acalentar nossa noite. Ficamos um tempo no quarto do Lucas, assistindo um filme com ele, mas o menino pegou no sono rápido e fácil depois de passar o dia brincando. Era pouco mais de nove da noite quando o Sander disse aos pais que íamos "nos recolher".

– Boa noite. – Carmen deu um beijo na bochecha dele e o Alfredo perguntou se a gente queria tomar um leite antes de deitar.

– Não, obrigado, tá tudo ótimo assim. – eu respondi, meio constrangido.

– Tem certeza de que não quer dormir aqui, ou no sofá-cama do escritório? Talvez fique mais espaçoso que no quarto do Sander... – o pai dele questionou e eu neguei, vendo as bochechas do gringo se avermelharem.

A solicitude deles e o cuidado me deixavam levemente tímido. Nunca fui acostumado a isso, meus pais nunca foram apegados a mim ou a si mesmos daquele jeito. Eu nunca os vira trocar juras de amor, ou sequer carinhos espontâneos – um beijo, um afago, nada. Nem entre eles, nem conosco. Meu irmão e eu fomos criados na base da frieza e da violência típica, em que nossas brincadeiras se resumiam a lutinhas e xingamentos e desprezo pelos outros, principalmente pelas mulheres e incentivados pelo digníssimo senhor Nelson Souza.

Quando comentei isso com o Sander, assim que fechou a porta do quarto atrás de mim, ele sorriu.

– Quer dizer que ninguém nunca te contou histórias antes de dormir, ou te deu um beijo de boa noite?

Sem ter a chance de responder, ele me beijou. Devagar, suave, comedido. A testa encostada em mim, a respiração cálida na pele do meu rosto...

– Não... Só você.

– Eu não te contei história alguma. – ele riu. Passei meus dedos pela sua nuca, sentindo os fios de cabelo em crescimento, chegando mais perto quase ao ponto de não permitir que sua boca abrisse para falar.

– Então me conta agora. – eu o beijei. – Me conte sobre você, me conte tudo sobre você.... Me conte algo que nunca contou pra ninguém.

Once upon a time...* – ele começou falando, mas terminou me beijando, as mãos por debaixo da camiseta que me emprestara, fazendo o dever de tirá-la pela minha cabeça enquanto as minhas trabalhavam da mesma forma na sua. – There was a boy...

As pontas dos seus dedos desceram pelo meu peito devagar, devagar... Parando no cós da bermuda que eu usava. Tava difícil manter o cérebro ativo pras palavras dele fazerem sentido – sabe como é, inglês não é minha primeira língua, apesar de ter provado bastante dela.

... that fell in love with another boy.

Tirei o resto da roupa antes de chegar na cama, jogando tudo pelo caminho mesmo. O gringo já estava sobre mim quando minhas costas afundaram no colchão e meus dedos apertaram seu tronco contra o meu. Ele riu, eu ri junto. Ele tinha razão, fazia um tempo considerável que a gente não tinha tanta intimidade... E eu me vi sedento, meu corpo meio descontrolado, pegando fogo, ardendo de vontade.

Deixei que ele fizesse o que queria comigo, porque o gringo também me deixou fazer o que eu quis com o corpo dele. E a gente queria de verdade, e aquilo ficou ainda mais evidente através dos nossos movimentos famintos, mas controlados, cadenciados. Eu queria senti-lo, explorá-lo num patamar mais alto de intimidade, mas não sozinho – e ainda tinha que tomar cuidado para não fazer muito barulho e chamar a atenção dos pais dele, sabe como é...

Meus dedos encontravam no corpo do intercambista um caminho conhecido, confortável ao mesmo tempo que desafiador. Saber o poder de cada toque meu, entender qual pedacinho de pele gerava tal reação, ou ter a certeza de que ela viria era estimulante. Sentado no meu colo sobre o colchão macio, eu beijei o Sander mais uma vez, de olhos fechados, a respiração lutando pra sair nos mínimos buraquinhos das narinas. O peito dele subia e descia junto ao meu, o quadril se mexendo um pouco para lá e pra cá, me fazendo tremer de ansiedade. Minhas mãos em suas coxas, as dele no meu pescoço, no meu cabelo...

– Você quer... – o gringo suspirou, me fazendo abrir os olhos para encará-lo. Sua testa brilhava de suor. – Quer tentar?

Aproveitando o momento vulnerável, eu o joguei sobre a cama, arrancando um riso assustado enquanto trocávamos de posição. Sentando no colo dele, me abaixei pra que a gente se beijasse e fosse sua vez de descer as mãos pelas minhas costas, coxas, peito... Tudo o que estivesse no caminho.

– Só se você quiser...

E, ah, como eu queria!

Sem pressa, trocamos de posição várias e várias e várias vezes até ficarmos confortáveis.... E depois iniciávamos tudo de novo, e de novo, nos contendo para não falar alto, ou rir alto, ou, hm, gemer além da conta. Nunca me senti tão à vontade com meu próprio corpo antes, o que era algo deveras bizarro de se pensar. Afinal, era meu corpo, mas descobri que eu não sabia tanto sobre ele assim até aquela noite, regada a toques e sussurros no meio da madrugada. Não tive vergonha de saciar minhas dúvidas, nem de deixar o Sander fazer o mesmo.

Entre um experimento e outro, ele confessou que estava matando as suas próprias curiosidades pela primeira vez, comigo. Imagina o tamanho da minha felicidade? Naquela hora nem me preocupei tanto de ser completamente leigo no assunto "sexo entre homens", porque a gente estava descobrindo juntos e isso era fascinante para ambos, ao mesmo tempo!

Fisicamente esgotados, sem fôlego e com a cabeça latejando, o relógio do meu celular marcava três e vinte e quatro da manhã quando resolvemos parar essas, digamos, "descobertas" e descansar. Os lençóis estavam úmidos e sujos, mas isso só nos fez rir mais e jogá-los ao chão. Recolhi os restos de papel laminado da embalagem das camisinhas que usamos e coloquei dentro do bolso da minha calça, esparramada por ali também.

Já na cama, Sander deitou-se do meu lado, o braço sobre meu tronco, o rosto na curva do meu pescoço. De olhos fechados, eu murmurei, lutando para manter a mente em alerta:

– Você não terminou a história...

Ele sorriu abafado.

– Você se lembra do começo dela por acaso?

– Sim. – respirei fundo. – Era uma vez um garoto... que se apaixonou por outro garoto.

Meus dedos passearam pelas pintinhas que ele colecionava no peito e nossos olhos se encontraram na noite.

– Então... Esse garoto amou o outro de verdade, e sabe que vai continuar amando, mesmo à distância. – ele fez uma pequena pausa, respirando fundo. – Mesmo que esse amor mude com o tempo.

Minha garganta se fechou completamente com a frase. Tive que engolir o choro de novo.

– Ele quer que o outro garoto também ame de verdade, agora que já aprendeu a amar a si mesmo.

Ficamos em silêncio enquanto ele beijava meu pescoço e suspirava, tremendo de leve.

Deixei a lágrima escorrer sem querer, mas Sander estava lá para apará-la, tentando ser firme por nós dois.

– Ok? – ele perguntou.

–Ok. – eu respondi, simplesmente. 

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*Era uma vez... um garoto que se apaixonou por outro garoto.

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Eu juro que essas últimas frases saíram sem querer, tá? Não foram uma referência nem nada assim HAHAH

E eu, o Renan e o Sander agradecemos pelas 14 mil leituras! <3 

Fiquem com esse calorzinho no peito :)

Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}Onde as histórias ganham vida. Descobre agora