Julho V

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A Festa Junina começaria às cinco horas da tarde do sábado, mas todos os alunos tinham que estar presente na escola às três e meia para ajudar a montar o resto das barracas e organizar os preparativos.

Cheguei no colégio às três e quarenta, sem a menor vontade de viver.

Sander: estou na sala de TV, ajudando a separar os cabos para levar pro palco.

Suspirei ao receber a mensagem antes mesmo de ir ao pátio ou subir para ver se precisavam de mim. Encontrei o Nasser no corredor, ele bateu no meu ombro e disse que precisava de gente pra carregar algumas cadeiras da quadra coberta para as descobertas.

- Faz um favor? Vai lá nas salas do segundo e vê se tem mais gente disponível. Aí vocês me encontram lá em dez minutos. – ele ordenou.

Nem tive tempo de raciocinar.

Subi as escadas pé ante pé. A calça jeans me incomodava; tava apertada demais, os rasgos no joelho me machucavam quando eu dobrava a perna. A camisa xadrez de manga comprida me fazia suar, o chapéu de palha pinicava minhas orelhas. E estava um calor absurdo! Não era um bom dia para ser um caipira...

As turmas do primeiro ano estavam em polvorosa, separando bichinhos de pelúcia e doações aleatórias para as barraquinhas de tiro ao alvo e pescaria. O corredor tava abarrotado de caixas com brinquedos! Pisei em um palhacinho sem querer, ele soltou um guincho e todas as cabeças se viraram pra mim.

- Foi mal! – levantei as mãos e apressei o passo para a escada de novo.

No andar de cima, o contraste era colossal: o corredor estava quase vazio e o barulho quase não existia. A maioria do pessoal tinha descido para organizar as barraquinhas já montadas, pelo que entendi. Esbarrei numas meninas da turma A, mas não vi conhecido algum ali fora. Espiei pela porta da minha sala e, para minha infelicidade, a primeira pessoa que vi foi o Daniel.

Não me leve a mal. Eu ainda tava meio encucado com o pensamento do dia anterior, na casa da Karina. Não deixei que ele se alastrasse, porém. Meu cérebro não podia ficar me pregando peças assim, eu tinha que controlá-lo... E era só por isso que ver o Dani era algo "ruim". Mas ele não sabia de nada – e, se dependesse de mim, não saberia tão cedo, então era bom que eu desse um jeito naquela cara de morto-vivo!

Ele e o pessoal do seu grupo estavam separando as fichas em bloquinhos arrumadinhos: ficha de refrigerante, ficha de suco, ficha do cachorro-quente, ficha do arroz doce, da cocada, da pipoca, do pé de moleque...

- Quem tá fazendo o pé de moleque? – foi a primeira coisa que perguntei, me lembrando que o Sander tinha experimentado o negócio na festa do Lucas. O gringo me falara por WhatsApp outro dia que queria comer mais um pedaço...

Daniel demorou alguns segundos pra me responder, concentrado na tarefa de passar um elástico em volta das cartolinas cortadas em cores diferentes.

- William – resmungou, mas eu não entendi de primeira. Questionei e ele levantou os olhos para mim: – O grupo do William, da turma C, é que vai trazer o pé de moleque.

O olhar dele transmitia muita coisa, cara. Tanta coisa que eu não sei se captei direito: raiva, frustração, impaciência... O que ficou é que ele definitivamente não estava contente em saber daquele detalhe, então não prolonguei o assunto.

O problema é que eu também não sabia muito o que dizer. Digo, o que a gente supostamente faz numa hora dessas, pra meio que consolar um amigo? Eu não faço ideia! Isso nunca tinha acontecido antes. Ninguém do nosso grupo "sofria por amor" - de acordo com o Carlos, aquilo era "coisa de veado".

Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}Where stories live. Discover now