Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}

Julho VI

Os vestidos das meninas do meu grupo ocupavam todo o espaço interno da nossa barraquinha. Sério, sem brincadeira. A Karina e a Juliana tinham mandado fazer "modelos exclusivos" para todas elas usarem: xadrez rosa e vermelho, fitinhas amarradas nas mangas pomposas e um bolsinho em formato de coração. Fora que a saia era tão rodada que não dava nem pra ver as pernas dela no meio de tanto babado - e não que eu estivesse procurando, tá?!

E não posso reclamar muito: elas não fizeram uma roupa especial pra mim. De acordo com a Karina, ela sabia que eu me queixaria muito, então só me preparou um "avental personalizado".

- Coloca que eu amarro pra você; o laço tem que ficar bem feito, senão fica feio.

O pedacinho de pano branco tinha um coração bordado na frente, envolto por um babado. A fita que prendia o avental ao meu quadril devia ter uns cinco centímetros de espessura e era de um vermelho sangue. A Juliana amarrou o negócio em mim, mas eu ajeitei a roupa pra que a blusa xadrez escondesse um pouco do laço. Uma vergonha de cada vez, certo?

As quatro meninas trocaram risinhos e suspiros quando me viram com o avental. Revirei os olhos, meio impaciente, mas deixei o assunto de lado e tratei de passar para o interior da barraquinha antes que alguém viesse me zoar – se o Carlos me visse de avental ele tiraria tantas fotos que bateria o recorde mundial, tenho certeza. E todas elas seriam postadas online e virariam alvo de zoação eterna. Meus netos seriam conhecidos como "os netos do cara de avental de coração".

O movimento foi aumentando bem aos pouquinhos. Nossos pais circularam pela festa toda e depois vieram nos "cumprimentar" – eu já conhecia os pais da Ju e da Karina, eles me deram um oi antes de se concentrar em tirar fotos das filhas e de comprar alguns dos nossos beijinhos.

Quando minha mãe apareceu, já se passava das sete da noite e tinha uma pequena aglomeração de pessoas na nossa barraquinha. Ela então ficou de longe, tirando umas fotos discretamente. Andressa a acompanhava e, para minha total surpresa, a Bárbara, minha priminha torta, estava por perto. Não notei a presença do Miguel ou do meu tio Fábio, o que era ainda mais estranho.

Enrolei um pouco pra me aproximar deles – em parte porque não deixaria as meninas sozinhas, mas mais de 50% era falta de vontade mesmo. Eu ainda não estava falando com minha mãe direito. Ela me dirigia algumas frases aleatórias e eu respondia com murmúrios ou resmungos meio indecifráveis, mas isso não era o que podíamos chamar de diálogo.

Quando me distanciei da barraca, cumprimentei a Andressa primeiro. Ela deu uma cutucada no laço do aventou e me parabenizou pela decoração e nem me dei o trabalho de explicar que não tinha participado em absolutamente nada daquilo.

- Vou comprar alguns beijinhos pra levar, vocês embrulham? – ela me perguntou e eu disse que sim. O que era verdade: a Ana Cláudia tinha preparado uns potinhos pra viagem pra quem quisesse comer depois.

Então minha tia me deixou sozinho com minha mãe e a Bárbara. A menina abraçou minhas pernas meio sem graça e eu devolvi o afago, olhando enviesado pra senhora Fabiana.

Minha mãe suspirou.

- A Vanessa deixou ela lá em casa pouco antes de a gente sair – justificando a presença da menina mesmo sem eu ter perguntado. – Disse que tinha um "compromisso" hoje a noite e pediu que o Fábio cuidasse dela.

- E onde ele está? – era a primeira frase completa que eu trocava com a minha progenitora em uma semana inteirinha. Soou esquisita, mas ela pareceu não se abalar.

- Andando com o Miguel por aí – e deu de ombros, como se aquilo explicasse tudo, retomando a fala e mudando de assunto: - Seu pai vai chegar só mais tarde. Você vai poder se sentar conosco na mesa que horas? Provavelmente o Fábio e a Andressa vão embora cedo e, como estamos com a Bárbara, também não vamos demorar muito... Então, assim que seu pai chegar, venha se sentar com a gente um pouco, está bem? Eu converso com seu professor, se for preciso.