30.Amargo Parte XI

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Aghi correu na direção de Miguel, que estava no chão. O soco de Thomas foi impulsionado pelo ódio, talvez a humanidade ainda não tenha criado um motor tão potente quanto esse sentimento.

— Miguel, você tá bem? Tá machucado? — Aghi tentava levantar o amigo enquanto se preocupava.

Miguel não respondeu, enquanto levantava apoiando as mãos no amigo não tirava os olhos de Thomas. Seu sorriso sarcástico, tão odiado pelo rapaz a sua frente, tomava sua face ao ponto de se tornar uma gargalhada.

A medida que Thomas retomava o ar, já que o soco lhe consumiu à pouca força que seu corpo dispunha, ele percebeu o erro que cometera: Quebrar uma regra básica de seu próprio jogo, não usar violência. Estava acabado, Miguel conseguiu o que queria e venceu o jogo criado especificamente para que ele perdesse.

—Nossa, você tá perdido, imbecil. Se olhar para trás agora você vai ver seu amigo salivar.

O jovem Kanenbergh virou-se rapidamente para a criatura no fundo da sala. A imensa boca de Carniçal, sem um corpo aparente, abriu sua enorme arcada, coberta por aquela saliva ácida que tomava o chão.

— Thomas Kanenbergh, você perdeu. A regra foi violada, agora receba sua punição.

— Não, espera. Ele não respondeu, ele me provocou de propósito, ele trapaceou. O jogo deve continuar. Por favor. — Implorava enquanto acenava na direção do monstro.

A criatura parecia ignorar os apelos desesperados. Sua boca aberta tomava todo o fundo da sala, era como se não tivesse corpo, apenas aqueles lábios com cicatrizes e dentes horríveis.

Uma grande massa de ar, tomada por um cheiro asqueroso tomou o lugar, à medida que o vento ampliava-se, as carteiras, folhas e cadeiras da sala rumavam em direção ao canto escuro da sala. A criatura sugava tudo em direção a sua garganta coberta por trevas.

Aghi tinha o corpo mais leve e mesmo não sendo o alvo da criatura começou a ser puxado lentamente. Miguel colocou o braço na frente do corpo do amigo e o arrastou para trás dele. A criança agarrava-se em suas vestes enquanto ele encarava Thomas.

Thomas era aos poucos lançado na direção de sua morte, agarrava e empurrava tudo a sua volta para tentar fugir. Enquanto os objetos a sua volta acabavam ele começou a agarrar a qualquer saliência do piso para tentar se arrastar na direção dos garotos.

— Socorro, por favor. Me segura, me segura. — Implorava desesperado enquanto estendia a mão na direção de Miguel.

Miguel deu dois passos e se colocou na sua frente, o ar não parecia surtir efeito em seu corpo e ele caminhava naturalmente.

— Não. ninguém vai te salvar, cara. Você vai morrer.Mas se você quiser eu posso te contar o que existe do outro lado.

— Por favor. Me desculpe, eu errei. Eu errei. — Enquanto gritava seguia arranhando o chão tentando se salvar.

— É tarde demais para desculpas, Thomas. Aceite a morte, e caso você acredite no inferno lhe desejo toda a sorte com seus pecados.

O sorriso de satisfação na cara de Miguel era anormal, ele não era assim. Aghi horrorizado não entendia a mudança súbita de personalidade do amigo. O menino sabia que aquela não era a essência do jovem que se sacrificou para salvá-lo, aquilo era uma brutalidade de seres que não possuem empatia, era o âmago de um Carniçal ou de algo terrivelmente semelhante, como advertira Arae.

Estaria seu amigo tomando o gosto por violência que o Mestiço percebeu?

— Eu não quero morrer. Papai, mamãe, por favor. Deus, alguém me ajude. — Thomas chorava enquanto seu corpo começava a flutuar, ele não tinha mais força para se segurar.

Ômega - O Guardião Santo (Fantasia/Suspense/Sobrenatural)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora