Novembro II

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Depois do incidente com meu tio Fábio em casa, a situação ficou um pouco tensa com minha mãe. Ela passou a ter bastante trabalho com o advogado para finalizar o inventário das coisas que ela e o papai tinham comprado depois de casados, sabe, pra entrar na separação – mesmo que ele tivesse desistido delas, ainda era preciso documenta-las pra que no futuro nada pudesse ser tirado de nós – então ela raramente estava em casa na parte da tarde, quando eu chegava da escola.

À noite, porém, quando estávamos sozinhos, sem empregada e sem Rogério, ela assistia à TV suspirando, conversava ao telefone com a Vanessa de vez em quando aos cochichos, e também com a minha tia Andressa. Nosso diálogo era monossilábico e, pela primeira vez, aquilo me incomodava profundamente. Sabia que ia ter que "consertar" as coisas mais cedo ou mais tarde...

Mantive minha cabeça concentrada no colégio, porém. Não podia vacilar! Daniel me chamou para estudar com ele algumas vezes por semana na biblioteca, depois das aulas, e assim fizemos. Para ficarmos mais próximos, o Sander propôs que o grupinho dele também se reunisse por lá, assim a gente se esbarrava sempre nos corredores, atrás das prateleiras, entre os tomos jurássicos de enciclopédias...

Foi só na última semana do mês, entretanto, que notamos que havia um terceiro grupo na biblioteca, do lado oposto que costumávamos ficar. Eles faziam tanto barulho quanto a gente, talvez por isso a bibliotecária nos pedia para ficarmos em zonas separadas, sabe? Para distribuir a bagunça, por assim dizer.

– Renan! Correndo atrás do prejuízo, né? – a Camila me lançou um olhar travesso e me abraçou quando nos encontramos na porta da biblioteca.

– É, mais ou menos isso! E você? Tão ocupada com o namoro que suas notas até caíram, é?

Ela riu e disse que estava ajudando os amigos, mas que já tinha passado de ano.

– A gente se reúne todo dia na hora do almoço e depois da aula. – Camila subiu os ombros. – Acho que o Pablo é tão ruim quanto você em todas as matérias...

– Ei! Me senti ofendido agora! – a gente riu de brincadeira. – Olha que faz um tempo que você não vê meu desempenho na sala de aula. Posso muito bem ser o queridinho dos professores agora, você não sabe!

A Camila gargalhou de dobrar a barriga e eu revirei os olhos, risonho. A conversa foi interrompida pela trupe dela, que chegou me cumprimentando sem alvoroço. Marcos, Pablo e Diego primeiro, este último dando um beijo na testa da garota e se postando ao seu lado enquanto ela ainda tirava sarro de mim. O Luiz, a Maria e o William apareceram logo em seguida, os três aos cochichos e compartilhando de uma barra de chocolate. Nós trocamos um aceno de cabeça quando passaram, os olhos do Luiz em mim com certa ênfase enquanto o namorado o puxava pela mão para entrar na biblioteca.

– Bom, a gente tá se sentando ali. E você? Tá estudando sozinho? – a Camila chamou minha atenção.

– Ah, não, tô do outro lado. E eu normalmente venho com...

Não terminei a frase, já que com a chegada do Daniel e do Sander não era preciso. Camila deu um abraço no Dani e se envergonhou de cumprimentar o gringo.

– Acho que a gente nunca se falou... – ela murmurou, mais para o Diego que pra mim, eu acho.

– Pelo menos cês vão se sair bem em inglês. Tem até professor nativo! – foi a vez dele, do próprio Diego, se dirigir a mim e ao Dani, que sorrimos em resposta.

Não sei como não havíamos nos topado antes, mas a biblioteca parecia pequena demais para nós depois disso. O encontro era sempre esquisito, e isso era um problema porque o Daniel não queria ficar no mesmo recinto que o Luiz Eduardo. Eu não ia obriga-lo, muito menos, então passamos a nos revezar entre estudar ali e na quadra coberta, quando não tinha Educação Física de outra turma.

Aprendendo a Gostar de Mim {Aprendendo II}Where stories live. Discover now