Novembro I

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Novembro chegou com um feriadinho insignificante no meio da semana, e que ninguém aproveitou. Aliás, mentira, os professores aproveitaram bastante para elaborar provas e trabalhos para o último mês de aula. Em plena quinta-feira, passaram toneladas de exercícios extras e outras coisas para ajudar na recuperação de quem estava sofrendo atrás de pontos – tipo eu. Minha prioridade voltou ser passar de ano e tentar não pegar recuperação final. Mesmo sem meu pai (ou minha mãe, pra falar a verdade) me cobrando, eu tinha consciência de que não queria meu Dezembro do jeito que foi meu Julho! Então só me restava estudar.

Com a carga de matéria aumentando, vi os comentários sobre minha família esfriando e o pessoal se afastando. As salas não se misturavam tanto mais, e isso significava que o Carlos e o Caíque conversavam entre si, enquanto o JV se misturava com as meninas da sala pra não ter que interagir comigo ou com o Daniel. O Felipe e o Gustavo também se mantinham na deles, na sala deles, tentando correr atrás do prejuízo.

Não sei precisar quando o João Vitor deixou de me considerar uma companhia aceitável, mas acho que por eu estar andando mais com o Dani, ele automaticamente me incluiu na lista de "pessoas a se evitar". Raramente nos dirigia a palavra dentro de sala e, quando fazia, era pra se gabar do intercâmbio, comentar sobre o corpo de alguma garota da sala, ou escarrar ojeriza sobre algum assunto nada a ver. Engraçado como agora eu conseguia enxergar nitidamente como toda piadinha dele era machista ou homofóbica, sempre tentando fazer com que certas atitudes soassem erradas. As meninas não podiam usar short porque era "indecente", mas ele podia falar das pernas delas o tempo todo. Homem não podia chorar, porque isso era coisa de boiola, mas ele podia passar quilos de gel no cabelo e ficar horas se admirando no banheiro que tava de boa... E por aí vai, cada dia uma anotação diferente.

Eu já não fazia questão, mas acabei sentindo certa repulsa de compartilhar dos pensamentos dele. Só de ficar na companhia do JV me dava um nó no estômago, como se eu estivesse tendo uma reação alérgica ou coisa assim. Não achava mais certo andar com um cara que me fazia sentir como lixo, então nosso afastamento foi meio que mútuo e bem-vindo. Daniel e eu nos sentíamos livres longe dele.

Essa liberdade também veio na hora de o Dani escolher pra quem contar sobre sua "reunião de aniversário". O Carlos já sabia, óbvio, porque eram primos, mas como sempre foi algo bem mais familiar, ele estranhou quando nos viu planejar o dia durante uma aula de Educação Física.

– Ué, cê vai? Pensei que não fosse chamar ninguém. – o capitão me questionou.

– Chamei só algumas pessoas. Não é uma festa. – Daniel rebateu. Carlos estalou a língua, nervoso.

– Tia Neide já sabe? Porque ela sempre prepara comida só pra família, né...

– Ela sabe.

Carlos ainda ficou um tempo nos observando, mas se deu por vencido e foi comandar a parte da sua tropa que ainda não tinha desertado. Nós nos entreolhamos e eu perguntei se a mãe dele estava realmente tranquila com aquilo, comigo e com o Sander indo. Não que fôssemos ficar nos agarrando na frente da família deles, muito longe disso, mas sei lá...

– É meu aniversário. – foi só o que o Daniel respondeu.

***

Diferente do que fiz com os gêmeos, eu e o Sander resolvemos comprar um presente para o Dani. Algo que mostrasse que a gente se importava, saca? Acho que ele merecia isso. Fomos ao shopping juntos num dia depois da aula em que o gringo dispensou a companhia dos colegas.

Foi difícil porque nunca tinha considerado dar nada a alguém que realmente fosse de coração, sabe? Presente de aniversário pra mim é blusa, cueca e meia – no máximo algo que minha mãe compre e embrulhe sem que eu nem veja o conteúdo, como aconteceu na festa dos gêmeos. Mas com o Dani eu queria que fosse diferente, assim como tinha sido com o Sander no primeiro semestre do ano. E daí que o gringo deu a ideia de darmos um livro pra ele – Daniel era do tipo que até gostava de ler, né, então fazia sentido. Rodamos horas na livraria e achamos um que chamou minha atenção pela capa: duas manetes de videogame das antigas! Mostrei pro gringo o exemplar em questão e ele notou, porém, que era um pouco diferente dos que eu já tinha visto – mas um diferente bom, porque a sinopse dizia que era um romance sobre dois garotos.

Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}Nơi câu chuyện tồn tại. Hãy khám phá bây giờ