Agosto X

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A viagem terminou em quase que completo silêncio.

Ao estacionarmos na rua ao lado do colégio, todos os nossos responsáveis estavam esperando, cientes da hora que chegaríamos.

Sander desceu primeiro e os pais brasileiros dele já foram cercando-o de perguntas: se a viagem foi ok, se ele estava bem, se precisava de algo... A solicitude deles me fez suspirar e nos afastou, pois não havia lugar pra mim ali.

Com certa surpresa, vi o carro do meu irmão parado mais abaixo e hesitei em ir até lá. Pensei que meu pai estaria me esperando com toda a fúria de uma vida acumulada, todo um discurso sobre responsabilidade, nome da família, e blábláblá. Talvez minha sorte tivesse mudado nessa viagem? Não sei. Me virei para o pessoal e eu e o gringo trocamos um olhar distante. Ele indicou o telefone celular nas mãos e eu assenti, certo de que nos falaríamos mais tarde. Vi ele se aproximar do Daniel e, sei lá, oferecer carona, mas o outro negou e apertaram as mãos em cumprimento antes de se afastarem também.

Não houve qualquer piadinha por parte de ninguém. O clima era de luto.

Rogério estava dentro do carro, como presumi, mas desceu para pegar minha mala e jogar no banco de trás. Me sentei em silêncio e ele fez uma manobra pra descer a rua de volta para a avenida em frente à escola, em direção à nossa casa.

Paramos no primeiro semáforo e minha visão periférica me mostrou um rosto abatido, cansado.

– Ah, puta merda... – xinguei. Rogério imediatamente me encarou, meio alarmado. – Aconteceu alguma coisa, não aconteceu?

Ele estreitou os olhos e bufou.

– Mas é claro que aconteceu! – e suspirou. – Que história é essa de coma alcoólico, Renan?!

Franzi a testa, me sentindo derrotado.

– Eu não sei!

– Como assim não sabe?!

– Não sei! Eu não estava perto dele! Não sei como aconteceu.

– Você estava na balada, não estava? – fiz que sim e ele continuou: – Você não viu nada?

– Não, Rogs! Já disse! – passei a mão pelo meu cabelo, que não se mantinha mais tão espetado assim. – Eles devem ter dado algo pro Joel, pra fazê-lo ficar bêbado e zoá-lo. Não sei e nem imagino o quanto de bebida, porém...

– Muita. – Rogério concluiu e eu anuí.

O semáforo abriu pra nós e ele foi dirigindo devagar, quase parando. Alguma coisa estava fora do lugar, eu percebi. Digo, alguma coisa além dessa situação toda que a gente nem conseguia nomear...

Esperei que ele continuasse sem pressioná-lo, entretanto.

Rogério suspirou.

– Lembra do que você me contou quando voltamos da praia? – ele questionou, mudando de assunto de supetão. Forcei minha memória; parecia ter acontecido tanto tempo atrás! Mas então uma luzinha vermelha piscou dentro de mim e eu me virei completamente no banco para ele. – Então. Das ligações? Nós descobrimos quem era aquela mulher que ficava ligando lá pra casa.

Nós descobrimos?

– É. Eu e a mamãe... – ele fez uma pausa e um "tsc" audível. – Na verdade, a mãe da Bárbara descobriu. Ela viu o papai almoçando com... essa aí no centro, num restaurante que a gente não costuma frequentar, sabe? Daí ela chegou perto pra ver e era ele mesmo. Nelson Souza Mendonça em pessoa trocando beijos com a amante em público.

Por algum motivo, aquilo não me chocou tanto. Digo, é claro que fiquei surpreso, mas não tanto. Não o quanto deveria, eu acho.

– Você não parece surpreso... – Rogs comentou, lendo meus pensamentos e tirando o olhar do trânsito quase nulo das ruas do bairro.

Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}Where stories live. Discover now