Dezembro V

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A sexta amanheceu nublada. Minha mãe não estava em casa quando acordei com uma mensagem do Sander dizendo que ia sair com o pai, portanto não poderíamos nos encontrar de tarde. Como eu já sabia da armação, fingi um certo descontentamento com a situação, ao que ele me disse que poderíamos sair de noite. Ri para mim mesmo e mergulhei numa playlist aleatória para relaxar antes da tempestade que havia aparentemente passado...

A festa do Sander estava programada para no máximo às sete da noite, mas o relógio não mostrava nem seis quando eu e o Daniel chegamos ao apartamento. Quase todos os móveis da sala tinham sido empurrados para um canto perto de uma varadinha que tinha por ali e que ficava sempre fechada por conta do Lucas – foi essa a explicação que a dona Carmen deu, aliás, porque eu mesmo nem reparava muito nela. A mesa da cozinha estava na sala, ordenada com uma toalha de renda e adereços nas cores verde e amarelo.

No centro, um bolo de chocolate de três andares. No topo, duas bandeirinhas se entrelaçavam, uma norte-americana e outra brasileira. Havia docinhos aleatórios ao redor – cajuzinhos, beijinhos, pé de moleque, brigadeiros, quindins, olho de sogra, bala de coco, maria-mole, palha italiana... Enfim, tudo o que a gente encontra em festa por aí, sabe? Um verdadeiro arsenal de açúcar.

Lucas não estava em casa, tinha ido de tira-colo com o pai e o gringo ao supermercado. De acordo com a mãe, o menino tampoucosabia da festa, já que tinha a tendência a falar demais. Era bom mantê-lo afastado o máximo possível e, além disso,  ele provavelmente enlouqueceria com aquela mesa!

Pensei que poderia ter chamado o Miguel – meu priminho gostava do Sander também e ele faria uma boa companhia ao Lucas... Comentei isso em voz alta com o Dani e a dona Carmen escutou.

– Mas eu falei com sua mãe para trazê-lo. Inclusive disse que eles se davam muito bem também, o Lucas e seu primo Miguel.

Eu e o Daniel trocamos um olhar e um sorriso amarelo. Eu não sabia se a senhora Fabiana iria passar por cima do seu orgulho e ir à festa. Não havíamos nos falado desde a derradeira noite anterior e vou confessar que isso me deixava apreensivo.

De qualquer forma, ocupei meu tempo arrastando o resto dos móveis e colocando brigadeiro em forminhas. A Talita e outros colegas do terceiro ano chegaram alguns bons minutos depois e ficaram sentados no sofá da sala, conversando com a Carmen. Em certo momento, o Daniel estranhamente se enturmou e me puxou para o meio da roda. Eles falavam sobre o intercambista, é claro.

– Ele se adaptou rápido, né? – o moço do terceiro ano (que, na real, agora já era formado, né!) comentou.

– Acho que ele tinha um certo contato com a língua por lá, não é? Porque já chegou falando um pouco... E ele escreve super bem em português. – a Talita completou.

– Sim, sim! Ele teve aulas de português antes de vir, porque não queria se prejudicar na escola... E logo que chegou, a primeira coisa que comprou foi um dicionário! – dona Carmen riu e a gente acompanhou. – Ele andava com aquele chumbo pra cima e pra baixo!

Ninguém sabia daquela história, aparentemente, o que fez a mãe postiça do Sander desandar a falar outras "curiosidades" sobre ele, coisa bem típica dos pais, né? Era engraçado, porém, porque ela não era, efetivamente, mãe, mas se sentia como se fosse. Eu sabia que o sentimento era mútuo da parte dele, o que era legal.

– Ele lê bastante também. – Daniel contribuiu, os outros concordaram e a Talita ainda disse que ele ficava vendo vídeos das matérias das aulas no youtube para ver se não estava entendendo errado...

– Ah, mas nada substitui o contato, uma boa conversa! E nisso acho que vocês foram essenciais para ele se sentir mais "em casa"! – a mãe brasileira disse, e sorriu pra mim. Diretamente pra mim.

Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}Where stories live. Discover now